Procedimento Executivo

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Ocupação do AutorAdvogado. Juiz aposentado do TRT da 9.ª Região
Páginas72-79

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1. Considerações introdutórias

Durante largo período, legislação e doutrina não conseguiram libertar-se da confusão, por elas próprias estabelecida, entre os conceitos de processo e de procedimento (v. Capítulo XXVII, adiante), não sendo infrequentes, mesmo nos dias de hoje, os casos em que se constata a ocorrência de equívocos desta natureza. Pereira e Souza, e. g., conceituava o processo como “a forma estabelecida pelas leis e praxe para se tratarem as causas em juízo”, demonstrando não haver captado a exata distinção entre processo e procedimento, pois o seu conceito, na verdade, está muito mais próximo deste último.

Com o advento da notável obra de Büllow (Teoria das exceções dilatórias e dos pressupostos processuais), em 1868, contudo, passou-se a perceber que o processo é constituído, organicamente, por um encadeamento de atos sequentes e preordenados, que tendem a preparar o provimento final e por intermédio dos quais o procedimento se manifesta. A partir daí começaram a ser bosquejados os traços distintivos dessas figuras, traços que, mais tarde, viriam a ser nitidamente assinalados pela opinião doutrinária, que os tornou firmes e definitivos. Um dos juristas que se empenharam em demonstrar a dessemelhança do processo em relação ao procedimento foi João Mendes Júnior, para quem o primeiro era “o movimento dos atos da ação judiciária, ou melhor, o movimento dos atos da ação em Juízo” (Apud MARQUES, José Frederico, obra cit., p. 117), apresentando-se o segundo como o modo e a forma pelos quais o ato se movimenta (ibidem).

Correta, por isso, a afirmação doutrinária assente, no sentido de ser o procedimento a “veste formal do processo”, a sua manifestação extrínseca; nessa ordem de ideias, o procedimento pode ser visto como o envoltório, do qual o processo é a sua íntima substância, de acordo com a feliz metáfora atribuída a Büllow.

Originário do latim processus, o vocábulo processo designa seguimento, marcha avante; vem daí a nossa particular discordância de Jayme Guasp quando assevera que “no es cierto, como algunos pretenden, que en la idea de proceso esté implícita la idea de avance”, porquanto entendemos ser inseparável do conceito de processo judicial o senso de movimento para a frente, de dinamismo. À ideia de processus, portanto, contrapõe-se a de retrocessus, que indica um retorno a ponto anterior, uma involução, enfim; por esse motivo, as normas processuais conceberam a figura da preclusão como medida tendente a impedir esse retrocesso, essa volta a fases ultrapassadas do procedimento, que se traduz num empecilho ao objetivo de celeridade do processus.procedimento, oriundo do latim procedere, indica o conjunto de atos sucessivos, legalmente ordenados em formas e ritos,

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e em regra preclusivos, por meio dos quais o processo, que é abstrato, imaterial, se revela ao mundo sensível.

Demais, podemos dizer — sem embargo de melhor juízo — que, enquanto o processo possui índole acentuadamente finalística, na medida em que, como sabemos, traduz o instrumento específico de que se utiliza o Estado para exercer a sua função (poder-dever) jurisdicional, o procedimento, por seu turno, é dotado de feição preponderantemente formal e ritual, estabelecendo o modus faciendi pelo qual o processo deverá atingir a sua finalidade, como instrumento de solução dos conflitos de interesses.

A propósito, tradicionalmente, a doutrina classifica o processo em: a) de conhecimento; b) de execução; e c) cautelar. Essa classificação foi observada pelo CPC de 1973, mas alterada pelo CPC de 2015, conforme veremos mais adiante. O procedimento, por seu turno, bifurca-se em: a) comum; b) especial. Aquele se subdivide em: a.a) ordinário; a.b) sumariíssimo (processo do trabalho) ou sumário.

Acrescentemos que, no processo, a jurisdição está sempre presente, o que nem sempre se dá com o procedimento, que pode limitar-se a “coordenar atos que se sucedem, para a atuação de outro órgão, como, verbi gratia, uma autoridade administrativa” (MARQUES, José Frederico. Manual. São Paulo: Saraiva, 1974. 1.º vol., p. 9). É necessário destacar que a jurisdicionalidade constitui elemento característico do processo, motivo por que se pode dizer que este é a própria jurisdição sendo posta em exercício. Nos casos de administração pública de interesses privados (“jurisdição voluntária”, sic), por exemplo, inexiste processo, conforme pudemos esclarecer, pois o que aí se tem é mero procedimento.

A despeito de consagradas, as locuções “processo administrativo”, “processo legislativo”, “processo esportivo”, etc. encerram visível impropriedade científica, pois nesses casos não há o menor conteúdo de atividade jurisdicional — e sim administrativa ou legislativa: a concessão que nesse campo se pode fazer é quanto ao uso do termo processo com significado vulgar, indicativo do método de elaboração de alguma coisa.

A CLT não emprega, nem uma vez sequer, o vocábulo procedimento; o CPC de 1973, cientificamente mais bem elaborado do que o texto trabalhista e do que o próprio diploma processual civil de 1939, dedicou o Cap. I, Tít. VII, Livro I, ao binômio processo-procedimento, dispondo sobre o primeiro no art. 270 e sobre o segundo nos arts. 271 e 272; de modo geral, os Títulos VII e VIII do CPC versam sobre os procedimentos sumário e ordinário. O CPC de 2015 trata do processo de execução no Livro II, da Parte Especial (arts. 771 a 924). O art. 318 declara que o procedimento comum será aplicado a todas as causas, salvo disposição em contrário estabelecida no próprio CPC ou em lei avulsa. O parágrafo único dessa norma legal esclarece que o procedimento comum é aplicável, em caráter subsidiário, aos demias procedimentos especiais e ao processo de execução.

Os autos (do grego autos = próprio, por si mesmo), por sua vez, constituem a materialidade das peças e documentos em que se corporificam os atos do procedimento; sendo assim, extinto o processo, o que ocorre é o arquivamento dos autos e não do processo — como tem sido comum ouvir. Aliás, ninguém consegue, em rigor, fazer, por exemplo, carga do processo, senão dos autos do processo. Observemos, en passant, que o processo do...

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