Parecer: utilização de animais em rodeios

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A pedido da Mountarat Associação de Proteção Ambiental elaboramos parecer sobre a utilização de animais em rodeios como embasamento contrário ao Projeto de Lei 139/09, de autoria do Sr. Veredor Alemão do Cruzado, que dispõe sobre a promoção e realização de rodeio no Município de Santo André e dá outras providências, com a consequente revogação da Lei 6879/92 e do artigo 50 da Lei 9074/08, tendo em vista que se trata de pretensão flagrantemente inconstitucional e ilegal, e, no caso de sua eventual aprovação, faria com que o Município deixasse de cumprir fielmente a legislação ambiental pátria, não se coadunando com a tão necessária evolução sócio-ambiental.

Origem dos rodeios

No século XVII, logo após a vitória do Estados Unidos da América na guerra contra o México, os colonos norte-americanos adotaram alguns "costumes" de origem espanhola e praticadas à época pelos mexicanos, especialmente as festas e a doma de animais, os quais eram rodeados1.

Com o passar do tempo, o rodeio foi adquirindo as características que conhecemos hodiernamente, tendo sua prática sido desenvolvida e incentivada nos EUA, no final do século XIX, onde boiadeiros exibiam suas "proezas" e com isso ganhavam status e apostas, tendo a cidade de Colorado sediado a primeira prova de montaria no ano de 1869 e entre 1890 e 1910 o rodeio

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surgindo como entretenimento público em vários eventos do Oeste, celebrações de ação de graças e convenções pecuárias.

Apesar da origem norte-americana, até mesmo por lá esta prática não tem sido considerada cultural, havendo, inclusive, cerca de 15 cidades que já a proíbe em seu território, entre elas Fort Wayne (Indiana) e Pasadena (Califórnia).

Aqui no Brasil, diferentemente do que dito por muitos, a prática do rodeio nada tem de cultural, tratando-se de uma cópia do modelo norte-americano, já que os primeiros bovinos criados por aqui eram da raça caracu, que são animais pesados e com enormes "guampas", sendo impossível sua utilização para fins de rodeios.

A exemplo dos EUA, também já existem diversas cidades brasileiras com legislação específica proibitiva à realização de rodeios em seus limites, como, por exemplo, São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Sorocaba (SP), Guarulhos (SP), Jundiaí (SP), Campinas (SP) etc. Há, ainda, diversas ações judiciais julgadas procedentes, impedindo-se a realização de rodeios nas comarcas onde foram impetradas e/ou se impedindo a utilização de instrumentos considerados cruéis (sedém, peiteira, esporas etc.), o que na prática também inviabiliza a realização dos cruéis rodeios, tendo-se em vista que o animal, sem o estímulo humano, de fato não pulará ou correrá de forma intermitente.

Os animais nos rodeios

Nos rodeios são utilizados bovídeos, eqüinos e até mesmo caprinos, todos expostos à pretensa dominação do ser humano, que utiliza diversas artimanhas e apetrechos para que o animal pareça bravio e então seja domado pelos peões.

Dentre os instrumentos mais utilizados para que os animais corcoveiem, há alguns que podem ser facilmente visualizados:

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- Sedém:

Espécie de cinta, de crina e pêlo, que se amarra na virilha do animal e que faz com que ele pule.

Momentos antes de o brete ser aberto para que o animal entre na arena, o sedém é puxado com força, comprimindo ainda mais a região dos vazios dos animais, provocando muita dor, já que nessa região existem órgãos, como parte dos intestinos, bem como a região do prepúcio, onde se aloja o pênis.

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Há, inclusive, diversos laudos comprovando os maus-tratos aos animais submetidos à utilização do sedém, como veremos em tópico a seguir, e desmistificando o dito por aqueles que são favoráveis aos rodeios, de que o sedém provoca apenas cócegas.

Aliás, mesmo que considerássemos que o sedém cause apenas cócegas, devemos ressaltar a definição de cócegas como sendo "uma sensação particular, irritante, que provoca movimentos espasmódicos". Portanto, mesmo que apenas as cócegas fossem causadas, por si só já caracterizam os maus-tratos.

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Lembremos que não é durante apenas os 8 (oito) segundos de montaria que o sedém é comprimido no animal. Oito segundos é o tempo que o peão deve permanecer no dorso do animal, porém deve-se lembrar que o sedém é colocado e comprimido tempos antes do animal ser colocado na arena (ainda no brete) e também tempos depois da montaria. Além disso, há declarações de peões de que treinam de

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6 a 8 horas diárias, portanto, todo este tempo o animal estará sendo maltratado.

