2a Vara do Trabalho de Itajaí ? SC

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Processo: ACP 0004960-55.2012.5.12.0022

Juiz: Ozéas de Castro
Classe: Ação Civil Pública
Autor: Ministério Público do Trabalho
Réu: Fundação Universidade do Vale do Itajaí — UNIVALI Publicação: Audiência do dia 13 de março de 2013, às 17h55min

Ausentes as partes.

Submetido o feito a julgamento, visando a solucionar o con?ito intersubjetivo de interesses, foi proferida a seguinte

Sentença

VISTOS, etc.

I - Relatório

MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, já qualificada/o/s nos autos, pretende, em decorrência dos fatos articulados na petição inicial, a condenação da/o/s ré/u/s, FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
— UNIVALI
, também qualificada/o/s, nas obrigações de fazer e não fazer, assim sintetizadas: (a) conceder intervalo para repouso e alimentação de no mínimo de 1 hora e no máximo de 2 horas, sempre que a jornada normal exceder de 6 horas; (b) conceder intervalo para repouso e alimentação de 15 minutos quando a jornada transbordar 4 horas e não exceder de 6 horas; (c) conceder intervalo mínimo de 11 horas entre duas jornadas de trabalho; (d) abster-se de conceder ao empregado, durante a jornada de trabalho, período para repouso ou alimentação superior a 2 horas sem que haja prévio acordo escrito individual ou chancela em norma coletiva; (e) abster-se de manter empregados trabalhando durante o período destinado ao repouso e alimentação; (f) abster-se de prorrogar a jornada normal de trabalho além do limite de 2 horas diárias, ressalvadas as exceções legais; (g) abster-se de exigir, ou de qualquer forma, permitir ou tolerar que seus empregados registrem período de intervalo não usufruído. Por descumprimento de cada uma das cominações, pugna pela ?xação de multa não inferior a R$ 100.000,00, revertida em favor do Centro de Referência em Saúde do Trabalhador de Santa Catarina — CEREST/SC. Requer, por ?m, a reparação por danos morais coletivos no importe mínimo de R$ 500.000,00. Juntou documentos. Deu à causa o valor de R$ 500.000,00 na expressão monetária da época.

Respondeu a/o ré/u por meio de defesa escrita, suscitando a preliminar de carência de ação. No mérito, nega o descumprimento da jornada e dos intervalos senão nas hipóteses legalmente autorizadas. Justi?ca que é uma fundação com características muito distintas de uma empresa privada, por possuir uma gama imensa de ocupações distribuídas por todos os campi, donde, por vezes, acaba trabalhando um único empregado, isso sem falar no leque muito diversi?cado de pelo menos duzentas ocupações, entre serventes a mergulhadores, passando por professores, médicos, psicólogos, soldadores, enfermeiros, radialistas, nutricionistas, motoristas, bibliotecários, farmacêuticos, administradores de redes, cinegra?stas, químicos, piloto de embarcação, técnicos e auxiliares de

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laboratório, pedreiros, repórteres, advogados, oceanógrafos, contadores etc., pois sua atividade primacial é a educação, a qual, para atingir seu ?el propósito, demanda qualidade na prestação de serviços mediante estrutura de apoio que congrega estas atividades diversas. Enfatiza, por ?m, que os pontuais transbordamentos da jornada além do limite legal e das supressões parciais dos intervalos para repouso foram esporádicos, em tudo justi?cado por necessidade imperiosa de serviço autorizada no art. 61 da Consolidação das Leis do Trabalho.

Juntou documentos.

Interrogatórios dispensados.

Razões ?nais remissivas.

Sem mais provas, a instrução processual foi encerrada.

Em nenhum momento as partes aceitaram a solução pela via conciliatória.

É, em breve síntese, o relatório, no necessário ao julgamento.

II - Fundamentação

PRELIMINARMENTE

Suscita a requerida a prefacial ilegitimidade do Ministério Público para ajuizar a presente ação civil pública sob o fundamento de que as pretensões são oriundas de interesses individuais e não de interesses individuais homogêneos, extrapolando a previsão do art. 1º da Lei n.
7.347/85, pois a realização de horas extras além do limite de 2 horas diárias e a concessão dos intervalos para repouso e alimentação, não correspondem à de?nição de interesse difuso ou coletivo, tal como manda o art. 127 da Constituição da República.

