Teoria Geral dos Recursos Eleitorais Criminais

AutorFrancisco Dirceu Barros/Janiere Portela Leite Paes
Páginas163-197

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1 noções Gerais

Conforme mencionado anteriormente, recurso é o meio jurídico voluntário, utilizado antes da preclusão, para obter o reexame de uma decisão criminal, dentro da mesma relação jurídica processual de que emana a decisão impugnada, proveniente do desdobramento ou continuidade da relação processual inicial.

Para Távora127, “trata-se de exercício de direito potestativo, consubstanciado em um ônus processual” com a finalidade de buscar a reforma ou invalidação da decisão impugnada.

2 Natureza Jurídica

Existem várias correntes doutrinárias com o objetivo de definir a natureza jurídica do recurso. Sendo assim, passaremos a destacar as ideias defendidas por estas correntes.

Para alguns doutrinadores, a natureza jurídica do recurso apresenta-se como desdobramento do direito subjetivo de ação, em que o recurso seria a continuidade da relação jurídica processual. Todavia, embora considerada majoritária, essa posição não está isenta de críticas.

Outra corrente defende que o recurso é “uma nova ação dentro do mesmo processo”128, tendo em vista que existem diversas pretenções dentro da mesma relação jurídica. Todavia, esta corrente é bastante criticada por descaracterizar a própria essência do recurso.

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A terceira corrente defende como recurso qualquer providência que busque obter a reforma da decisão. Contudo, alguns recursos têm como finalidade a invalidação da decisão ou até mesmo a nulidade do processo.

3 Princípios aplicáveis aos recursos eleitorais criminais
3. 1 Princípio da voluntariedade

O recurso é um direito assegurado à parte e, em regra, não é uma obrigação. Somente à parte sucumbente, cabe a oposição do recurso. É, portanto, faculdade. Se a parte o deseja, recorre nos termos do artigo 574, caput, primeira parte, do Código de Processo Penal.

Mesmo atuando o defensor público ou dativo, prevalece a voluntariedade recursal.

No mesmo sentido, é a posição dominante do STF (2ª turma, HC
93.120/SC) e STJ ( 6ª turma, HC 105.845/SC).

Embora o art. 574 do CPP mencione o chamado “recurso de ofício”, importante salientar que não se trata efetivamente de recurso, e sim de reexame necessário da matéria por imposição legal.

3. 2 Princípio do duplo grau de jurisdição

Entende-se como duplo grau de jurisdição a possibilidade de um reexame integral, leia-se quanto à matéria de fato e de direito, da sentença definitiva proferida em determinada causa, por órgão jurisdicional diferente do que proferiu a decisão contestada.

Alberto Silva Franco e Rui Stoco129dizem que o princípio do duplo grau de jurisdição não está inscrito na atual CF como garantia constitucional. Implicitamente, porém, foi adotado, bastando atentar-se para as disposições sobre a competência recursal dos tribunais, não só contemplando a dualidade, mas institucionalizando a pluralidade

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dos graus de jurisdição (arts. 102, 105, 108, CF). Ada Pellegrini e outros o conceituam como “princípio constitucional autônomo, decorrente dessa estruturação dos órgãos de jurisdição superior” (op. cit., p. 23).

Há alguns casos em que não é possível efetivar o duplo grau de jurisdição. É o caso dos réus que têm foro por prerrogativa de função, a exemplo da competência originária do Supremo Tribunal Federal.

Luiz Flávio Gomes130, com inteira razão, afirma que o fundamento dos recursos é o duplo grau de jurisdição. Não está explícito na CF. Faz parte do direito de defesa e de ação. Está contemplada, entretanto, na Convenção Americana de Direitos Humanos (art. 8º, 2, h). Assegura a possibilidade de reexame de toda decisão criminal (quanto aos fatos, à prova e ao direito aplicado). Exceção no Brasil: casos de competência originária dos tribunais. Penso que isso é inconstitucional, porque a CADH, nesse ponto, tem força constitucional.

