Desistência voluntária e arrependimento eficaz

AutorIrving Marc Shikasho Nagima
CargoEspecialista em Direito Criminal Assessor de desembargador
Páginas30-34

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A chamada desistência da tentativa, tentativa abandonada ou tentativa qualificada engloba tanto a desistência voluntária quanto o arrependimento eficaz. Está previsto no artigo 15 do Código Penal, in verbis: "O agente que, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede que o resultado se pro-duza, só responde pelos atos pra-ticados". Assim, caracteriza-se a tentativa abandonada quando "o agente pretendia produzir o resultado consumativo, mas acabou por mudar de ideia, vindo a impedi-lo por sua própria vontade" (Capez, 2007, p. 248).

Conceito, elementos, distinção e fundamentos

Para melhor entender os institutos da desistência voluntária e do arrependimento eficaz, espécies da desistência da tentativa, necessário se faz a diferenciação entre tentativa inacabada e acabada. Nas palavras de Juarez Cirino dos Santos:

"Na tentativa inacabada as ações realizadas são representadas como insuficientes para o resultado - ou seja, o autor ainda não realizou todo o necessário para produção do resultado, sendo suficiente a desistência das ações futuras para evitar o resul-

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tado: facada no pescoço reconheci-da como sem perigo para a vida da vítima.

Na tentativa acabada as ações realizadas são representadas como suficientes para o resultado - ou seja, o autor já realizou todo o necessário para produção do resultado, cuja ocorrência depende, apenas, da ação normal dos fatores causais postos pelo autor, sendo necessária nova atividade para evitar o resultado: a ação de estrangu-lamento é cessada porque o autor acreditava que a vítima morrerá" (Cirino, 2011, p. 219).

Ponderadas as diferenças entre tentativa inacabada e tentativa acabada, passa-se a conceituar os institutos componentes da tentativa abandonada.

A desistência voluntária é "a atitude do agente que, podendo chegar à consumação do crime, interrompe o processo executi-vo por sua própria deliberação" (Dotti, 2010, p. 413). Ou seja, o agente quando inicia "a realização de uma conduta típica, pode, voluntariamente, interromper a sua execução" (Bitencourt, 2007, p. 406), conduta essa impunível. Em outras palavras, "o agente, voluntariamente, abandona seu intento durante a realização dos atos exe-cutórios" (Cunha, 2010, p. 69).

Desse conceito, pode-se extrair que para a ocorrência da desistência voluntária é necessária a para-lisação concreta da execução do fato delituoso (critério objetivo) e que essa desistência seja voluntária (critério subjetivo). Havendo a cessação (abstenção) da execução do crime, por deliberação própria do agente, ele só responderá pelos atos até então praticados, se infra-ções penais forem considerados tais atos.

Já o arrependimento eficaz, também chamado de arrependimento ativo, ocorre "quando o agente, tendo já ultimado o processo de execução do crime, desen-volve nova atividade impedindo a produção do resultado" (Jesus, 2006, pp. 343/344). Exige uma ação positiva do agente, pois "o processo de execução do delito se encontra esgotado (ação típica realizada)" (Prado, 2010, p. 84), com a finalidade de evitar a produção do resultado.

Destarte, para que se configure o arrependimento eficaz é imperioso que haja o impedimento efetivo do resultado (critério objetivo) e que seja de forma voluntária (critério subjetivo).

A desistência voluntária está para a tentativa inacabada do mesmo modo que o arrependimento ativo está para a tentativa acabada. A fim de demonstrar as diferenças entre os dois institutos, eis o magistério de Celso Delmanto e ou-tros:

"Na desistência voluntária, o agente interrompe o processo de execução que iniciara; ele cessa a execução, porque a quis interromper (mesmo que haja sido por medo, remorso ou decepção) e não porque tenha sido impedido por fator externo à sua vonta-de. No arrependimento eficaz, embora já houvesse realizado todo o processo de execução, o agente impede que o resultado ocorra. Em ambos os casos, sempre voluntariamente" (Delmanto, 2010, pp. 141/142).

Quanto ao fundamento da tentativa abandonada, há quem enten-da que se trata de política criminal (verdadeira "ponte de ouro"), ou-tros que se trata de graça (ou prêmio ao agente por evitar o resultado lesivo), e ainda aqueles que creem pela desnecessidade de pena, ante seu caráter de prevenção geral ou especial. Novamente reporta-se, com a devida permissão, às lições de Juarez Cirino dos Santos:

"Existem várias teorias para explicar a exclusão da pena da desistência da tentativa, como a teoria de política criminal, a teoria da graça (ou do prêmio) e a teoria dos fins da pena.

  1. A teoria de política criminal formulada por Feuerbach, define a exclusão da pena da desistência da tentativa como ponte de ouro para regresso do autor à esfera do Direito: a promessa de exclusão de pena seria um estímulo ao autor para desistir da tentativa ou evitar o resultado. A crítica apresenta várias ob-jeções: a) a promessa de exclusão de...

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