Contribuição Sindical dos Profissionais Liberais

AutorBreno Green Koff
CargoAdvogado e professor de Direito/RS
Páginas54-57

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Os sindicatos estaduais "...salvo honrosas exceções, são aqueles denominados de sindicatos de cartório que pouca ou quase nenhuma representatividade possuem, existindo na sua grande maioria somente para arrecadar em benefício e direito exclusivo de sua diretoria"1.

1. Considerações iniciais

As associações de profissionais liberais questionam a legalidade da cobrança sindical que lhes está sendo exigida pelos sindicatos das respectivas categorias.

Os sindicatos, em contrapartida, alegam que são entidades responsáveis pelo recolhimento, inclusive do liberal autônomo, da contribuição sindical e a confederativa previstas respectivamente nos arts. 578 e ss. da Consolidação das Leis Trabalhistas, e art. 8º, IV, da Constituição Federal.

A tese primacial defendida pelos sindicatos lastreiase no sentido de que a contribuição sindical tem caráter tributário; logo, a cobrança é devida independente de filiação.

Os profissionais liberais, em suas antíteses, ponderam que estão dispensados da contribuição sindical, porque se encontram devidamente registrados e inscritos nos seus conselhos de classe, órgãos estes que, tendo em vista seu munus publicum, laboram na defesa da sociedade, na observância das leis e da Constituição, valorizando os princípios da ética, da cidadania e da pessoa humana.

Com efeito, a matéria versada, de há muito discutida em nossos pretórios, envolve a conflitante imposição da contribuição sindical e a confederativa, ao profissional liberal.

No intuito de contribuir, apresentamos sucinto apanhado sobre o tema em questão.

2. O sistema sindical brasileiro

A contribuição sindical foi criada pela hegemonia do governo de Getúlio Vargas, em 1939, cuja finalidade era vincular os sindicatos ao Estado. Consistia no valor pago compulsoriamente pelos trabalhadores, de natureza tributária, no mês de março de cada ano, com o propósito de sustentar o Sistema Sindical Confederativo2 .

Esperava-se, contudo, uma modernização em nosso sistema sindical com o advento da Constituição de 1988, pois os artigos 511 a 625 da Consolidação das Leis do Trabalho, que tratam da organização sindical e das convenções coletivas de trabalho, foram quase na sua totalidade ab-rogados3de suas redações originais. Porém, alguns pressupostos básicos impedem a modernização. Com o objetivo de gerar uma profusa e automática fonte de renda para os sindicatos, alguns de seus dirigentes insistem em uma contribuição sindical obrigatória, mesmo para os trabalhadores não-sindicalizados e a proibição de haver mais de um sindicato de cada categoria na mesma base territorial.

Nada obstante, o caput do art. 8º da Constituição da República prevê, de maneira genérica, a liberdade sindical, ao enunciar: "É livre a associação sindical (...)." Contudo, os incisos trazem restrições, veja-se:

"II - é vedada a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, representativa de categoria profissional ou econômica, na mesma base territorial, que será definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, não podendo ser inferior à área de um Município;

IV - a assembléia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da representação sindical respectiva, independentemente da contribuição sindical prevista em lei;"

Há de se perceber, com isso, a discrepância entre o caput do art. 8º e os dois incisos acima referidos. Enquanto o caput prevê a independência sindical, os incisos estabelecem a contribuição sindical compulsória.

Conforme se depreende da letra do texto transcrito, o inciso IV do art. 8º da Constituição Federal dispõe que caberá à assembléia geral dispor sobre a contribuição confederativa (contribuição para custeio do sistema confederativo), sendo descontada em folha de pagamento, independente da contribuição sindical prevista em lei.

Está cristalina, pois, a distinção entre as duas modalidades de contribuição: uma, trata de contribuição confederativa, prevista por ato decisório, em assembléia geral de qualquer categoria profissional e serve para o custeio do sistema confederativo e a representação sindical; a outra, é uma contribuição sindical prevista em lei.

Em que pese a abrangência das instituições de Direito do Trabalho, o sistema sindical pátrio está, in totum, dirigido para as diferenças existentes nas relações das duas categorias profissionais. De um lado a classe dos trabalhadores e em oposição a esta, a dos empregadores. Assim, não há se incluir, nessa situação, os profissionais liberais, porque eles não participam das relações de emprego, estando, conseqüentemente, fora da abrangência das instituições acima aludidas.

Todas as referências eventualmente registradas na legislação trabalhista sobre profissionais liberais ou agentes autônomos são casuais, isso porque estes trabalhadores não mantêm relação de emprego. Por decorrência, estão fora do âmbito das instituições de Direito do Trabalho, e assim, não se sujeitam ao pagamento de contribuição sindical.

Como as prerrogativas dos sindicatos estão todas voltadas para a proteção da categoria dos profissionais (empregados) em face da categoria econômica (empregadores), existindo relação somente entre estes dois pólos, o sindicato nada poderá fazer para ajudar o liberal autônomo. Apenas para exemplificar, veja-se na prerrogativa normativa: o sindicato poderá firmar acordos e convenções coletivas de trabalho, para reger as condições da categoria (Constituição, art. 7º, XXVI), mas esta tarefa irá refletir apenas em quem tem relação de emprego. Da mesma forma, ocorre na prerrogativa de declaração de greve (Lei 7.783/89): em face de quê farão greve os profissionais liberais? Logo, o sindicato não possui Page 55 capacidade representativa para proteger os trabalhadores sem vínculo empregatício e resta sem sentido que receba contribuição pecuniária deles.

3. Da cobrança abusiva

Por imposição legal, como sabido, todos os profissionais liberais, para exercer a sua profissão, deverão estar inscritos no conselho profissional de sua categoria e pagar a contribuição correspondente.

Logo, um profissional liberal ao pagar seu conselho profissional e o sindicato de sua categoria, e sendo ambas cobranças pagas com a mesma finalidade, e diante das questões já expostas sobre a falta de capacidade representativa dos sincatos quanto aos profissionais liberais autônomos, será praticamente um enriquecimento ilícito dos sindicatos recolher contribuição dos profissionais liberais, já que os sindicatos nada podem fazer por eles, em face do caráter bipolar do sistema sindical brasileiro.

Consecutivamente, inaceitável se comine ao profissional liberal duas modalidades de pagamento, com a mesma finalidade, a implicar manifesto abuso. Neste talante, convém lembrar: todo o profissional que esteja em dia com a anuidade devida ao seu Conselho terá, obrigatoriamente, isenção do pagamento da contribuição sindical, conforme art. 47 da Lei 8.906/94.

A propósito, nesse sentido é o precedente normativo 119 do Tribunal Superior do Trabalho, que bem fundamenta a quaestio4 :

"Fere o direito à plena liberdade de associação e de sindicalização cláusula constante de acordo, convenção coletiva ou sentença normativa fixando contribuição a...

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