Prima facie, impõe-se ter presente que a literatura jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal confere legitimidade ao Ministério Público do Trabalho na defesa dos interesses difusos e coletivos no âmbito da relações trabalhistas. Precedente: RE n. 213.015, Min. Néri da Silveira, 2a T., DJU 24.5.2002, publicado com a seguinte ementa:


1. Recurso extraordinário. Trabalhista. Ação civil pública. 2. Acórdão que rejeitou embargos infringentes, assentando que ação civil pública trabalhista não é o meio adequado para a defesa de interesses que não possuem natureza coletiva. 3. Alegação de ofensa ao disposto no art. 129, II, da Carta Magna. Postulação de comando sentença que vedasse a exigência de jornada de trabalho superior a 6 horas diárias. 4. A Lei Complementar
n. 75/93 conferiu ao Ministério Público do Trabalho legitimidade ativa, no campo da defesa de interesses difusos e coletivos, no âmbito trabalhista. 5. Independentemente de a própria lei ?xar o conceito de interesse coletivo, é o conceito de Direito Constitucional, na medida em que a Carta Política dele faz uso para especi?car as espécies de interesses que compete ao Ministério Público defender (CF, art. 129, III). 6. Recurso conhecido e provido para afastar e ilegitimidade ativa do Ministério Público do Trabalho.

Foi a partir desse raciocínio que derivou a Súmula n. 736 da Suprema Corte:

Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores.

Tal interpretação derivou do disposto nos arts. 129, III, da Carta, e 6º, VII, alínea “d”, e 83, III da Lei Complementar n. 75/93.

Com todo o efeito, diz o indigitado art. 129 diz que ao Ministério Público compete “pro-mover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”.

Por sua vez, o art. 83, III, da LC n. 75/93 é igualmente taxativo ao ?xar que compete ao Ministério Público do Trabalho promover a ação civil pública no âmbito da Justiça do Trabalho para defesa de interesses coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos, entre eles os direitos constitucionais dos trabalhadores inseridos nos arts. 7º e 8º da Carta.

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Outra não é a orientação dos Tribunais Trabalhistas.

AÇÃO CIVIL PÚBLICA TRABALHISTA
— LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO — As relações de trabalho já não são vistas nos dias de hoje sob o prisma individual; antes, despertam interesse nos aspectos globais, que dizem respeito a todos os trabalhadores, ou a muitos deles, pois uma única e mesma conduta ilícita pode constituir violação de direitos ou interesses de centenas e até milhares de trabalhadores. A orientação diretora das reformas processuais deste ?nal de século aponta para a universalização da tutela jurisdicional e para a consequente criação de instrumentos modernos, hábeis para solucionar os con?itos envolvendo interesses difusos e coletivos em suas várias modalidades. Um desses novos instrumentos é a ação civil pública, cuja legitimidade ativa é atribuída ao Ministério Público pelo art. 129, III, da Constituição da República. A par dessa atribuição constitucional, a Lei Complementar
n. 75/1993, em seu art. 83, III, estabeleceu a competência do Parquet no âmbito da Justiça do Trabalho, para defesa de interesses difusos e coletivos, quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente garantidos aos trabalhadores. Por meio da ação civil pública o Parquet cumpre sua missão de defender a própria ordem jurídica que assegura aqueles direitos, na tutela não somente de um grupo especí?co de trabalhadores, mas também dos futuros, dos ausentes, dos minoritários, dos dissidentes e dos desconhecidos, na expressão do eminente jurista Messias Pereira Donato. É de decisiva importância o comprometimento do Ministério Público e do Poder Judiciário, na aplicação deste instrumento processual relativamente novo, que é a ação civil pública, pois permitirá extrair dela todo o seu potencial de virtude e e?cácia, conforme pretendeu o legislador. (TRT 3a R., RO 17507/99, 5a T., rel. Juiz Sebastião Geraldo de Oliveira, DJMG 30.9.2000, Revista de Jurisprudência Trabalhista, HS Editora,
n. 202, p. 92.)

AÇÃO CIVIL PÚBLICA — LEGITIMIDADE
— MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO


— INTERESSE COLETIVO — TERCEIRIZAÇÃO — VÍNCULO EMPREGATÍCIO
— COOPERATIVA — ATIVIDADE-FIM — 1. O Ministério Público do Trabalho ostenta legitimidade ativa para a propositura de ação civil pública em defesa de interesses coletivos, nos termos dos arts. 127 e 129, inciso III, da Constituição Federal, e do art. 83, inciso III, da Lei Complementar
n. 75/1983. 2. Constitui tutela de interesse coletivo a pretensão dirigida à proteção da generalidade dos empregados da empresa demandada, e não de certos empregados, tendo por objeto condenação à abstenção da prática de terceirização em atividade-?m, no caso colheita de laranja mediante associação de autênticos empregados a cooperativa de mão de obra. 3. Não afronta à lei a proibição de fornecimento de mão de obra dirigida à cooperativa, bem assim a utilização da mão de obra por empresa tomadora, se o objeto da terceirização é a colheita de laranja nos períodos de safra, elemento indissociável da atividade-?m da empresa bene?ciária do trabalho. 4. Não con?gurada ofensa ao art. 442, parágrafo único, da CLT, e aos arts. 5º, inciso XVIII, 174, § 2º, e 187, da Constituição Federal, bem assim ao art. 896, da CLT. Embargos não conhecidos. (SBDI-1, E-RR 717555/2000.3, rel. Min. João Oreste Dalazen, DJ 15.4.2005.)

Portanto, se no caso tem-se a defesa dos interesses coletivos dos...

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