A regra-matriz

AutorAurora Tomazini de Carvalho
Páginas427-476
389
Capítulo X
A REGRA-MATRIZ
SUMÁRIO: 1. Que é regra-matriz?; 1.1. Normas de incidência e
normas produzidas como resultado da incidência; 1.2. A regra-ma-
triz de incidência; 1.3. Ambiguidade da expressão “regra-matriz
de incidência”; 2. Critérios da hipótese; 2.1. Critério material; 2.2.
Critério espacial; 2.3. Critério temporal; 3. Critérios do consequen-
te; 3.1. Critério pessoal – sujeitos ativo e passivo; 3.2. Critério pres-
tacional; 4. Função operativa do esquema lógico da regra-matriz;
4.1. Teoria na prática.
1. QUE É REGRA-MATRIZ?
PAULO DE BARROS CARVALHO, inspirado nas lições
de ALFREDO AUGUSTO BECKER e GERALDO ATALIBA,
ao observar as propriedades eleitas pelo legislador para deli-
mitação de hipóteses e consequentes das regras instituidoras
de tributos, percebeu a repetição de alguns componentes e
assim apresentou a regra-matriz de incidência tributária319,
319. PAULO DE BARROS CARVALHO, apresentou inicialmente componentes da
norma jurídica tributária, na sua tese de doutoramento, editada no livro intitulado
Teoria da norma tributária, (p. 122-178), numa singela demonstração daquilo que
mais tarde denominaria de regra-matriz de incidência tributária. Com a edição do
livro Curso de direito tributário, as ideias apareceram mais segmentadas, o nome
regra-matriz de incidência tributária foi consolidado como sinônimo de norma
390
AURORA TOMAZINI DE CARVALHO
estabelecendo um esquema lógico-semântico, revelador do
conteúdo normativo, que pode ser utilizado na construção de
qualquer norma jurídica (em sentido estrito).
O legislador, ao escolher os acontecimentos que lhe inte-
ressam como causa para o desencadeamento de efeitos jurí-
dicos e as relações que se estabelecerão juridicamente como
tais efeitos, seleciona propriedades do fato e da relação, cons-
tituindo conceitos, por nós denominado de “hipótese” e “con-
sequente”. Todo conceito é seletor de propriedades, isto quer
dizer que, nenhum enunciado capta o objeto referente na in-
finita riqueza de seus predicados, captura apenas algumas de
suas propriedades, aquelas eleitas pelo observador como rele-
vantes para identificá-lo.
Examinando várias normas, em busca da construção
de proposições descritivas generalizadoras, verifica-se uma
constante: que o legislador, na sua atividade de selecionar
propriedades dos fatos e das relações jurídicas, acaba utili-
zando-se sempre dos mesmos critérios, percebidos quando,
por meio da abstração lógica, separamos as expressões gené-
ricas designativas do fato e da relação presentes em todas e
quaisquer normas jurídicas320.
tributária em sentido estrito e um esquema formal foi desenhado (p. 236-238). Tal
construção passou a ser utilizada em mais de centenas de obras especializadas, re-
presentando um verdadeiro marco na Teoria Geral do Direito Tributário.
320. Muitos autores utilizam-se deste recurso para estudar detalhadamente o con-
teúdo normativo. Os penalistas, por exemplo, ao realizarem investigações sobre os
elementos do tipo, nada mais fazem do que decompor a hipótese penal, a fim de
analisar de modo particular cada um de seus componentes. Os elementos do tipo
são, para nós, os componentes da hipótese penal que, em termos gerais, apresenta a
mesma composição sintática. Depois do avanço dos penalistas no estudo do tipo
penal, com emprego do método analítico, os tributaristas aderiram à forma e impe-
liram um grande avanço no estudo dos componentes da hipótese tributária. Estes
estudos, no entanto, dirigiram-se apenas a uma das proposições normativas: o ante-
cedente (vide: ALFREDO AUGUSTO BECKER, “Teoria geral do direito tributário
e GERALDO ATALIBA, “Hipótese de incidência tributária”). Foi PAULO DE BAR-
ROS CARVALHO que, atendendo à estrutura dual da norma jurídica, aplicou o mé-
todo decompositivo para o estudo, também, dos componentes do consequente. E,
assim criou o esquema lógico-semântico da regra-matriz, com o qual identificamos
todos os componentes significativos de qualquer norma jurídica.
391
CURSO DE TEORIA GERAL DO DIREITO
Se considerarmos que toda classe delineada pela hipótese
normativa aponta para um acontecimento, que se caracteriza
por ser um ponto no espaço e no tempo. Logo, como conceito
identificativo, ela deve, necessariamente, fazer referência a:
(i) propriedades da ação nuclear deste acontecimento; (ii) do
local; e (iii) do momento em que ele ocorre; caso contrário, é
impossível identificá-lo precisamente.
Da mesma forma, como toda classe delineada pelo con-
sequente normativo indica uma relação onde um sujeito fica
obrigado, proibido ou permitido a fazer ou deixar de fazer
algo em virtude de outro sujeito, necessariamente nele vamos
encontrar propriedades identificativas de: (i) dois sujeitos, ati-
vo e passivo; e (ii) do objeto da relação, isto é, daquilo que um
dos sujeitos está obrigado, proibido ou permitido de fazer ou
deixar de fazer ao outro.
A conjunção desses dados indicativos oferece-nos a pos-
sibilidade de exibir um esquema padrão, já que toda constru-
ção normativa, para ter sentido, pressupõe, como conteúdo
mínimo, estes elementos significativos.
1.1 Normas de incidência e normas produzidas como
resultado da incidência
Algumas normas são produzidas para incidir, outras nas-
cem como resultado da incidência. Nas normas produzidas
para incidir (do tipo gerais e abstratas), a classe dos fatos (de-
limitada pela hipótese) e das relações (delimitada pelo con-
sequente), compreendem inúmeros elementos, tanto quanto
forem os acontecimentos concretos que nela se enquadrem,
quanto às relações a se instaurarem juridicamente. Nas
normas produzidas como resultado da incidência de outras
normas (do tipo individuais e concretas), as classes do an-
tecedente e do consequente abarcam um único elemento, o
fato jurídico e a relação jurídica objetivados. Estas últimas
normas geralmente são produzidas com a incidência das pri-
meiras no caso concreto e, por isso, nelas se fundamentam

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT