Partidos políticos no Brasil - efetividade e representatividade

AutorDaniel Castro Gomes da Costa - Tarcisio Vieira de Carvalho Neto
Páginas71-91

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Este artigo sugere a refiexão sobre o funcionamento dos partidos políticos diante do sistema político adotado nos dias atuais. Tem o objetivo de contrapor a sistemática partidária com os anseios por uma reforma política. Traz para o centro do debate a necessidade de um maior fortalecimento das instituições partidárias, com o a efetiva aplicação da cláusula de barreira e o retorno da verticalização das coligações partidárias, além de profunda alteração na forma de escolha dos representantes do povo, estes os eleitos para os cargos proporcionais.

1. Introdução

Este artigo busca apresentar considerações acerca do funcionamento dos partidos políticos no Brasil, onde faremos a análise sobre a criação sob a perspectiva constitucional e histórica, a real participação e representatividade junto à sociedade brasileira, a forma de atuação dos mesmos dentro do sistema político vigente, além da exposição de ideias para alterar o quadro que hoje se apresenta, não tendo como intenção apresentar algo que nunca fora discutido no mundo acadêmico; no entanto, defender com veemência a urgente necessidade de mudança e sugerir o modo como essas mudanças poderiam ser realizadas, buscando experiências exitosas em outras democracias mais consolidadas e experientes do que a nossa.

Não será intenção também adentrar em temas ideológicos ou creditar a partido "A" ou "B" a falência do sistema partidário brasileiro, uma vez que é notório que em pouco tempo de permissão constitucional para livre e indiscriminada criação de partidos políticos no Brasil - com o advento da Constituição de 1988 - os próprios partidos políticos, para não falar de seus figurões e eternos dirigentes - foram os responsáveis para o descrédito social e político para essa tão importante instituição e conquista democrática.

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A indignação social é tanta que se chega ao cúmulo de discutirmos - embora exista em outras democracias, como a americana - a possibilidade de cidadãos comuns, cumprindo os demais requisitos de elegibilidade - possam se candidatar sem serem filiados a partidos políticos, sem necessariamente serem representantes de um segmento, de uma classe, de uma ideologia, de uma cultura etc.; sendo, só e se somente só, um natural defendendo individualmente seus pensamentos. E tal discussão, que entendemos ser absurda, apenas pode ocorrer em razão da fragilidade das agremiações partidárias.

Ocorre que quando os constituintes, insculpidos do mais alto grau de espírito de liberdade, sob o recente trauma da repressão representada pela ditadura militar e, por conseguinte partidária, tiveram a possibilidade de expandir as possibilidades, assim o fizeram; e mais, criaram requisitos não tão fáceis para que uma organização partidária saísse do mundo da idéia para o mundo real, com seu registro deferido pelo Tribunal Superior Eleitoral.

E mais ainda, permitiram também que os partidos que viessem a ser criados pudessem vir usufruir, de tempo de televisão para propagação dos conteúdos programáticos defendidos, cultivassem a cultura da política para gêneros diversos, dentre outras possibilidades legais, como também destinaram recur-sos públicos, os chamados fundos partidários, para as agremiações que detenham representatividade na câmara federal.

O que podemos concluir com as possibilidades abertas pela Constituição Federal e a própria Lei dos Partidos Políticos e Lei geral das Eleições, estas editadas em 1995 e 1997 é que muito embora os constituintes tivessem a clara idéia de supressão à repressão, com a plena liberdade de manifestação e expressão, sendo estas politicamente representadas pelos partidos políticos, abriu-se a porta uma profusão de agremiações partidárias, de todos os gostos e gêneros, criando uma nova "profissão", a do dirigente partidário profissional.

Vejamos com atenção. Não estamos a falar do "político profissional", daqueles que detém seguidos mandatos eletivos, através do sufrágio concedido pela sociedade a qual representa, pois estes, bons ou ruins, expuseram seus nomes ao crivo da sociedade, cabendo a esta, portanto, dar-lhes ou não novas oportunidades.

O que estamos a instigar neste debate é, principalmente, a figura dos dirigentes partidários, aqueles que passam anos e anos e continuam a comandar o partido a qual é filiado, ou se filia a outro em que possa controlar.

