Primeiro esboço de fundamentação do direito

AutorLuiz Moreira
Páginas67-97
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CAPÍTULO II
PRIMEIRO ESBOÇO DE
FUNDAMENTAÇÃO DO DIREITO
2.1. O CARÁTER RACIONAL DA DOMINAÇÃO
LEGAL: A LEGITIMIDADE ORIUNDA DA
LEGALIDADE
Em que sentido podemos considerar que a legalidade extrai sua
legitimidade de uma racionalidade que, através do procedimento, intro-
duz a moralidade em seu bojo? Em que sentido o sistema jurídico, por
meio da ideia do Estado de Direito, pode suportar as mais diversas exi-
gências para que se chegue a uma integração social? Habermas debru-
çou-se sobre essas questões em 1986, em duas aulas apresentadas sob o
título Direito e Moral99, as Tanner Lectures, ministradas na Universidade
de Harvard. Elas representam uma primeira tentativa de elaborar satis-
fatoriamente um conceito de Direito, através do agir comunicativo, que
possa enfrentar a exigência moderna de fundamentação e validade do
ordenamento jurídico.
99 HABERMAS, Jürgen. “Estudos Preliminares e Complementos: I. Direito e Moral”.
Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Tomo II. Rio de Janeiro: Tempo
Brasileiro, 1997, pp. 193-247.
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LUIZ MOREIRA
Habermas analisa100 a concepção weberiana segundo a qual o
Direito dispõe de uma racionalidade autônoma em relação à Moral. É
através da utilização dessa racionalidade que vai ser possível a Weber
articular uma concepção de legalidade que se legitima a partir de si
mesma. Isso porque, segundo a interpretação dada por Habermas, em
sociedades modernas, as ordens estatais depreendem-se da dominação
exercida pelo ordenamento jurídico. Um ordenamento jurídico que tem
a pretensão de ser racional na medida em que essa racionalidade emana
de qualidades formais próprias. Fiel a essa concepção, segundo Habermas,
Direito para Weber é toda a emanação que parte do poder legislativo,
desde que sejam satisfeitas as condições processuais inerentes ao
procedimento legislativo. Desse modo, Weber interpreta o atrelamento
do Direito à Moral como uma possibilidade de perda de sua racionalidade
e, por conseguinte, como ameaça ao fundamento que legitima101 a
dominação exercida conforme a norma jurídica. Mas, em que sentido
o conceito weberiano de racionalidade do Direito nos pode oferecer
uma resposta plausível para a relação entre a moralidade e a juridicidade?
2.1.1 A crítica ao conceito weberiano de racionalidade
jurídica
Nos processos de juridicização, ocorridos durante a passagem para
o Estado Social, houve, não somente, uma aumento considerável do
ordenamento jurídico, mas, também, um deslocamento da estrutura e
das funções desse ordenamento. Esse processo é fruto das exigências de
se vincular as prescrições jurídicas às prescrições morais. Essas exigências,
frutos da política de um Estado interventor, proporcionam uma utilização
do medium jurídico de modo que esse se converta em instrumento de
justiça social. Essa aplicação do aparato jurídico por parte do legislador
equivale à materialização do Direito formal burguês.102 A presença de
100 HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Tomo II.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, p. 193.
101 HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Tomo II.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, pp. 193/194.
102 HABERMAS, Jürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. Tomo II.
Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997, pp. 194/195.

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