Tribunal Regional do Trabalho da 22a Região

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Processo TRT: RORORA-0000357-02.2012.5.22.0105 Virtual: 2817/2013

Acórdão (Pleno):

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PRETENSÃO DE CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DO PREFEITO EM DANO MORAL COLETIVO. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO.

Tratando-se de ação em que não se busca o ressarcimento por parte do gestor de danos materiais causados ao erário, mas o ressarcimento do prejuízo moral causado à coletividade decorrente do suposto fato de o gestor ter contratado cooperativa de trabalho de fachada para prestação de serviços ao município, burlando, dessa forma, direitos trabalhistas, implicando grave lesão ao ordenamento jurídico-trabalhista e manifesto prejuízo aos interesses dos trabalhadores, essa circunstância faz incidir o art. 114, I e IX, da CF, uma vez que o suposto dano moral coletivo decorre de relação de trabalho.

AÇÃO COLETIVA. TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. LEGITIMIDADE DO MPT. A legitimidade do Ministério Público do Trabalho para o ajuizamento de ação civil pública encontra expressa previsão no art. 83, III, da Lei Complementar n. 75/91, visando à defesa dos interesses coletivos quando desrespeitados os direitos sociais constitucionalmente assegurados. Esse comando guarda perfeita sintonia com o art. 129, III, da CF que estabelece como uma das atribuições do Ministério Público da União, do qual é órgão integrante o MPT, a promoção de inquérito civil e ação civil pública “para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”. Ainda, de?ne o art. 82, I, do CDC que o Ministério Público é o órgão legitimado à defesa coletiva dos interesses de?nidos no art. 81, entre eles, os individuais homogêneos (inciso II, parágrafo único). Na hipótese, a pretensão alcança interesses individuais homogêneos, objetivando o MPT salvaguardar direitos de trabalhadores contratados mediante cooperativa, totalmente desvirtuada dos ?ns que lhe são especí?cos. Preliminar rejeitada.

ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. TEORIA DA ASSERÇÃO. NÃO CONFIGURAÇÃO. Segundo a teoria da asserção, a legitimidade passiva é examinada em conformi-dade com as alegações formuladas pelo autor na petição inicial, devendo as condições da ação ser aferidas a partir da análise abstrata dos fatos ali aduzidos. Nesse sentido, tendo o MPT ajuizado reclamação em face do gestor municipal, da Cooperativa e de quatro de seus membros, visando à condenação solidária em dano moral coletivo por suposta contratação de cooperativa fraudulenta para prestação de serviços ao município, essa circunstância é su?ciente para con?gurar a legitimação de todos aqueles que foram indicados pelo autor. Preliminar rejeitada.

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PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS POR COOPERATIVA. TERCEIRIZAÇÃO ILÍTICA. CONFIGURAÇÃO. No âmbito da Administração Pública, a terceirização possui função única de facilitar a execução dos deveres do Estado perante a sociedade. Porém, é crescente a prática ilícita de contratação de mão de obra para atender à atividade-?m de serviços estatais. Mais grave ainda quando a arregimentação de mão de obra se faz através de pseudocooperativa, em total desacordo com o ordenamento jurídico e com a ?nalidade de sonegar direitos assegurados constitucionalmente aos trabalhadores, acobertados pelo disposto no parágrafo único do art. 442 da CLT. No caso, não houve instituição de cooperativa para atender aos interesses de todos os cooperados, visando à melhoria de suas condições de trabalho, mas sim o proveito pessoal de quatro sócios, à custa da sonegação de direitos trabalhistas básicos de quantidade signi?cativa de trabalhadores que, inocentemente, com o único intento de assegurar um posto de trabalho com o qual pudessem garantir a subsistência precária de suas famílias, aderiram a uma cooperativa de fachada que mascara verdadeiras relações de emprego. Desta feita, correta a sentença ao reconhecer a terceirização ilícita por meio de contratação de cooperativa fraudulenta.

COOPERATIVA FRAUDULENTA. PROVA DA ATUAÇÃO DE SÓCIO COMO DIRIGENTE. RESPONSABILIZAÇÃO SOLIDÁRIA. Provada a participação de associado indicado pelo autor como um dos dirigentes de cooperativa fraudulenta, conforme depoimento do próprio presidente da falsa cooperativa, tendo, dessa forma, participado dos atos fraudulentos cometidos pela cooperativa, não há dúvida que deve responder solidariamente, nos termos da sentença.