Estes mesmos "dirigentes profissionais" são aqueles que se organizam de forma estruturada, inclusive com financiamento de outras agremiações e com

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dinheiro público, para criarem partidos políticos sem qualquer expressão ou representatividade social, sem qualquer "bandeira", com o único intuito de cooptar deputados federais - principalmente - e políticos ocupantes de outros cargos, em razão da possibilidade garantida pelo Poder Judiciário (não ouso a chamar de lei por evidente inércia do Poder Legislativo de tratar sobre o tema) para adquirir tempo de televisão, recursos do fundo partidário, prestígio político e, com isso, realizar "negociatas", acordos "espúrios" nas mais variadas esferas do governo, seja federal, estaduais ou municipais, sempre no intuito de "mamar nas tetas públicas" e contemplar com cargos comissionados ou conchavos com fornecedores negócios futuros.

Pois bem, o intuito deste artigo é para que possamos refietir se o sistema que até aqui está vigorando é o mais adequado para darmos prosseguimento à vida partidária brasileira e, em consequência, da vida pública do estado brasileiro.

Neste contexto, partamos para um momento mais prático, didático do debate que se pretende.

2. Da ditadura partidária

Como é de conhecimento dos que estudam e vivem a praticam do direito eleitoral, sobretudo aqueles que transitam com o direito e/ou a ciência política, ciências que no nosso sentir são umbilicais, a maioria da população brasileira repudia os políticos e os partidos políticos, mas sequer sabem de sua estruturação prática nem as quantas andam o sistema atual. O que é pior, eis que se soubessem rejeitariam ainda mais.

Historicamente, no Brasil, para praticar a arte da política, digo a convencional, ser detentor de mandato eletivo, salvo raras exceções, o interessado ou tem correndo em seu sangue uma histórica política herdada de seus antepassados ou por destino da vida ocupa uma posição pública importante, se torna famoso por alguma atividade etc.

Em regra essas são as características principais dos que ocupam mandatos eletivos no país, seja a esfera que for. A restrição é feita de forma tamanha que começa a ser feita no partido político, onde comumente ou o próprio mandatário possui o "poder supremo" ou alguém de sua confiança ali está para cumprir suas ordens. No jargão popular dizem que "o político independente é aquele que possui o seu próprio partido".

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Este, com certeza, é um dos principais motivos para que não exista demo-cracia partidária, para que pessoas "comuns", estas as que não possuem famílias que de forma secular controlam regiões de estados ou ganhem fama por qualquer motivo, não possam ingressar de forma consistente neste meio tão segmentado.

Em razão deste entendimento dos políticos tradicionais e do amparo legal, em que se prevê que os estatutos partidários serão lei entre as agremiações, não havendo uma regulação maior oriunda de disposição do Congresso Nacional, não há que se falar em possibilidades outras que não sejam as de interesse dos dirigentes partidários, sobretudo do presidente.

Não se vê, como em outras democracias, tendo como maior exemplo a dos EUA, uma disputa interna para que interessados possam colocar seu nome no debate e tentar convencer os correligionários acerca de suas propostas, os motivos que lhe levam a postular uma indicação partidária, a possível aceitação do seu nome e de suas atividades junto à sociedade etc. Nada disso é levado em conta.

Ousamos afirmar que, embora seja alardeada à democracia junto à socie-dade, junto às instituições públicas, são os próprios políticos, em seus quintais, seja nas regiões em que representam ou no partido político do qual fazem parte, que praticam o que passamos a denominar de "Ditadura Partidária".

Para melhor ilustrar a afirmação, basta perceber que qualquer projeto de reforma política que se preze que tenha realmente como esteio uma alteração do sistema político brasileiro, deve começar pela democratização dos partidos políticos (obviamente mais a frente trataremos sobre outros aspectos, como limitações para acesso ao fundo partidário, tempo de televisão gratuito, etc.), possibilitando o debate interno para só após, depois de unificado o discurso, abrir espaço para que os interessados se apresentem e propaguem suas ideias.

Ocorre que o intervencionismo partidário ainda reina, domina a prática política brasileira. Raras às vezes ouvimos falar que determinado partido político venha a debater aliança para formação de coligação ou mesmo para lançamento de candidaturas, e quando ocorre isso é a nível nacional, uma vez que são os "caciques" partidários que se reúnem cada um representando a força política de uma região ou seguimento social.

No mais das vezes, em se tratando de diretórios estudais ou municipais os filiados aos partidos ou mesmo os simpatizantes a determinada agremiação, sejam pessoas físicas ou jurídicas, não possuem qualquer interferência, seja em razão do domínio político já existente na direção partidária, que decidem os

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rumos de forma estritamente restrita, normalmente em "bons restaurantes", sejam pelo fato de que quando há vontade política de se fazer um processo mais democrático ou mesmo seguir caminhos alternativos, os diretórios superiores agem de forma...

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