Resenha de jurisprudência

AutorAndré Leonardo Copetti Santos
Páginas267-280
RESENHA DE JURISPRUDÊNCIA
A jurisprudência que ora é apresentada na Revista Direitos Culturais
constitui-se em julgado emblemático prolatado pelo Supremo Tri bunal Federal,
uma vez que deu concretude ao texto constitucional inscrito nos a rtigo 231 e 232
Depois de longo período h istórico de aviltamentos e violências
perpetradas contra os indígenas pelos brancos colonizadores, o sistema brasileiro
de administração da justiça, condensou nesta ação popular, o r econhecimento não
só da relevância cultural dos povos originários que habitavam e habitam o território
brasileiro, mas também da ilegitimidade da ocupação de suas terras pelos
colonizadores europeus e das sucessivas transferências que foram realizadas nestes
patrimônios. Mesmo não havendo referência expressa no texto da decisão, há, sem
qualquer dúvida, paradoxalmente, a adoção de uma posição filosófico-política
defendida pelo ultraliberal Robert Nozick, acerca da necessidade de retificação dos
efeitos de aquisições ilegítimas de propriedades. Se na maioria dos casos, com o
passar do t empo, torna-se impossível saber quem são os propri etários legítimos e,
portanto, inviável se apresenta qualquer espécie de retificação, no caso dos
indígenas brasileiros tal tarefa constituiu-se factível.
O problema de fundo que foi tr atado nesta ação popular refere-se
indiscutivelmente à legitimidade da aquisição inicial da propriedade das terras
pelos indígenas originários do território brasileiro. Enquanto a relação dos povos
indígenas com a terra brasileira tradicionalmente por eles ocupada foi pacífica,
comunitária e preservacionista, a r elação dos colonizadores foi, ao contrário,
violenta, individualista e exploratória.
A suposta legitimidade da ocupação, pelos colonizadores, das terras
originalmente possuídas pelos índios, baseou-se unicamente, numa perspectiva
lockeana, pela qual a propriedade de uma coisa justifica-se pela agregação do
trabalho que a ela é feita. Esta nunca foi a perspectiva dos indígenas na sua relação
com o mundo.
O próprio t exto c onstitucional a preendera essa perspectiva ao
estabelecer um regime constitucional de demarcação das terras tradicionalmente
ocupada pelos indígenas. A Constituição estabeleceu linhas fundantes de um novo
estatuto jurídico da causa indígena ao positivar uma série de tutelas a bens
relevantes para uma vida boa a ser levadas pelos indígenas, respeitadas suas
particularidades culturais quanto a isto, Neste sentido, os artigos 231 e 232 foram
riquíssimos e a possibilidades interpretativas de construção de um sistema legal de
proteção passaram a ser muitas.
Alguns argumentos utilizados para a fundamentação desta decisão são
relevantíssimos e c olocam o constitucionalismo brasileiro numa posição de
vanguarda em relação a questões envolvendo povos originários. Cit e-se. Por
exemplo, a atribuição de sentido constitucional ao vocábulo índios; a demarcação
de terras in dígenas como um capítulo avançado do constitucionalismo fraternal; o
falso antagonismo entre a questão indígena e o desenvolvimento; o c onceito
positivo do ato de demarcação de terras indígenas; o modelo contínuo de
demarcação de terras indígenas; a relação de pertinência entre terras indígenas e
meio ambiente.

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