Portuguese and Brazilian Social Work in dialogue: internationalization of professional training/Servico Social portugues e brasileiro em dialogo: internacionalizacao da formacao profissional.

AutorMartins, Alcina Maria de Castro

Introducao

A internacionalizacao do ensino superior, nos ultimos anos, movimenta a vida universitaria: sao alunos de diferentes nacionalidades e continentes a transitar pelos campi; sao docentes a desenvolverem atividades de pesquisa, docencia, visitas tecnicas no estrangeiro; sao eventos academico-cientificos nacionais com abrangencia internacional, possibilitando maior circulacao das producoes cientificas, gerando oportunidades de construcao de redes de investigacao, estudos, assinaturas de convenios e protocolos internacionais. Essas experiencias trazem ares de novidade, como se so agora o ensino superior experimentasse as relacoes internacionais.

Refletir sobre um dialogo entre o Servico Social portugues e brasileiro na ambiencia da internacionalizacao do ensino superior requer, inicialmente, problematizarmos alguns elementos que identificamos na tematica sobre internacionalizacao no atual contexto da crise do capital. Este termo e sua realidade, no ensino superior, segundo De Wit (2013), sao relativamente novos, datam dos ultimos vinte e cinco anos. Neste periodo, observa-se a transicao do uso da expressao "educacao internacional" para "internacionalizacao da educacao superior'. A anterior educacao internacional, presente ate aos anos noventa do seculo XX, vinculava-se as atividades como o estudo no exterior, orientacao de estudantes estrangeiros, intercambio de estudantes e funcionarios entre universidades, ensino voltado para o desenvolvimento e estudo de areas especificas, as quais, ainda de acordo com De Wit (2011), pouco se relacionavam entre si, alem dessas atividades se realizarem por um reduzido e elitizado numero de estudantes.

A recente internacionalizacao na educacao superior, na Europa e fora dela, tornou-se central na agenda das organizacoes internacionais, governos nacionais, universidades e suas organizacoes representativas, agencias de fomento a pesquisa, organizacoes estudantis e agencias de acreditacao. (BRANDENBURG; DE WIT, 2011).

Hoje, as universidades se movimentam para firmar protocolos com outras universidades estrangeiras, com a finalidade do desenvolvimento de pesquisas, estudos conjuntos, na perspectiva de producao de conhecimento, articulando esforcos na criacao de novos saberes, mais atentos com as exigencias do mercado e menos com uma formacao profissional para alem do mercado. Observa-se tambem "no Brasil a chegada de escritorios de representacao de renomadas universidades estrangeiras, que veem em nosso pais nao apenas um nicho importante de demanda por ensino superior, mas tambem de oportunidades para novos negocios" (1). (RAMOS, 2013, s.p.). Outra tendencia observada nesta corrida e a preocupacao com a quantidade de protocolos assinados e as insignias universitarias vin culadas como transmissoras de prestigio, reconhecimento e excelencia na qualidade do ensino superior.

A inegavel presenca e importancia dada a internacionalizacao na area da educacao superior, nao raras vezes, toma-a como reflexo da globalizacao, vinculada aos avancos da tecnologia de informacao e comunicacao que criaram um ambiente virtual de contato instantaneo e comunicacao cientifica sob o dominio do idioma ingles, considerando-a um fato natural da contemporaneidade. Ou ainda, encontramos visoes que, ao antagoniza-la com a globalizacao na educacao superior, relacionam a internacionalizacao com a cooperacao entre instituicoes de formacao e investigacao, com mobilidade internacional, ancorada em valores de qualidade e excelencia; e a globalizacao ligada ao mundo da competicao que, ao se relacionar com a educacao superior, transformam-na numa mercadoria negociavel, afastando-a do ideario humanista de educacao.

No Brasil, encontramos estudos em Morosini (2006), Catani e Azevedo (2013). Na Europa e America do Norte este debate e mais recorrente. Autores como Teichler (2004), Scott (2005), Altbach (2006), Brandenburg e De Wit (2011) tem estudado a tematica e a complexa relacao entre a globalizacao e a internacionalizacao do ensino superior, mas nao sem polemicas.

Brandenburg e De Wit (2011) comentam que, com esta distincao maniqueista (internacionalizacao considerada como boa e a globalizacao como ruim), negligencia-se o fato de que as atividades que estao mais relacionadas com o conceito de globalizacao (ensino superior como uma mercadoria negociavel) estao sendo cada vez mais executados sob a bandeira da internacionalizacao.

Nao faltam exemplos sobre a expansao do negocio da educacao superior. No Brasil, a compra de faculdades e universidades por grupos estrangeiros e uma realidade que registra a uniao, em 2013, da Kroton e Anhaguera como o maior negocio realizado na area da educacao no mundo. Lideres em tamanho no pais, e ambas controladas por fundos de investimentos, formam agora um conglomerado com quase 1 milhao de alunos, uma receita de R$ 4,3 bilhoes e com atuacao em 835 cidades brasileiras. Segundo Ramos (2013) isto representa algo em torno de 15% de todos os alunos do Brasil.

