Pastoral popular e assalariados rurais

AutorClaudio Perani
Páginas69-81
PASTORAL POPULAR E ASSALARIADOS RURAIS
Claudio Perani
(Publicado nos Cadernos do CEAS n.º 89, jan.-fev. 1984, p. 24-36)
1. INTRODUÇÃO
O homem rural não pode ser esquecido! Parece uma afirmação supérflua ou contrária
â realidade dos fatos, sobretudo quando colocada dentro do âmbito do trabalho
desenvolvido pela igreja que - como todos sabem - tem uma presença marcante no
campo. Reconhecemos o grande número de pequenas comunidades eclesiais que se
desenvolveram no interior do Brasil e a importância da solidariedade e das denúncias da
igreja particularmente no que se refere aos conflitos de terra, conjunturalmente muito
importantes; contudo, diante da variedade e complexidade da situação rural e,
sobretudo, diante do contínuo aumento da massa de trabalhadores rurais assalariados, a
afirmação inicial de alerta pode ter um sentido.
Neste ano de 1983 tivemos ocasião de participar de 2 importantes encontros nacionais
da pastoral popular, o encontro das Comunidades Eclesiais de Base, em Canindé, e a
assembléia da Comissão Pastoral da Terra, em Goiânia. Em ambos os encontros
apareceu violentamente a questão da terra. O problema dos assalariados rurais foi
levantado, teve um certo tratamento, sobretudo na reunião da CPT, mas não foi possível
aprofundá-lo e ampliá-lo. Tal dificuldade existe também nas bases onde se percebe a
existência de bóias-frias, diaristas, peões, volantes, braçais..., sem saber como
aproximá-los e como poder estar a serviço da luta dessas categorias.
Reconhecemos a importância fundamental das lutas pela terra, as muitas vitórias dos
posseiros e o processo de recamponesação em andamento em muitas áreas. Queremos
considerar a problemática de uma outra faixa de trabalhadores rurais, os assalariados,
cujas lutas são importantes também para a luta dos próprios posseiros. O vasto mundo
dos assalariados rurais desafia a pastoral popular e a igreja como um todo. Ficando
nesse âmbito eclesial, desejamos levantar a questão e tentar algumas interpretações
iniciais, cientes dos limites das afirmações, pois a pastoral popular não oferece nesse
setor uma grande experiência. Além do mais, pretendemos ficar mais restritos ao âmbito
do Nordeste, em particular, da Bahia, achando contudo que determinados
questionamentos podem ter um valor para a pastoral do Brasil todo, não somente no
âmbito rural, mas também no que se refere à presença da igreja no mundo do operariado
urbano.
Diante da satisfação existente pelos resultados adquiridos pela pastoral popular, parece
necessário advertir seus limites para continuar a avançar nesse processo, descobrindo os
contínuos apelos que nos chegam dos setores mais marginalizados.
2. A SITUAÇÃO DOS BÓIAS-FRIAS
Em vários encontros de agentes de pastoral e de trabalhadores rurais constata-se o
número cada vez maior de trabalhadores que perdem o acesso à terra onde trabalhavam
para tirar o seu sustento e se vêem obrigados, para sobreviver, a vender sua força de

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