A Rotulação da Adolescente Infratora em Sentenças de Juízes e Juízas de Direito do Distrito Federal

AutorMarília Montenegro Pessoa de Mello - Manuela Abath Valenca
CargoUniversidade Católica de Pernambuco, Recife, PE, Brasil - Universidade de Brasília, Brasília, DF, Brasil
Páginas141-163
A Rotulação da Adolescente Infratora em Sentenças
de Juízes e Juízas de Direito do Distrito Federal
The Rotulation of Female Young Offenders as they are Sentenced in a
Brazilian Court
Marília Montenegro Pessoa de Melo
Universidade Católica de Pernambuco, Recife – PE, Brasil
Manuela Abath Valenca
Universidade de Brasília, Brasília – DF, Brasil
Resumo: o presente trabalho explorou o con-
junto de representações sociais de magistrados
e de magistradas do TJDFT sobre as trajetórias
das adolescentes em cumprimento de medida
socioeducativa de internação na Unidade de
Internação de Santa Maria, procurando compre-
ender como essa categoria de adolescentes in-
fratoras é construída em sentenças. Para tanto,
realizou-se uma análise de conteúdo em 17 sen-
tenças. Verificou-se que há uma ênfase na des-
crição das “trajetórias perdidas” das meninas
no processo de fundamentação da medida de
internação. A relação criada entre essa “carreira
de indisciplinas” e a medida de internação tem
um papel positivo de constituição desse sujeito
criminal, nomeando-se o tipo social de quem se
espera o comportamento criminoso.
Palavras-chave: Representações Sociais. Ma-
gistrados. Adolescentes. Sujeição Criminal.
Abstract: this study explores the social repre-
sentations of judges of the TJDFT about the
trajectories of inmates of Santa Maria Unit – a
juvenile prison for girls. We tried to unders-
tand how this category of offenders teenagers
is constructed on the sentences. To do so, we
performed a content analysis of 17 sentences.
We found that there is an emphasis on the des-
cription of the “lost trajectories” of these girls.
Their “career of indisciplines” justifies the de-
tention and the sentences have a positive role in
the constitution of criminal subject, naming the
social type from who we can expect criminal
behavior.
Keywords: Social Representation. Judges.
Young.
Recebido em: 04/11/2015
Revisado em: 19/03/2016
Aprovado em: 27/03/2016
http://dx.doi.org/10.5007/2177-7055.2016v37n73p141
142 Seqüência (Florianópolis), n. 73, p. 141-164, ago. 2016
A Rotulação da Adolescente Infratora em Sentenças de Juízes e Juízas de Direito do Distrito Federal
1 Introdução
A teoria do etiquetamento incorporou aos estudos sobre o desvio
uma preocupação central nos processos de interação mediante os quais:
a) comportamentos são definidos como desviantes; b) as pessoas são de-
finidas como tipos desviantes; e c) que reações são tomadas em relação a
esses comportamentos e pessoas. A atribuição de rótulos de desviantes a
determinadas condutas e pessoas, portanto, é fruto dessa rede complexa
de negociações de sentido que envolve sujeitos com diferentes capitais
político e simbólico.
No Brasil, a construção desse tipo social desviante pelas instân-
cias do sistema de justiça relaciona a pobreza ao crime, com um forte
elemento racial. A adesão, no século XIX, às premissas do positivismo
criminológico reforçou teses anteriores acerca da degeneração de algu-
mas raças, criando um campo fértil à noção do tipo biológico criminoso.
Nina Rodrigues e a sua teoria da incapacidade biológica dos povos negro
e indígena para compreender as regras de uma sociedade civilizada são
um bom exemplo de como a criminologia atribui a esses grupos o status
privilegiado de perigo.
Os estudos sobre a repressão à vadiagem no início da Era Repu-
blicana são elucidativos nesse sentido. O tipo perigoso estava especifica-
mente descrito na pessoa do pobre, que vaga pelas ruas e “negava” uma
ética do trabalho. À polícia cabia passar boa parte de seu tempo em busca
de “desordeiros”, prostitutas, embriagados e vadios. Na justiça infracio-
nal, observa-se essas esquematizações. Estudos recentes sobre o padrão
de atuação punitivo sobre adolescentes aponta para uma tendência, no iní-
cio do século XX, em apreender adolescentes relacionados a ocorrências
de embriaguez, vadiagem e prostituição.
A justiça juvenil de matriz tutelar manuseava a categoria de “me-
nor” e, com ela, a representação de uma juventude vulnerável, sobre em
quem deveriam recair as instâncias de controle. A doutrina da proteção
integral representou um esforço em torno da superação da construção do
menor. Porém, diversas pesquisas vêm atentando para o fato de que o tipo

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