A multiplicidade de entendimentos sobre a denominada internacionalizacao (2) do ensino superior tem desenhado praticas tao diversas quanto controversas, para um fenomeno que tem implicacoes na formacao profissional. A titulo de exemplo, na Universidade de Granada, na regiao da Andaluzia na Espanha, a internacionalizacao se configura tambem com experiencias (desenvolvidas pelo Servico Social e a Psicologia) entre idosos em situacao de solidao e alunos de mobilidade internacional e nacional, tais como: alojamento de estudantes estrangeiros em residencias de idosos; adocoes intergeracionais e internacionais; construcao de Jardim Intergeracional Universitario; intercambio de materiais docentes entre diferentes Universidades de Mayorese utilizacao de novas tecnologias para a docencia internacional; e o voluntariado de estudantes internacionais com pessoas idosas. (CASADO; NIETO, 2014, p. 1642-1643).

Dependendo da perspectiva de analise referenciada acerca da internacionalizacao, muitas sao as direcoes e intencoes assumidas. Tratandose aqui do Servico Social, nao e somenos importante lembrarmos o processo de expansao da profissao, tanto na Europa quanto na America Latina, e o papel da Uniao Catolica Internacional de Servico Social (UCISS), nas primeiras decadas do seculo XX. Enquanto um braco social da Igreja Catolica, em tempos de neocristandade, a UCISS espraiou a profissao dentro dos principios da Doutrina Social da Igreja, em muitos paises de diferentes latitudes, o que nos coloca diante de uma internacionalizacao da profissao. Recordemos ainda, a reconceitualizacao do Servico Social, considerada em Netto (1990, p. 146)

parte integrante do processo de erosao do Servico Social 'tradicional', [...] intimamente vinculada ao circuito sociopolitico latino-americano da decada de sessenta: a questao que originalmente a comanda e a funcionalidade profissional na superacao do subdesenvolvimento [...]. E este movimento, localizavel praticamente em todos os paises ao sul do Rio Grande, que permite uma especie de grande uniao profissional que abre a via a uma renovacao do Servico Social. Nos limites da nossa reflexao, identificamos relacoes internacionais nos exemplos destacados acima, ainda que outros possam ser recuperados. No primeiro, uma relacao internacional/internacionalizacao com a formacao profissional sintonizada com a recuperacao do lugar e papel da ideologia catolica, articulada com o desenvolvimento do capitalismo, e a profissao que se desejava difundir, integravam-se na e para a manutencao do projeto da sociedade burguesa. No segundo, como afirma Netto (1990, p. 147), "num prazo muito curto--cerca de um lustro -, porem, aquela grande uniao objetivamente se esfarinha", a profissao buscou no Cone Sul adequar-se as demandas de mudancas sociais, com impactos distintos nos diferentes paises, como no caso brasileiro o seu processo de renovacao profissional.

Nesse sentido, a internacionalizacao do ensino superior em Portugal, com a mobilidade de professores e alunos, com os acordos e protocolos assinados entre instituicoes de ensino superior estrangeiras, e aqui refletida num quadro complexo que articula dois fenomenos distintos, mas autoimplicados--o desmantelamento do Estado Social e o Processo de Bolonha--, no contexto da crise do capital.

O presente estudo tem um carater aproximativo ao dialogo estabelecido entre o Servico Social portugues e brasileiro, a partir dos anos 1960 (3). Busca, atraves de estudo bibliografico e analise documental, identificar o processo de qualificacao profissional e a formacao de quadros docentes e investigadores em Servico Social no contexto das transformacoes da educacao e da internacionalizacao do ensino superior. Ele esta organizado em duas partes: inicialmente, buscou-se recuperar o atual contexto em que a internacionalizacao da educacao superior tornou-se imperativa as instituicoes de ensino superior; a segunda parte, de cariz socio-historico, procurou recuperar as relacoes internacionais estabelecidas entre Portugal e Brasil, no ambito da formacao e qualificacao em Servico Social.

  1. Crise do capital: a ordem e mercantilizar todas as esferas da vida social

    A atual crise do capital, que tem como marco os anos de 1970, com o esgotamento dos trinta anos gloriosos, trouxe uma crise de superproducao e subconsumo. Acresce a este contexto a crise do petroleo em 1973 e 1979, com queda vertiginosa do dolar americano, taxas de desemprego a subirem, intensificando xenofobias ante a presenca de imigrantes na Europa em um cenario de protestos que se alastraram pelo mundo.

    O capital, em resposta aquela crise, edifica estrategias para a manutencao da taxa de lucro. A reestruturacao produtiva, a globalizacao e a ideologia neoliberal formam um conjunto articulado, o que indica--segundo as analises de Behring (1998) -, que a partir da decada de 1970, o capital--em sua incessante busca de superlucros--passa por um processo de supercapitalizacao e necessita, para o seu processo de reproducao...

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