The lomerio statute of autonomy in perspective on indigenous/O estatuto de autonomia de lomerio (bolivia) na perspectiva indigena.

AutorDan, Vivian Lara Caceres

Aspectos historicos, legislativos e o protagonismo indigena na demanda por autonomia

O direito a autonomia vem sendo reconhecido por organismos internacionais como um direito universal e tem como base o principio da livre determinacao conforme a Resolucao 1514 da Assembleia Geral das Nacoes Unidas de 1960, o Pacto de Direitos Civis e Politicos e o Pacto Internacional de Direitos Economicos, Sociais e Culturais (ANAYA, 2010). Todos esses documentos sao resultados de um debate a respeito dos povos colonizados em que o Comite de Descolonizacao, uma organizacao das Nacoes Unidas criada em 1961, foi um dos precursores nesse tema sobre os estados-nacao que se estruturaram encima de povos com culturas, tradicoes e autoridades proprias e onde essas minorias etnicas passaram, nesse novo contexto, a exigir o direito a diferenca e o reconhecimento de suas organizacoes proprias.

Segundo Wolkmer, o conceito de nacao foi elaborado para solapar a heterogeneidade social. Da mesma forma que o Estado delimitou as fronteiras geopoliticas e juridicas tambem se esforcou para delimitar as fronteiras culturais e controlar os recursos naturais de seus territorios (WOLKMER, 1997, p. 58).

Segundo Ayala Mora, os Estados nacionais que surgiram na America Latina no seculo XIX, muito embora sejam produto de uma ruptura colonial, a independencia, nao refletiu em uma cidadania participativa e inclusiva para os indigenas e negros, bem como tambem nao alterou o modelo de dominacao economica, politica e social. Sendo assim, esse modelo de Estado e suas leis nao corresponderam a realidade social que sempre fora complexa e heterogenea (AYALA MORA, 1992, p. 33).

Patzi esclarece que no seculo XIX, o Estado boliviano elaborou uma politica de repressao, fragmentacao quando nao de extincao das comunidades indigenas ao aprovarem por exemplo, a "ley de Exvinculacion de 1874", que tinha um vies darwinista social de domesticacao dos indigenas e ascensao de uma elite "criola", bem como de uma falta promessa de unidade, assim promoveram uma politica "multicultural de incorporacao" (PATZI, 2005, p. 198).

Para Luis Tapia:

O Estado, as leis, as instituicoes do governo, o regime politico e organizacional correspondem a uma unica cultural: a cultura que conquistou o continente. Mesmo que haja modalidades mais modernas ha tambem uma integracao subordinada. E nesse sentido, estrutural e constitucionalmente, trata-se de um Estado racista embora nao reconheca isso de forma aberta (TAPIA, 2006, p. 31, traducao nossa).

Ou seja, trata-se de um Estado monocultura!, com estrutura, leis, instituicoes politicas e formas de governar construidas pela logica da cultura dominante. A diferenca e nos anos recentes os indigenas e afrodescendentes passaram a adentrar a estrutura estatal e isso produziu uma conjuntura politica um pouco mais favoravel a diversidade etnica, refletindo por um lado, as lutas e demandas dos movimentos indigenas e afrodescendentes, mas tambem significou a diluicao da forca de oposicao desses movimentos.

A partir da nova configuracao de governos democraticos, em finais da decada de 1970 e 1980, mas principalmente na decada de 1990, considera-se, na Bolivia, um periodo de avancos da propria organizacao etnica e politica e de pressoes desses grupos frente ao Estado. Os chiquitanos, para citar um exemplo, aos poucos abandonaram a identidade camponesa que lhe foi imposta pelos governos nacionalistas e movimentos sindicais camponeses e retomaram a identidade indigena.

Assim, o Convenio Internacional mais importante que garante os direitos indigenas e que reconhece e respeita a diversidade etnica e cultural e o n. 169 da OIT, e que na Bolivia tem que ser aplicado como uma lei especial sobre os direitos indigenas desde 1991. Os pontos mais importantes desse Convenio sao: a) direito a terra e ao territorio; b) direito a saude e a educacao com direito a sua lingua reconhecida e protegida pelo Estado; c) direito a seus costumes com instituicoes proprias; d) a consulta previa e a participacao de maneira informada, previa e livre sobre os processos de desenvolvimento e de formulacao de politicas em temas que afetem os indigenas.

Na Bolivia, os povos indigenas construiram sua agenda de reivindicacoes nos anos de 1990 tendo como horizonte o reconhecimento de sua autonomia. Essa demanda esteve expressamente no Projeto de Lei Indigena de 1992, que foi declarado inconstitucional pelo Parlamento dessa epoca (ANAYA, 2010, p. 21). Porem, nos anos 2000, a demanda por governar seu proprio territorio tornou-se o motivo das mobilizacoes e os povos indigenas protagonizaram a respeito do modelo de Estado que comecava a ser debatido e influenciaram a convocacao de uma Assembleia Constituinte (ANAYA, 2010, p. 21).

A historia politica do movimento indigena organizado pode, segundo Montano, ser dividida em quatro (4) etapas a partir dos eixos de articulacao e de suas reivindicacoes: a) auto identificacao; b) terra, territorio e processo agrario; c) transformacoes estruturais do Estado; d) Estado Plurinacional e autonomias (MONTANO, 2009, p. 34).

