Desenvolvimento e sustentabilidade: o grande conflito de nossos dias

Autor1.Alindo Butzke - 2.Eliane Willrich Hofrmann
Cargo1.Docente do Mestrado em Direito da UCS. Biólogo, Mestre em Ecologia e Doutor em Ciências Ambientais. Caxias do Sul - RS. - 2.Advogada, Docente da UCS e Mestranda em Direito Ambiental na UCS. Caxias do Sul - RS.
Páginas43-61

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Considerações iniciais

Desenvolvimento não significa necessariamente degradação ambiental.

O IDH (índice de Desenvolvimento Humano), que é usado para avaliar a qualidade de vida das comunidades (municípios) no Brasil, leva em conta o saneamento, que é um índice de qualidade ambiental.

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Deve-se entender por "desenvolvimento" um processo com sucessivas fases para se chegar a um estágio final desejável, em tese melhor do que o "status quo" do qual se parte em busca de uma nova realidade.

É óbvio que ao longo da curta história da existência do homem no planeta Terra, desde o período Pleistoceno há pelo menos 1,6 milhão de anos, quando o homem surgiu (pelo menos 3,5 bilhões de anos após os primeiros seres vivos), as modificações ambientais e a melhoria das condições de vida humana aconteceram, em grande parte, de forma vinculada, em especial, no último século.

O início do terceiro milénio da era cristã representa, no entanto, um panorama ímpar na relação homem-natureza. Se, por um lado, nunca antes a humanidade havia experimentado semelhantes condições de conforto e bem-estar, por outro, nunca houve tamanha pressão sobre os recursos naturais, vivos ou inanimados, determinando seu desaparecimento ou a ameaça de sua extinção a curto prazo.

1 Desenvolvimento x sustentabilidade

Um dos principais índices usados para se avaliar o desenvolvimento de um país é o Produto Interno Bruto (PIB) que espelha o bem-estar económico. A este parâmetro escapam, entre outros, a produção de alimentos para o consumo familiar e o trabalho não assalariado de donas de casa. O PIB certamente também não espelha muito bem questões como: índice de analfabetismo, saúde coletiva da população, além de expressar o ganho médio por indivíduo/ano, independente do índice de pobres ou muito ricos existentes no país ou no estado da federação.

Se, por outro lado, considerarmos o avanço científico que produz conhecimento que é colocado à disposição do homem e que gera tecnologia usada para a produção de conforto ou de bens de consumo, ou de medicamentos ou fármacos para a saúde humana, ou, se considerarmos ainda, os avanços e o progresso da Medicina, por óbvio, reconhecemos a importância do desenvolvimento.

Quando, no entanto, vemos estatísticas que mostram o alarmante número de pessoas que em nossos dias estão em "pobreza absoluta", não tendo umaPage 45refeição completa por dia, ou não tendo acesso à água potável para beber, resta perguntarmo-nos: "Mas não somos habitantes do mesmo planeta Terra que usamos os mesmos recursos naturais?" Quando consumimos os recursos à grande velocidade, não dando tempo a que, ao menos, os renováveis se refaçam, que equilíbrio ambiental esperamos para o futuro?

Segundo Butzke3:

Meio ambiente ecologicamente equilibrado não significa meio ambiente não-alterado.

O termo equilibrado incorpora a ideia de altos e baixos; a ideia dos pratos de uma balança que busca, em seu movimento de sobe-e-desce seu ponto de inércia; um pêndulo em movimento que oscila entre períodos positivos e negativos em torno de um ponto médio em busca da estabilidade.

A expressão ecologicamente equilibrado incorpora a noção de equilíbrio fluente, isto é, um equilíbrio dinâmico que se mantém graças à contínua e permanente ruptura do equilíbrio. Na expressão ecologicamente está implícita a lei de sobrevivência da selva. As relações intra e interespecíficas, harmónicas e desarmônicas estão contempladas nesse contexto.

[...] O termo autossustentável incorpora a segurança de que o potencial biótico de uma determinada espécie da biodiversidade agredida pelo homem tenha, no número suficiente de indivíduos (espécimes) remanescentes, a capacidade reprodutiva suficiente para que, apesar da resistência ambiental, garanta a continuidade da espécie no tempo e no espaço por ela já colonizado.

Se, apesar do conhecimento que temos sobre os limites do potencial biótico dos recursos renováveis, ainda não nos damos conta da importância e da necessidade de darmos nossa contribuição ao processo de manutenção dos sistemas vivos e da qualidade de vida, pensemos, então, na dívida que o homem contraiu com a natureza, visto que foi às custas dela que ele construiu seu mundo de conforto e bem-estar. Surge, então, a questão: quem são, e em que proporção, os contraendos da dívida ambiental?

