Teorias interpretativas, capacidades institucionais e crítica

AutorClèmerson Merlin Clève - Bruno Meneses Lorenzetto
CargoProfessor Titular de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná. Professor Titular de Direito Constitucional do Centro Universitário Autônomo do Brasil - UniBrasil - Professor de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná
Páginas131-168
Rev. direitos fundam. democ., v. 19, n. 19, p. 131-168, jan./jun. 2016.
ISSN 1982-0496
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
TEORIAS INTERPRETATIVAS, CAPACIDADES INSTITUCIONAIS E CRÍTICA
INTERPRETATIVE THEORIES, INSTITUTIONAL CAPACITIES AND CRITIQUE
Clèmerson Merlin Clève
Professor Titular de Direito Constitucional da Universidade Federal do Paraná. Professor Titular
de Direito Constitucional do Centro Universitário Autônomo do Brasil - UniBrasil. Professor
Visitante do Máster Universitario en Derechos Humanos, Interculturalidad y Desarrollo e do
Doctorado en Ciencias Jurídicas y Políticas da Universidad Pablo de Olavide, em Sevilha,
Espanha. Pós-graduado em Direito Público pela Université Catholique de Louvain - Bélgica.
Mestre em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. Doutor em Direito do Estado
pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Líder do NINC - Núcleo de Investigações
Constitucionais em Teorias da Justiça, Democracia e Intervenção da UFPR.
Bruno Meneses Lorenzetto
Professor de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Professor do PPGD do
UNIBRASIL. Visitng Scholar na Columbia Law School, Columbia University, New York (2013-
2014). Doutor em Direito pela UFPR na área de Direitos Humanos e Democracia (2010-2014).
Mestre em Direito pela UFPR na área do Direito das Relações Sociais (2008-2010). Bolsista
pela CAPES durante o Mestrado na UFPR.
Resumo
O artigo é guiado pela indagação a respeito de qual instituição possui
melhores condições para tomar decisões em casos controvertidos e
qual teoria interpretativa seria adequada para conduzir o momento
decisório. Assim, reconhece que a partir da ascensão do Judiciário
como instância privilegiada para a solução de conflitos, teorias
procuraram, de um lado, aprimorar o processo decisório através de
propostas normativas sobre a jurisdição e, do outro, refrear o papel
dos tribunais por meio da deferência deste perante outros poderes.
Logo, o artigo trata do giro linguístico ocorrido no Direito e de duas
teorias interpretativas normativas que acompanharam tal processo, o
direito como integridade de Ronald Dworkin e a interpretação dinâmica
da lei de William Eskridge. Expõe a tese das capacidades institucionais
como antagonista das teorias normativas e delineia suas
características centrais. Na última parte, critica a recepção dessa
teoria no Brasil e propõe uma avaliação dos seus aspectos centrais,
contando com as lições de Lenio Streck sobre a legitimidade da
decisão.
Palavras-chave: Interpretação constitucional; Capacidades
institucionais; Constitucionalismo.
CLÈMERSON MERLIN CLÈVE / BRUNO MENESES LORENZETTO
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Rev. direitos fundam. democ., v. 19, n. 19, p. 131-168, jan./jun. 2016.
Abstract
The article is guided by the question about which institution has the
best conditions to take decisions on controversial cases and which
interpretive theory would be appropriate to conduct the moment of
decision-making. Thus recognizes that from the rise of the Judiciary as
a preferred arena for the resolution of conflicts, theories sought, on the
one hand, improve decision-making process through normative
proposals on jurisdiction and, on the other, curb the role of the Courts
through deference towards other powers. Therefore, the article deals
with the linguistic turn that occurred in Law and with two normative
interpretative theories that followed this process, Ronald Dworkin’s law
as integrity and William Eskridge’s dynamic statutory interpretation. It
exposes the theory of institutional capacities as an antagonist of
normative theories and outlines its central features. In its last part,
criticizes the reception of this theory in Brazil and proposes an
evaluation of its central features, relying on the lessons of Lenio Streck
about the legitimacy of the decision.
Key-words: Constitutional interpretation; Institutional capacities;
Constitutionalism.
1. INTRODUÇÃO
A indagação que procura determinar quem ou, alternativamente, qual instituição
possui melhores condições para tomar decisões sobre casos controvertidos não é uma
novidade teórica. A disputa sobre qual o papel adequado para cada um dos Poderes e
os limites e capacidades que lhes devem ser atribuídos já havia sido elencada no rol
de aspectos determinantes do Estado moderno. Não obstante, diferentes respostas
normativas foram fornecidas no bojo do paradigma moderno no que tange ao arranjo
institucional adequado entre os Poderes e, como consequência, quem teria melhores
condições para a realização de interpretações constitucionais.
Procura-se, com isso, definir qual a maneira mais adequada de ler, compreender
e aplicar os textos de uma Constituição. Um dos motivos pelos quais tal atividade
passou a ser reconhecida como fundamental no plano das tensões entre os Poderes
repousa na ampliação das funções outorgadas ao Judiciário nas últimas décadas em
países democráticos.
1 No cenário brasileiro, tais discussões possuem relevância na
1 Ran Hirschl explica as diferentes formas de compreender com o o Judiciário passou a ser um poder de
grande relevância através da constitucionalização em diferentes lugares do mundo, fenômeno que trata
como “global”. “The hegemonic preservation thesis may help us understand judicial empowerment
through constitutionalization as part of a broader trend whereby crucial policy-making functions are
increasingly insulated from majoritarian control. As we have seen, the world seems to have been seized
by a craze for constitutionalization and judicial review. The transformation of judicial institutions into major
political actors has not been limited to the national level; (…).” (HIRSCHL, 2004. p. 105).
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consolidação e no desembaraçar das diferentes perspectivas teóricas que são
utilizadas para justificar a prática da jurisdição constitucional.
Diante desse contexto, a teoria das capacidades institucionais ganhou atenção
tanto no plano internacional quanto nacional como alternativa para atuações ativistas
por parte do Judiciário. Teorias da deferência foram reestabelecidas em oposição às
construções que procuravam caminhos normativos para expor a “melhor resposta” a
ser apresentada pelos magistrados.
Perante o embate teórico delineado, o artigo apresenta considerações sobre os
jogos de linguagem e relaciona duas teorias interpretativas normativas: a que propõe a
leitura do direito como integridade, de Ronald Dworkin e a teoria interpretativa
dinâmica, de William N. Eskridge.
Na continuidade, o artigo traça um panorama sobre a tese das capacidades
institucionais de Cass Sunstein e Adrian Vermeule e expõe suas principais
características. A busca por uma releitura do formalismo, a defesa do
consequencialismo e do textualismo, sua ancoragem em uma visão empírica e o
resgate da deferência do Judiciário. Os diferenciais da teoria das capacidades
institucionais estão na preocupação institucional, na promoção da teoria dos acordos
incompletamente teorizados, na opção por decisões de segunda ordem e na elevação
das agências como as entidades decisórias mais adequadas para a solução de casos
controvertidos. Tais categorias são trabalhadas e submetidas a uma crítica na última
parte do artigo.
As críticas procuram apontar os limites da teoria das capacidades institucionais,
a insuficiência do textualismo e do consequencialismo, a impossibilidade de uma
simples deferência do Judiciário perante o Executivo, a inafastabilidade dos fatores
políticos e normativos sobre a decisão. Ainda apontam, com o auxílio de Lenio Streck,
como tais questionamentos podem acabar por menosprezar a importância da
legitimidade no momento decisório.
2. JOGOS DE LINGUAGEM
Superada a noção de que o sentido dos textos emana apenas de um lugar
específico ou que há uma relação necessária entre os objetos designados e seus
respectivos “nomes próprios”, passou-se a refletir sobre como textos normativos

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