A representatividade adequada na ação coletiva passiva

AutorGustavo Viegas Marcondes
Ocupação do AutorBacharel em Direito pela Universidade Estadual Paulista (UNESP)
Páginas64-74

Neste capítulo, traz-se uma abordagem conceitual acerca da representatividade adequada nas ações coletivas em geral, e a partir daí, uma abordagem acerca da representatividade adequada nas ações coletivas passivas. O aspecto fundamental a ser abordado diz respeito à possibilidade de controle judicial da representatividade adequada daquele que age em nome do grupo, sobretudo nas ações coletivas passivas, nada obstante o método de determinação da legitimidade ad causam para o Processo Coletivo no Brasil ser ope legis, ou seja, oriundo de um comando legal predeterminado.

O estudo da representatividade adequada (e das possibilidades de controle judicial) se mostra fundamental para a análise do próprio cabimento da ação coletiva passiva, na medida em que é sobre esse elemento do Processo Civil coletivo que se constrói o arcabouço teórico necessário para que o grupo figure no polo passivo de uma ação coletiva. Em outras palavras, sem que o grupo se faça adequadamente representado no processo, os efeitos da decisão judicial, qualquer que seja o resultado da demanda coletiva, não poderão atingir os seus membros.

Isso se dá por um imperativo lógico, na medida em que, ao contrário do que ocorre na ação coletiva ativa, em sede de ação coletiva passiva, o representante – que deverá atuar adequadamente em defesa dos interesses de todo o grupo – ocupa o polo passivo da ação, o que significa que a sua presença do processo se dá não por ação, mas por reação, em decorrência de uma escolha prévia, feita pelo autor da demanda.

Dessa forma, o múnus da representação na ação coletiva passiva não decorre, ao menos num primeiro momento, de uma escolha do próprio representante, mas daquele que o elege para tutelar os interesses do grupo que representa. Daí porque o controle judicial da representatividade adequada se faz tão relevante quando se trata de ação coletiva passiva.

Ao se pontuar, como se fez acima, que o traço distintivo preponderante entre o Direito Processual Civil clássico e o Direito Processual Civil coletivo se concentra nas “extremidades do procedimento”, ou seja, no regime de determinação da legitimidade ad causam e da coisa julgada, procurou-se destacar duas circunstâncias fundamentais.

Em primeiro lugar, que não se trata propriamente de um ramo autônomo da ciência do Direito, mas sim de um ramo autônomo do Direito Processual, de modo que, ainda que dotados de novas feições, os institutos universais da ciência processual são comuns tanto a um quanto ao outro ramo. Em segundo lugar, procurou-se também destacar que, ao menos em nosso sentir, não está precisamente no objeto da lide o fator essencial para que se determine a natureza da tutela jurisdicional reclamada no caso concreto, se individual ou coletiva, mas sim no modo de prestação da tutela jurisdicional. Dizemos especificamente do modo de conhecimento do litígio e da entrega da prestação jurisdicional.

Está claro que em sede de tutela jurisdicional coletiva, como regra geral, a determinação da legitimidade ad causam não segue o mesmo iter percorrido em sede de tutela jurisdicional individual.

No Processo Civil clássico, será considerado legitimado ativo aquele que se afirme na condição de titular do direito subjetivo lesado ou ameaçado de lesão e, por sua vez, legitimado passivo aquele que se encontre no polo oposto da relação jurídica obrigacional, ou seja, aquele que se encontre na condição de causador da lesão ou da ameaça de lesão. Excepcionalmente, havendo expressa previsão legal, admite-se que a tutela de direitos individuais seja pleiteada por um terceiro, que não o próprio titular, como prevê o art. 6.º do Código de Processo Civil1. Vê-se que esse conceito processual guarda íntima correlação com a Teoria dos Direitos Subjetivos, conforme já abordado linhas acima.

No Processo Civil coletivo, por outro lado, não se pode empregar a mesma metodologia de determinação da legitimidade ad causam, justamente em razão da insuscetibilidade dessa ordem de conflitos de interesses à clássica Teoria dos Direitos Subjetivos. Como já visto, os interesses jurídicos em disputa no Processo Civil coletivo apresentam-se marcados pela indivisibilidade do objeto e pela indeterminabilidade dos sujeitos, o que inviabiliza a determinação de um único titular da pretensão a ser deduzida para que, assim desejando, exerça seu direito de ação.

Nesse sentido, Edward Carlyle Silva ressalta que no tocante às demandas coletivas, justamente em razão da titularidade indeterminada dos interesses jurídicos em disputa, a determinação da legitimidade ad causam ganha sobremaneira importância.

No âmbito das ações coletivas, a legitimação adquire outro significado, na medida em que não se pode adotar como premissa para a legitimidade, a simples auto-afirmação da titularidade do direito violado. Este direito, por ser coletivo, possui um número indeterminado de pessoas como titulares, podendo todos eles, a princípio, pretender exercer a defesa daquele direito. A questão consiste em determinar quem será o responsável pela defesa de tais espécies de interesses.2

Com efeito, em sede de tutela jurisdicional coletiva, há que se considerar que ao menos um dos polos da relação jurídica processual será ocupado por uma coletividade, não considerada como uma mera aglutinação de sujeitos individuais, mas considerada ela própria um sujeito (coletivo) de interesses jurídicos. Daí a necessidade de que seja representada no processo ou, melhor dizendo, que seja adequadamente representada no processo.

O qualificativo “adequado” também decorre da natureza do interesse jurídico em disputa, indivisível quanto ao objeto e indeterminado quanto ao sujeito. Isso porque, em razão dessa característica, faz-se necessário que o sistema de determinação da legitimidade ad causam apresente-se necessariamente marcado pela concorrência, ou seja, que a legitimidade seja conferida a mais de um ator processual ao mesmo tempo. Não fosse assim, estaríamos a admitir que apenas um sujeito deteria a legitimidade ad causam sendo, portanto, o titular do interesse em disputa.

Daí porque o qualificativo não recai sobre o ator processual, mas sobre a qualidade de sua atuação no processo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT