A pena de Tântalo: uma política de educação profissional para trabalhadores ?sedentos? por trabalho

AutorÁurea de Carvalho Costa
CargoDoutora em Educação e professora do Departamento de Educação da UNESP (Bauru).
Páginas321-338
Artigo
A pena de Tântalo: uma política
de educação profissional para
trabalhadores “sedentos” por trabalho
Áurea de Carvalho Costa*
Resumo
O texto baseia-se em pesquisa realizada no período de 2001 a 2006 sobre o
tema da empregabilidade, a partir da análise dos objetivos e da população-
alvo da política do Plano Nacional de Qualificação (PNQ), organizador da
educação profissional de nível básico, não -formal, na forma de cursos
financiados pelo FAT. O problema consistia em investigar se a educação
profissional de nível básico, prevista na LDB, é uma modalidade educa-
cional utilizada como instrumento para enfrentar a questão social, que é
o desemprego estrutural e a restrição de direitos. As hipóteses foram: 1)
os cursos podem ser considerados como políticas de assistência social,
dirigindo-se aos trabalhadores aptos, invalidados para o trabalho; 2) tal
política pública constitui-se numa resposta à crise em que se encontra
a sociedade capitalista diante do aprofundamento da questão social. O
PNQ foi planejado tendo como eixo as noções de competência e empre-
gabilidade. Propunha-se que o trabalhador adquirisse as competências
para torná-lo “empregável”, com um perfil polivalente, para competir
no mercado. Concluímos que o trabalhador tem sido submetido à pena
de permanecer se preparando para um emprego, que tarda em chegar,
em analogia a Tântalo, cuja pena era permanecer sedento à beira de um
poço onde não podia se saciar. Na conjuntura atual, de crise do capital,
que ocasiona grande restrição de postos de trabalho, a presente reflexão
vem contribuir para a necessária luta contra as mistificações acerca de que
existiria uma relação linear entre formação e conquista do emprego.
Palavras-chave: empregabilidade, trabalho e educação, educação e pobreza,
questão social, educação profissional.
* Doutora em Educação e professora do Departamento de Educação da UNESP
(Bauru). Publicou os livros “Anônimas Odisséias: a dupla destituição na infância
e na vida adulta” (Annablume, 2005) e “A proletarização do professor: neoli-
beralismo na educação” (Ed. Sundermann, 2009, como co-autora). Endereço
eletrônico: aurea@fc.unesp.br .
322 p. 321 – 338
Volume 8 – Nº 15 – outubro de 2009
1. Introdução
O
presente trabalho resultou de nossa pesquisa de pós-doutorado,
em que realizamos a avaliação de uma política pública de qualifi-
cação de trabalhadores, por meio da análise dos objetivos explícitos
nos documentos do Plano Nacional de Qualificação, o qual organizava
a educação profissional de nível básico, modalidade não-formal, na
forma de cursos financiados com verbas do Fundo de Amparo ao
Trabalhador. Os dados foram obtidos por meio dos documentos
nacionais do PLANFOR e, posteriormente, PNQ, o Plano Municipal
de Qualificação de Rio Claro (SÃO PAULO, 2002, p. 66), entrevistas
semi-estruturadas aos responsáveis locais pela implementação dos
cursos, planos de trabalho e relatórios das instituições parceiras.
Entrevistamos atores diretamente envolvidos nos processos de
implementação de cursos no município de Rio Claro, licitados em
2000. Referimos-nos a eles pelo seu posto nas instituições.
O problema de pesquisa consistiu em investigar se a educação
profissional de nível básico, modalidade não formal, é uma moda-
lidade educacional que tem sido utilizada como instrumento para
enfrentar a questão social, cuja configuração atual é o desemprego
estrutural. Além dos objetivos, analisamos a população-alvo privi-
legiada nessa política pública. As hipóteses de trabalho foram: os
cursos ministrados pelo PNQ podem ser considerados como políticas
de assistência social, dirigindo-se aos trabalhadores aptos, porém
invalidados para o trabalho, na conjuntura de restrição dos postos e
novas exigências do mercado, a qual demanda dos trabalhadores um
permanente esforço de adaptação; tal política pública constitui-se
numa resposta à crise em que se encontra a sociedade capitalista
diante do aprofundamento da questão social, que emerge sob a
forma de exclusão do trabalho com direitos.
2. Os objetivos do Plano Nacional de Qualificação
Essa modalidade de educação profissional, implementada
por iniciativa federal, propôs-se a preparar trabalhadores com bai-
xos níveis de escolaridade e risco de tornarem-se desempregados
estruturais, com a finalidade de eles participarem de processos de
recrutamento e seleção para empregos, abrirem empresas familiares

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