A nosso ver a resposta é simples e somente esta: todos temos nosso quinhão de participação - o cidadão como indivíduo e a sociedade como um todo, as empresas, os governos, as entidades, os municípios, os estados e os países. Em tese, devem mais os que mais progrediram na vida, os mais afortunados, porque,Page 46direta ou indiretamente, mais usufruíram dos bens naturais e, portanto, mais contribuíram para a geração da delicada situação de insustentabilidade ambiental em nossos dias e no futuro próximo.

Na continuação do presente trabalho, vamos falar sobre a TUTELA AMBIENTAL NO BRASIL E AS BASES JURÍDICAS DO DESENVOLVIMENTO E DA SUSTENTABILIDADE.

2 A tutela ambiental no Brasil e as bases jurídicas do desenvolvimento e da sustentabilidade

O conceito usual de desenvolvimento sustentável incorpora a conciliação de duas situações aparentemente antagónicas; de um lado, há a necessidade da preservação do meio ambiente e, de outro, a necessidade de incentivar o desenvolvimento socioeconômico. Essa conciliação será possível com a utilização racional dos recursos naturais, sem, contudo, causar poluição incontrolável ao meio ambiente ou degradar o ambiente ou gastar os recursos naturais em velocidade maior do que a capacidade de regeneração dos recursos renováveis, base da norma constitucional - art. 225:

  1. construir uma sociedade livre, justa e solidária;

  2. garantir o desenvolvimento nacional;

  3. erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

  4. promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor idade e quaisquer outras formas de discriminação ( art.3º, 1,11, III, e IV, da CF).

Para que o cidadão possa ter uma vida digna (art. 170, caput, da CF) e uma sadia qualidade de vida (art. 225, caput, da CF), é necessário garantir a ele o direito à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à previdência social, à proteção à maternidade e à infância, à assistência aos desamparados (art.6º, caput, da CF).

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Mede-se o desenvolvimento económico pelo desenvolvimento da tecnologia, a difusão do conhecimento e dos valores culturais e sociais através dos meios de comunicação e um alto desenvolvimento na qualidade de vida através do conjunto de dados do DH e do IDH, cujos critérios são: longetividade, renda, educação, nível de criminalidade, infra-estrutura das cidades, ruas calçadas, transporte urbano, espaços de lazer, indicadores da realidade coletiva. O que não é encontrado ou é escasso, em regiões onde seres humanos morrem de fome, salientando a gritante diferença entre países industrializados e desenvolvidos dos países ainda sem desenvolvimento ou emergentes.

A Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano, realizada em Estocolmo em 1972, que, no seu primeiro princípio, estabeleceu:

O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras.

O princípio do direito humano fundamental está associado ao princípio do desenvolvimento sustentável, como veremos a seguir, conforme documentam a Constituição Federal de 1988 (art. 225, capuf) e as Conferências das Nações Unidas sobre Meio Ambiente, de Estocolmo-1972, Rio-1992 e de Johannesburgo-2002.

É oportuno citar, com Elida Seguin4, os princípios do desenvolvimento sustentável, que compreendem:

1) o crescimento económico;

2) a erradicação da pobreza;

3) o controle populacional;

4) a proteção ambiental;

5) a proteção dos direitos humanos fundamentais;

* direito à vida;

* direito à saúde;

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* direito à dignidade;

* direito ao desenvolvimento. 6) a democracia participativa.

Esses princípios só podem ser alcançados através de um "Estado Democrático Participativo" que estabelece para o desenvolvimento económico, políticas ambientais sustentáveis e políticas educacionais de conscientização ambiental do indivíduo e da coletividade. Cada indústria, cada produtor agropecuário que colocar no mercado seu produto contendo o selo de proteção ao meio ambiente, dá ao consumidor a opção de comprar produtos que foram produzidos sem agredir a natureza. Com essa atitude, estaremos protegendo o meio ambiente e praticando parte do desenvolvimento sustentável.

Paralelamente devemos caminhar para a redução do desperdício através de uma reengenharia das atividades económicas, no sentido da racionalização da produção. Sobre a temática, Elida Seguin sustenta que "a diminuição de gastos pode advir da economia de matérias-primas e energia, da reciclagem de resíduos e aproveitamento de subprodutos "5. Neste tema, me permito acrescentar que também é necessária uma reengenharia nos hábitos de consumo. O desperdício nas atividades económicas, assim como no consumo, é também um atentado ao desenvolvimento sustentável.

Para Cançado Trindade6, todos os aspectos do direito ao desenvolvimento são indivisíveis e interdependentes, abrangendo os aspectos económicos, sociais e culturais, sem esquecer dos...

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