3. 3 Princípio da livre fundamentação recursal

O princípio em estudo defende que o recorrente pode invocar qualquer fundamentação, seja de ordem fática ou jurídica.

A exemplo do recurso de apelação de um julgamento de um crime de roubo, em que o recorrente pode discutir os fatos, as provas que ensejaram a absolvição ou condenação.

3. 4 Princípio da fundamentação recursal vinculada

Ao contrário do que ocorre com o princípio da livre fundamentação recursal, neste princípio, a fundamentação é vinculada, ou seja, o recorrente tem que invocar necessariamente um dos fundamentos indicados pela lei ou pela Constituição Federal.

Os recursos extraordinário e especial são de fundamentação vinculada, ou seja, só são cabíveis nas hipóteses previstas na Constituição Federal.

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3. 5 Princípio da taxatividade ou legalidade recursal

Deve ser sempre averiguada a possibilidade jurídica do recurso, ou seja, se o recurso interposto é previsto em lei, logo, concluímos que o rol dos recursos é numerus clausus, portanto, em atendimento à segurança jurídica, a via recursal não pode permanecer infinitamente aberta.

Sendo assim, pode-se dizer que se trata de condição necessária a existência de previsão legal expressa dos recursos no processo penal como requisito para que seja conhecido.

3. 6 Princípio da conversão

Em caso de interposição do recurso para o tribunal incompetente, o princípio em estudo defende a possibilidade de haver conversão do recurso para o tribunal correto.

3. 7 Princípio da complementariedade das razões recursais

O princípio defende a possibilidade de haver complementação das razões recursais no caso de haver mudança na decisão judicial combatida.

Por exemplo, o juiz, depois do recurso interposto pela parte, corrige erro material ou erro de cálculo contido na decisão. A parte recorrente tem direito de complementar suas razões recursais, para atacar agora o que foi feito posteriormente pelo juiz.131

3. 8 Princípio da variabialidade recursal

É a possibilidade que a parte tem de desistir de um recurso e, observando-se a tempestividade, substituir por outro. Todavia, veda-se que sejam exercidos simultaneamente contra a mesma decisão. Assim, desde que observado o prazo, o sucumbente poderá mudar de recurso, o que deve ser entendido como renunciado o primeiro, após a interposição do segundo.132

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Contudo, há divergência doutrinária relativa à ocorrência do fenômeno da preclusão consumativa.

Távora133entende que tal princípio não se aplica ao processo penal, em decorrência da existência de preclusão consumativa por ocasião da apresentação do primeiro recurso.

No entanto, poderíamos citar como exemplo da aplicação desse princípio o processo penal no caso da interposição inicial de embargos de declaração e posteriormente interposição de outro recurso como a apelação, caso em que não ocorreria a preclusão consumativa.

3. 9 Unirrecorribilidade recursal (ou singularidade ou unicidade)

Pelo princípio da unirrecorribilidade dos recursos, a parte não pode, em regra, interpor mais de um recurso contra a mesma decisão, visando à mesma pretensão.

Atendendo ao princípio da unirrecorribilidade recursal, o art. 593, § 4º, do Código de Processo Penal, exclui a possibilidade de interposição do recurso em sentido estrito, se da decisão couber apelação, pois esta absorve aquele. Assim, por exemplo, se o Ministério Público recorre da sentença condenatória, pedindo aumento da pena e revogação do sursis, interporá exclusivamente apelação, e não esta e mais o recurso em sentido estrito. O mesmo ocorre se numa mesma sentença houver absolvição com relação a um crime e extinção da punibilidade quanto a outro.134Disse, em regra, porque entendo que há algumas exceções, veremos no capítulo próprio que é possível a interposição concomitante:

  1. Recurso extraordinário e especial.

  2. Embargos infringentes e de nulidade.

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