Por uma democracia: entre a democracia liberal e a prática política em Jacques Rancière

AutorPriscilla Camargo Santos, Luiz Henrique Urquhart Cademartori
CargoUniversidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil
Páginas220-246
Recebido em: 20/09/2019
Revisado em: 30/11/2019
Aprovado em: 15/12/2019
http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2019v41n83p220
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Por uma Democracia: entre a Democracia Liberal
e a Prática Política em Jacques Rancière
For a Democracy: between Liberal Democracy and Political Practice in
Jacques Rancière
Priscilla Camargo Santos1
Luiz Henrique Urquhart Cademartori1
Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, SC, Brasil
Resumo: O problema de pesquisa diz respeito a
qual modelo de democracia é desejável em fun-
ção da crise institucional e política observada
nos dias atuais. A análise realizada é monográ-
fica. Evidencia-se dois modelos de participação
política, a democracia liberal, que tem como
principais características a competição e a par-
ticipação política; e a democracia preconizada
por Jacques Rancière por meio da prática po-
lítica que se opera a partir da contribuição das
classes populares para a instalação de espaços
públicos. Aborda-se a crise democrática expon-
do um estudo realizado anualmente que investi-
ga o índice de democracia em grande parte dos
países. Encerra-se o trabalho demonstrando a
necessidade da manutenção das premissas da
democracia liberal como meio de defesa das
próprias regras do jogo democrático.
Palavras-chave: Democracia. Democracia Li-
beral. Prática Política.
Abstract: The research problem concerns
which model of democracy is desirable in
view of the institutional and political crisis
observed today. The analysis performed
is monographic. Two models of political
participation are evidenced here: the liberal
democracy whose main characteristics are
competition and political participation and the
democracy recommended by Jacques Rancière
through the political practice that operates from
the contribution of the popular classes to the
installation of public spaces. The democratic
crisis is addressed by exposing an annual study
that investigates the democracy index in most
countries. The paper ends by demonstrating at
the end the need to maintain the premises of
liberal democracy as a means of defending the
very rules of the democratic game.
Keywords: Democracy. Liberal Democracy.
Political Practice.
Seqüência (Florianópolis), n. 83, p. 220-246, dez. 2019 221
Priscilla Camargo Santos – Luiz Henrique Urquhart Cademartori
1 Introdução
A acepção mais comum do termo democracia diz respeito a uma
das várias formas de governo, na qual o poder não está nas mãos de um
só ou de poucos, mas de muitos, servindo como contraponto às formas
autocráticas de governo, como monarquia ou tirania e, ainda, aristocracia
ou oligarquia. Esse conceito é dado por Péricles ao definir a democracia
na antiga Atenas (TUCÍDIDES, 2008).
Na Europa e na América do Norte, entre os séculos XVII e XVIII,
a noção de democracia de muitos foi transformada na democracia de to-
dos, pois os muitos que governam continuam sendo apenas uma parte do
todo, o que representa um conceito limitado, assim como a monarquia e
a aristocracia. O conceito moderno de democracia que se constrói a partir
dessa pequena mudança semântica de muitos para todos apresenta uma
democracia com um caráter universal1 e traz junto consigo concepções de
liberdade e igualdade.
Outra grande inovação do conceito moderno da democracia é a no-
ção de representação, diante da impossibilidade de repropor a democracia
sob sua forma antiga – democracia direta – à vista dos extensos territó-
rios dos Estados-Nação, os revolucionários democráticos do século XVIII
reinventaram o conceito criando novas formas e práticas institucionais.
Assim, a representação surge como um mecanismo prático que tor-
naria o governo republicano factível nos extensos territórios do Estado-
-nação, contudo desde seu início encerra inúmeras críticas, pois assume
duas funções contraditórias, e, ao mesmo tempo em que liga a multidão
ao governo também, a separa dele. Apesar dessa contradição, a represen-
tação passou de tal maneira a definir a democracia que desde então tor-
nou-se praticamente impossível pensar a democracia sem representação.
1 Em que pese esse caráter universal, é importante destacar que as revoluções modernas
não instituíram imediatamente o conceito universal de democracia, uma vez que excluíam
mulheres e escravos e admitiam o voto censitário, o que acabou negando esse caráter
universal de participação de todos. Entretanto, até hoje, essa pretensão universal de
democracia pode ser questionada, mas, mesmo assim, tem servido como meta para as
lutas e revoluções.

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