Psiche e Techne - O ser humano na Idade da Técnica

AutorSelvino Assmann
CargoDoutor em Filosofia pela Università Lateranense, PUL, Itália
Páginas13-30
R E V I S T A I N T E R N A C I O N A L I N T E R D I S C I P L I N A R I N T E R T H E S I S - PPGICH UFSC
SEÇÃO : TRADUÇÕES
LIVRO:
GALIMBERTI, Umberto. (2003) Psiche e techne. L’uomo nell’età della tecnica. 2.ed.
Roma, Feltrinelli. pp. 33-48
Tradução Portuguesa de: SELVINO J. ASSMANN
Psiche e Techne
O ser humano na idade da técnica
Folha de rosto:
Este livro pretende mostrar a transformação que o homem sofre na idade da
técnica. Continuamos pensando a técnica como instrumento à nossa disposição,
enquanto a técnica se tornou o ambiente que nos envolve e nos constitui segundo as
regras de racionalidade que, baseando-se apenas em critérios de funcionalidade e de
eficiência, não hesitam em subordinar as exigências do homem às exigências do aparato
técnico. Inconscientes, movemo-nos ainda com os traços típicos do homem pré-
tecnológico que agia tendo em vista fins inscritos num horizonte de sentido, com uma
bagagem de idéias e uma coletânea de sentimentos em que se reconhecia. Mas a técnica
não tende a um fim, não promove um sentido, não inaugura cenários de salvação, não
redime, não desvela verdade: a técnica funciona. E dado que seu funcionamento se torna
planetário, este livro propõe-se rever os conceitos de indivíduo, liberdade, salvação,
verdade, sentido, fim, mas também de natureza, ética, política, religião, história, de que se
nutria a idade humanista e que agora, na idade da técnica, deverão ser repensados,
abandonados ou refundados na sua raiz.
Para esta refundação, urge abandonar as psicologias do sujeito; e neste caso se
trata de todas as psicologias, construídas sobre alguma base “humanista” que prevê o
homem como sujeito, para fundar uma nova psicologia, aqui denominada psicologia da
ação, capaz de reconhecer na técnica a essência do homem e de encontrar, na sua atual
extensão, que hoje aparece sem limites, aqueles instrumentos psíquicos que, se ainda
consentem ao homem dominar a técnica, possam pelo menos evitar que a técnica, de
condição essencial da existência humana, se transforme em causa da insignificância do
seu próprio existir.
De fato, a técnica pode significar o ponto absolutamente novo, e talvez irreversível,
na história, na qual a pergunta não é mais “o que podemos fazer com a técnica”, mas sim
“o que a técnica pode fazer conosco”.
2
INTRODUÇÃO
O que realmente inquieta não é o fato de o mundo se
transformar num domínio completo da técnica. Mais
inquietador, sem dúvida, é que o ser humano não está
preparado para esta radical mudança do mundo.
Mais inquietador é que ainda não estamos capacitados
para, através de um pensamento meditativo, nos
confrontarmos adequadamente com o que de fato
está emergindo na nossa época.
(HEIDEGGER, L’abbandono – 1959 – p. 36)
1. O homem e a técnica
Todos estamos convencidos de que habitamos a idade da técnica, de cujos
benefícios usufruímos em termos de bens e espaços de liberdade. Somos mais livres do
que os homens primitivos porque temos mais campos de jogo em que nos podemos
inserir. Qualquer lamentação, qualquer desafeto pelo nosso tempo tem algo de patético.
Mas com a criação do hábito de usarmos instrumentos e serviços que diminuem o
espaço, aceleram o tempo, suavizam a dor, diluem as normas sobre as quais foram
esculpidas todas as morais, corremos o risco de não nos perguntar se o nosso modo de
ser homens não é antigo demais para habitar a idade da técnica, que não fomos nós,
mas a abstração da nossa mente que criou, obrigando-nos, com uma obrigação mais forte
do que aquela sancionada por todas as morais que foram escritas na história, a nela
entrar e nela tomar parte.
Nesta inserção rápida e inelutável, trazemos ainda em nós os traços do homem
pré-tecnológico, que agia tendo em vista fins inscritos num horizonte de sentido, com uma
bagagem de idéias próprias e um enxoval de sentimentos em que se reconhecia. A idade
da técnica aboliu este cenário “humanista”, e as perguntas de sentido que surgem ficam
sem resposta, não porque a técnica não esteja ainda suficientemente aperfeiçoada, mas
porque não cabe no seu programa encontrar respostas para semelhantes perguntas.
A técnica, de fato, não tende a um fim, não promove um sentido, não inaugura
cenários de salvação, não redime, não desvela a verdade: a técnica funciona, e dado que
o seu funcionamento se torna planetário, este livro propõe-se rever os conceitos de
indivíduo, identidade, liberdade, salvação, verdade, sentido, fim, mas também os de
natureza, ética, política, religião, história, de que se nutria a idade pré-tecnológica e que
agora, na idade da técnica, deverão ser reconsiderados, abandonados ou refundados na
sua raiz.

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