Teoria e Prática da Propaganda Eleitoral

AutorFrancisco Dirceu Barros
Ocupação do AutorProcurador-Geral de Justiça
Páginas147-340
Manual de prática eleitoral
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Teoria e Prática da Propaganda Eleitoral
1 ARPI – Ação de Reclamação por Propaganda Irregular
1.1 O poder de polícia no Direito Eleitoral
Conforme Hely Lopes Meirelles, o poder de polícia é a faculdade de que dispõe
a Administração pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades
e direitos individuais, em benefício da coletividade.
O Código Tributário Nacional conceitua o que é poder de polícia em seu art. 78,
in verbis:
Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disci-
plinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em
razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à
disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes
de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à
propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
Em uma análise supercial, já notamos que o conceito de poder de polícia no
Direito Eleitoral não é o mesmo no Direito Administrativo.
As razões são diversas, entre elas podemos citar:
a) No Direito Administrativo, o poder de polícia é exercido pelo Poder Legislativo e
pelo Executivo. No Direito Eleitoral, o poder de polícia é exercido pelo Poder
Judiciário e pelo Ministério Público Eleitoral.
b) No Direito Administrativo, o poder de polícia decorre do princípio da supremacia
do interesse público sobre o interesse particular. No Direito Eleitoral, o poder
de polícia decorre da imposição de uma norma.
c) No Direito Administrativo, o poder de polícia tem como características a discri-
cionariedade, autoexecutoriedade e a coercibilidade. No Direito Eleitoral, o
poder de polícia tem como característica apenas a coercibilidade, porque:
Capítulo 5
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1) A discricionariedade no Direito Administrativo é a liberdade de ação que,
nos limites da lei, o administrador tem para agir. No Direito Eleitoral, não
existe liberdade de ação, portanto, tendo notícia de um ato irregular, o
promotor de justiça eleitoral é obrigado a tomar as providências legais. O
poder de polícia, no Direito Eleitoral, é vinculado e não há liberdade de
atuação. Diante de um ato ilegal, o juiz eleitoral e o promotor eleitoral
devem agir para efetivar o cumprimento da lei.
2) A autoexecutoriedade, no Direito Administrativo, é a possibilidade de a
Administração pública fazer cumprir suas decisões, por seus próprios
meios, diretamente, ou seja, sem autorização do Poder Judiciário. Não
existe autoexecutoriedade no poder de polícia do Direito Eleitoral, por-
que se não houver cumprimento da noticação, o juiz eleitoral não pode
aplicar sanção sem o devido processo legal, deverá ociar o Ministério
Público Eleitoral para que tome as providências legais.
3) No Direito Administrativo, o poder de polícia pode ser positivo ou negativo, ou
seja, regula a prática de ato (poder de polícia positivo) ou abstenção de
fato (poder de polícia negativo). No Direito Eleitoral, o poder de polícia é,
em regra, negativo, ou seja, regula a abstenção de um fato, podendo ser
excepcionalmente positivo.
Conclusão 1: considera-se poder de polícia, no Direito Eleitoral, atividade
desenvolvida por prevenção pelo juiz eleitoral ou promotor de justiça eleitoral discipli-
nando direito, interesse ou liberdade, regulando a prática de abstenção de fato, em
razão de interesse público determinado em uma norma.
Conclusão 2: no Direito Eleitoral, o poder de polícia pode ser exercido pelo
juiz eleitoral e pelo promotor de justiça eleitoral.
Conclusão 3: o poder de polícia só tem uma característica, qual seja, a coerci-
bilidade e, no caso da propaganda irregular, após a prévia noticação cienticando
o beneficiário, o candidato, o partido político, a coligação ou o Ministério
Público Eleitoral devem propor a representação a que alude o art. 96 da Lei n.
9.504/1997, como objetivo de aplicar as sanções legais.
1.1.1 A fundamentação legal do poder de polícia do juiz
A fundamentação do poder de polícia para o juiz eleitoral se encontra no art.
O direito de propaganda não importa restrição ao poder de polícia quando este deva ser
exercido em benefício da ordem pública.
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A reforma eleitoral consolidou o entendimento dominante do TSE, acrescen-
tando os parágrafos 1º e 2º ao art. 41 da Lei n. 9.504/1997, in verbis:
Art. 41. A propaganda exercida nos termos da legislação eleitoral não poderá ser objeto
de multa nem cerceada sob alegação do exercício do poder de polícia ou de violação de
postura municipal, casos em que se deve proceder na forma prevista no art. 40.
§ 1º O poder de polícia sobre a propaganda eleitoral será exercido pelos juízes eleitorais
e pelos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais.
§ 2º O poder de polícia se restringe às providências necessárias para inibir práticas ilegais,
vedada a censura prévia sobre o teor dos programas a serem exibidos na televisão, no
rádio ou na internet.
1.1.2 A fundamentação legal do poder de polícia do Ministério Público
Eleitoral
Embora o artigo supracitado arme que o poder de polícia “será exercido pe-
los juízes eleitorais e pelos juízes designados pelos Tribunais Regionais Eleitorais”,
entendemos que atenta contra a democracia a possibilidade de violação ao princípio
da igualdade na propaganda eleitoral, portanto, o Ministério Público Eleitoral também
detém poder de polícia com a precípua nalidade de fazer cessar de forma inconti-
nenti práticas ilegais na propaganda eleitoral com o to de evitar a irreparabilidade do
dano em face da demora na prestação jurisdicional.
A fundamentação do poder de polícia para o promotor de justiça eleitoral extra-
ímos da Constituição Federal, art. 127, in verbis:
O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado,
incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses so-
ciais e individuais indisponíveis.
Há dois fatores complicadores no fato de o juiz eleitoral exercer o poder de
polícia, a saber:
a) Caso o noticado não cumpra a ordem do juiz eleitoral para retirar a propa-
ganda eleitoral, estará congurado o crime de desobediência, previsto no
art. 347 do código eleitoral. O problema é que o juiz eleitoral estará impedido
de atuar como julgador no processo criminal. No mesmo sentido, é a posi-
ção do TSE: “Havendo desobediência à ordem do juiz eleitoral, no exercício
do poder de polícia, ca o mesmo impedido de atuar como julgador no pro-
cesso criminal que irá apurar tal crime” (Vide Ac- n. 220 do TSE).
b) Com a mesma razão, entendemos que afronta drasticamente os princípios cons-
titucionais da ampla defesa e contraditório o fato de o juiz em atividade extraju-
dicial mandar retirar uma propaganda por entender ser irregular ou criminosa e
depois presidir o procedimento judicial com escopo de aplicar a sanção eleitoral.
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