Preconceito e tolerância: reflexões acerca das cotas raciais nas universidades

AutorAlessandra Barichello Boskovic - Katya Kozicki
CargoGraduada em Direito pelo Centro Universitário Curitiba (2007) - Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná (1986) e em Ciências Econômicas pela Faculdade Católica de Administração e Economia (1988)
Páginas10-31
Direito, Estado e Sociedade n.46 p. 10 a 31 jul/dez 2015
1. Introdução
O que é racismo? Mais de um século após a abolição da escravatura no
Brasil, é ainda necessário implementar medidas para combater a discrimi-
nação racial? As políticas criadas com este f‌im não acabam por aumentar
a tensão racial já existente? Por que, dentre tantas possíveis ações af‌irmati-
vas, a escolha de cotas raciais para ingresso nas universidades?
* Graduada em Direito pelo Centro Universitário Curitiba (2007), Especialista em Direito do Trabalho pelo
Centro Universitário Curitiba (2009), Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná
(2011) e Doutoranda em Direito pela mesma instituição. Visiting research scholar, Fordham University
School of Law, Nova York (2015-2016). Professora do curso de Direito da Universidade Positivo. E-mail:
alessandra.boskovic@gmail.com
** Graduada em Direito pela Universidade Federal do Paraná (1986) e em Ciências Econômicas pela Facul-
dade Católica de Administração e Economia (1988). Mestre em Filosof‌ia e Teoria do Direito pela Universi-
dade Federal de Santa Catarina (1993) e doutora em Direito, Política e Sociedade pela Universidade Federal
de Santa Catarina (2000). Visiting Researcher Associate no Centre for the Study of Democracy, University
of Westminster, Londres (1998-1999). Visiting research scholar, Benjamin N. Cardozo School of Law, Nova
York (2012-2013). Atualmente é professora titular da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e profes-
sora associada da Universidade Federal do Paraná, programas de graduação e pós-graduação em Direito.
Bolsista de Produtividade em pesquisa do CNPq. E-mail: kkozicki@uol.com.br.
Preconceito e Tolerância: Reexões Acerca
das Cotas Raciais nas Universidades
Prejudice and Tolerance: Reections About Racial Quotas
in Universities
Alessandra Barichello Boskovic*
Universidade Positivo, Curitiba-PR, Brasil
Katya Kozicki**
Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba-PR, Brasil e
Universidade Federal do Paraná, Curitiba-PR, Brasil
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Direito, Estado e Sociedade n. 47 jul/dez 2015
Preconceito e Tolerância:
Reexões Acerca das Cotas Raciais nas Universidades
O presente ensaio examinará alguns dos principais argumentos jurí-
dico-f‌ilosóf‌icos presentes na discussão sobre as ações af‌irmativas raciais
para ingresso de estudantes em universidades. A problematização que se
pretende enfrentar pode ser resumida no seguinte questionamento: o cri-
tério racial como def‌inidor de ações af‌irmativas (cotas nas universidades) é
válido em uma sociedade como a brasileira?
Para embasamento deste trabalho adotaram-se como marcos teóricos
os pensamentos de Norberto Bobbio, Michael Walzer e Robert Wolff. Na
primeira seção, examinar-se-ão as características do preconceito e da dis-
criminação segundo o pensamento de Norberto Bobbio; na segunda seção
desenvolver-se-á a ideia de tolerância, com base na doutrina de Michael
Walzer e Robert Wolff; a partir disso, na terceira seção, ref‌letir-se-á acerca
dos argumentos centrais ao debate sobre a adoção de cotas raciais nas uni-
versidades brasileiras.
2. Preconceito e discriminação
A ref‌lexão sobre os argumentos favoráveis e contrários à adoção do critério
racial para ações af‌irmativas – especif‌icamente as cotas para ingresso em
universidades, tema deste estudo – pressupõe inicialmente a ponderação
acerca de um fator que antecede o debate central: o preconceito.
Esta primeira seção apresentará os elementos ref‌lexivos necessários à
efetiva compreensão do atual contexto social em que se insere grande par-
cela da população negra. Não se pretende, evidentemente, oferecer um
ensaio extensivo que esgote todas as possíveis motivações – históricas, so-
ciais ou até mesmo psicológicas – do preconceito e da discriminação, mas
busca-se tão somente traçar o referencial básico que alicerçará a construção
mental desenvolvida ao longo deste texto.
Segundo Renato Mezan, a psicanálise compreende o preconceito como
um conjunto de crenças, atitudes e comportamentos que atribui uma ca-
racterística negativa a um determinado grupo humano: “a característica em
questão é vista como essencial, def‌inidora da natureza do grupo, e portan-
to adere indelevelmente a todos os indivíduos que o compõem”1.
No âmbito jurídico, Norberto Bobbio conceitua o preconceito como
“uma opinião ou conjunto de opiniões, às vezes até mesmo uma doutrina
1 MEZAN, 1998, p. 226.
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