A proposta de uma nova Constituicao Politica na Bolivia reconhecida como um pacto de unidade e aprovada em 2009 traz um modelo de Estado intercultural, um novo Estado plurinacional e comunitario com autonomias territoriais. Assim, e possivel pensar nessa plurietnicidade a partir da sobrevivencia ativa das primeiras nacoes de povos indigenas que estenderam e aprofundaram a luta por seus direitos enquanto comunidades e nacoes indigenas bem como o direito a seu territorio e recursos naturais.

Segundo Adolfo Chavez, presidente da CIDOB entrevistado em 2014, a Confederacao Indigena do Oriente Boliviano (CIDOB) enquanto movimento indigena dos povos indigenas organizou as marchas indigenas nos anos 1990 e 2000, e trouxe como planejamento politico central, subtraido do Projeto de Lei Indigena, a reconstituicao fisica, politica, economica, social e cultural dos territorios que foram usurpados dos indigenas no passado. Segundo ele:

Desse projeto politico outras reivindicacoes estao relacionadas: a) "autogobierno"/autonomias; b) modelo economico alternativo; c) opcao de um modelo de vida proprio de acordo com a diversidade cultural; d) seguranca juridica, ou seja, titulacao (CHAVEZ, 2014).

Segundo Chavez, a Reforma Agraria de 1953 representou a liberacao dos camponeses e dos indigenas da escravidao e se tornou a possibilidade desses grupos terem suas terras para trabalhar e viver. "Ja para os povos indigenas das terras baixas, essa lei significou o ultimo ato de despojo territorial e negacao do Estado de suas identidades indigenas" (CHAVEZ, 2014).

Montero, primeiro dirigente da Organizacao Indigena Chiquitana (OICH), tambem esclareceu que:

O periodo que vai de 1953 a 1994 foi o tempo que os povos indigenas exigiram do governo o reconhecimento de sua existencia no territorio e durante a reforma da Constituicao Politica do Estado em 1994 passaram a incorporar a ideia de que a Bolivia era multietnica e pluricultural. A lei de participacao popular reconheceu que os povos indigenas teriam seu territorio, sua organizacao propria, costumes e o direito a personalidade juridica (MONTERO, 2014).

Foi um processo gradual de retomada das comunidades rurais como indigenas chiquitanas, a partir da autodeterminacao e das leis mais favoraveis a esse reconhecimento destruindo assim, a autoimagem de mesticos, camponeses, cambas, seringueiros, que a sociedade e o proprio Estado posteriormente tambem vieram reconhecer.

Portanto, no que diz respeito as reformas estruturais do Estado nos anos 1990, com a influencia das mobilizacoes das organizacoes indigenas, os povos indigenas das terras baixas conseguiram incluir algumas de suas reivindicacoes nas leis da Bolivia, em cenario regional, entre elas, segundo Chavez (2014): 1) lei de participacao popular (n. 1555/1995); 2) lei florestal (n. 1700/1996); 3) Lei do Servico Nacional da Reforma Agraria (INRA n. 1715/1996). Ainda segundo ele:

A lei de participacao popular estabeleceu a figura juridica da Organizacao Territorial de Base (OTB) e isso permitiu a tramitacao da personalidade juridica das comunidades indigenas reconhecidas na Constituicao reformada de 1994. Porem, na contramao desse avanco nas terras baixas, veio a consolidacao do poder das oligarquias locais na gestao politica, economica e administrativa do municipio, com raros exemplos da real incidencia e participacao indigena na gestao local (CHAVEZ, 2014).

Montero enfatiza:

Ate 1994 nenhuma comunidade tinha personalidade juridica e somente com a promulgacao da lei de participacao popular ficou estabelecido que cada comunidade ou organizacao, para exercer seu direito coletivo, deveria ter personalidade juridica (MONTERO, 2014).

A partir de 1994, com a Lei de Participacao Popular, as comunidades passaram a obter personalidade juridica e a negociar a sua razao social de campesino para indigena. Solicitaram e lutaram por seus direitos e uma vez considerando sua identidade cultural tambem reconheceram que sao originarios. Assim e possivel perceber que essa lei foi considerada um avanco na historia da Bolivia tambem porque permitiu a eleicao direta das autoridades locais e a descentralizacao dos recursos publicos para desenvolvimento local.

Ainda abriu as portas para a participacao na gestao municipal incluindo alguns mecanismos como o Comite de Vigilancia, porem, segundo Montero, "esse comite se tornou um espaco controlado pelas forcas politicas locais e geralmente contrarias as demandas indigenas" (MONTERO, 2014).

Quanto a lei florestal, Chavez a coloca como um grande avanco, uma vez que reconheceu o uso, o aproveitamento sustentavel e exclusivo pelos indigenas dos recursos florestais em seus territorios. Esclareceu que:

Foi a norma fundamental para a defesa do nosso territorio frente ao incessante saque de madeiras nobres por terceiros, e isso gracas aos dispositivos que protegeram as florestas e ao uso estrategico que lhe deram as organizacoes indigenas...

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