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA DE SERVIÇOS. CULPA IN VIGILANDO E CULPA IN ELIGENDO. OBSERVÂNCIA DA DECISÃO DO STF NA ADC
N. 16. ESPEFICIDADES QUE JUSTIFICAM A RESPONSABILIZAÇÃO SUBSIDIÁRIA.
O art. 71 da Lei n. 8.666/93 tem por objetivo exonerar a Administração Pública da responsabilidade principal, atribuída ao contratado, levando em conta a situação de normalidade e regularidade de procedimento do contratado e do próprio órgão público contratante, afastando eventual vinculação empregatícia em desconformidade com o art. 37, II, da CF. Não a exime, no entanto, da responsabilidade subsidiária quando con?gurado o inadimplemento do contratado em decorrência das culpas in vigilando e in eligendo. Não se trata de inconstitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei n. 8.666/93, mas tão somente de uma interpretação conforme a Constituição Federal, notadamente o estatuído no art. 37, § 6º, que ?xa a responsabilidade da administração pública direta e indireta e de seus prestadores de serviços públicos, obrigando-a a reparar os danos que seus agentes, nesta qualidade, causarem a terceiros. Esse entendimento harmoniza-se com o decidido pelo STF em 24.11.2010 na ADC n. 16, ao declarar a constitucionalidade do art. 71, § 1º, da Lei
n. 8.666/93, na medida em que o TST, ao editar a Súmula 331, não declarou a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal, mas apenas o considerou inaplicável ante as peculiaridades do caso concreto.

TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. DANO MORAL COLETIVO CONFIGURADO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. QUANTUM INDENIZATÓRIO. O dano moral coletivo consubstancia-se na transgressão de interesses metaindividuais, de princípios, valores e ?ns caros à

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coletividade e, nesse sentido, amparados pela ordem jurídica positiva. Assim, violados os direitos metaindividuais por meio de terceirização ilícita intermediada por cooperativa de fachada, devida a indenização por dano moral coletivo, visto que a conduta provoca repulsa da sociedade e instaura um sentimento coletivo de indignação, con?gurando prejuízo jurídico e social que atinge toda a sociedade, adquirindo o dano um caráter amplo e genérico, notadamente do que diz respeito aos direitos trabalhistas. Reconhecendo a gravidade do ilícito, importando violação ao ordenamento jurídico e atingindo interesses metaindividuais de toda uma coletividade, bem como considerando a capacidade de pagamento dos responsáveis solidários, que se organizaram como verdadeira empresa exploradora de atividade econômica lucrativa, razoável e proporcional a condenação em dano moral coletivo no valor de R$ 100.000,00 arbitrado pela sentença.

TERCEIRIZAÇÃO ILÍCITA. RESPONSABILIDADE PESSOAL DO GESTOR. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA POR DANO MORAL COLETIVO. Quando o administrador contrata sem concurso ou mediante terceirização ilícita, caracterizado está o dolo, exatamente pela vontade genérica de fazer o que a lei veda ou de não fazer o que a lei determina. O dolo existe quando o agente tem a intenção de obter o resultado, sabendo conscientemente o que deseja e toma a decisão de conseguir. No caso, as provas dos autos demonstram que o gestor estava ciente da contratação irregular, uma vez que, por intermédio de pessoas ligadas a ele, indicava trabalhadores para a falsa cooperativa, e mais, in?uenciava na demissão de outros trabalhadores, a con?gurar não só a culpa estrito senso, mas também o dolo, pela vontade livre e consciente de conseguir, no mínimo, proveito político, através de contratação de cooperativa fraudulenta, instituída com o propósito único de enriquecer seus dirigentes, mediante a apropriação de direitos trabalhistas dos trabalhadores supostamente tidos por cooperados. Assim, evidenciado que a conduta do gestor concorreu para o resultado danoso à coletividade, deve responder de forma solidária com a cooperativa e seus dirigentes, pelo pagamento da indenização por dano moral coletivo.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso Ordinário, TRT-RO-0000357--02.2012.5.22.0105, em que são recorrentes COOPERATIVA DE TRANSPORTE E SERVIÇOS LTDA. – CTS, GLAUBO LIMA DE FREITAS, ANTÔNIO JERRIVAN FILHO, MARCOS AURÉLIO MARQUES RODRIGUES, JOSÉ GLEDSON ARAÚJO DA SILVA, MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO e MUNICÍPIO DE BATALHA e recorridos COOPERATIVA DE TRANSPORTE E SERVIÇOS LTDA. – CTS, GLAUBO LIMA DE FREITAS, ANTÔNIO JERRIVAN FILHO, MARCOS AURÉLIO MARQUES RODRIGUES, JOSÉ GLEDSON ARAÚJO DA SILVA, MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, MUNICÍPIO DE BATALHA e AMARO JOSÉ DE FREITAS MELO.

Trata-se de recursos ordinários e adesivo interpostos em face da sentença (seq. 110), complementada em sede de embargos de declaração (seq. 121), que acolhe a preliminar de incompetência material da Justiça do Trabalho em relação ao reclamado Amaro José de Freitas Melo (prefeito do município de Batalha), rejeita a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam do reclamado Antônio Jerrivan Filho e a preliminar de carência de ação por impossibilidade jurídica do pedido e julga parcialmente procedente o pedido objeto da ação civil pública para conceder, em parte, a tutela pretendida, para condenar a CTS — Cooperativa de Transporte e Serviços Ltda., sob pena de multa diária de R$ 5.000,00 até o limite de R$ 200.000,00, a se abster da prestação de quaisquer

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