Importante também dizermos que sedém macio, como o trazido no bojo da Lei n.º 10.519/02, que dispõe sobre a promoção e a fiscalização da defesa sanitária animal quando da realização de rodeio e dá outras providências, não evita o sofrimento dos animais, já que a região onde são colocados são extremamente sensíveis, e, portanto, inócua essa tentativa de minimização dos efeitos de danos que os sedéns causam aos animais.

Finalmente, de se ressaltar também que, é totalmente constitucional que um Município promulgue leis ambientais mais protetivas que leis federais, portanto, totalmente legal a proibição de qualquer evento cruel aos animais por parte do Município.

- Esporas:

As esporas são objetos pontiagudos ou não, acoplados às botas dos peões, servindo para golpear o animal (na cabeça, pescoço e baixo-ventre), fazendo, em conjunto com o sedém e outros instrumentos, com que o animal corcoveie de forma intensa. Além disso, quanto maior o número de golpes com as esporas, mais pontos são contados na montaria.

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Improcedente o argumento de que as esporas rombas (não pontiagudas) não causam danos físicos nos animais, pois ocorre a má utilização destes instrumentos, e como dissemos anteriormente, visa-se golpear o animal e, portanto, com ou sem pontas, as esporas o machucam, nor-

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malmente provocando cortes na região cutânea e perfuração no globo ocular.

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- Peiteira:

Consiste em uma corda ou faixa de couro amarrada e retesada ao redor do corpo do animal, logo atrás da axila. A forte pressão que este instrumento exerce no animal acaba causando-lhe ferimentos e muita dor também.

- Polaco (sinos):

Na peiteira são colocados sinos, os quais produzem um barulho altamente irritante ao animal, ficando ainda mais intenso a cada pulo seu.

Aliás, ressaltemos que a irritação que o polaco causa aos touros é inclusive reconhecida pelos próprios apreciadores e praticantes de rodeios, já que é definido em sites do gênero (Estância Alto da Serra) como: "sinos de metal colocados no touro para irritá-lo" (sic) 2 (grifos nossos).

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Existem ainda alguns apetrechos e métodos utilizados para colaborar com as "acrobacias" dos animais que são utilizados nos bastidores de rodeios, sem que muitas pessoas tenham acesso visual, além, é claro, da situação estressante que os animais são submetidos nos mo-

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mentos que antecedem sua entrada nas arenas. Dentre eles podemos citar:

- objetos pontiagudos: pregos, pedras, alfinetes e arames em forma de anzol são colocados nos sedenhos ou sob a sela do animal;

- choques elétricos e mecânicos: aplicados nas partes sensíveis do animal antes da entrada à arena;

- terebintina, pimenta e outras substâncias abrasivas: são introduzidas no corpo do animal antes que sejam colocados na arena, para que fiquem enfurecidos e saltem. As substâncias abrasivas em contato com cortes e outros ferimentos no corpo do animal causam uma sensação de ardor insuportável;

- golpes e marretadas: na cabeça do animal, seguido de choque elétrico, costumam produzir convulsões no animal e são os métodos mais usados quando o animal já está velho ou cansado, com a finalidade de provocar sua morte.

- descorna: o chifre dos bovídeos, para a realização de deter-minadas provas, é "aparado" com a utilização de um serrote, sem anestésico, e causando sangramentos e dor aos animais;

- transporte dos animais: os animais são transportados em minúsculos espaços, e para que embarquem ou desembarquem dos caminhões, são obrigados a passarem por rampas, sendo que muitas vezes os animais escorregam e se fraturam neste ato;

- brete: é o local onde ficam confinados os animais antes da prova e onde são preparados para montaria. Neste momento o animal passa por uma situação enorme de estresse, tendo-se inclusive sérios estudos a respeito, como veremos em item a seguir. De se notar que ao lado dos bretes, bem como em toda a arena de rodeio há grandes caixas de som, com som altíssimo, o que provoca grave estresse aos animais também, tendo-se em vista que, em média, possuem acuidade auricular quatro vezes melhores que dos humanos. Se estes muitas vezes já se incomodam com o alto som, imagine-se os animais.

- alimentação: na maioria das vezes, os animais recebem sim boa alimentação, mas não deixemos que este fato nos engane,

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achando que por este motivo os animais são bem tratados. Na verdade, o animal, para entrar bem na arena e cumprir sua "função", tem que estar forte e com uma aparente saúde física boa, por isso não há como não lhe prover alimentação e o mínimo de cuidados. Porém, com certeza isso não anula os maus-tratos que já reportamos anteriormente.

Modalidades praticadas nos rodeios

Além dos métodos e apetrechos utilizados para incitar o animal a corcovear e a correr de forma voraz dentro das arenas já citados anteriormente, mister sabermos ainda quais são as modalidades que se praticam nos rodeios, para que entendamos os maus-tratos aos animais praticados em cada uma delas.

A seguir trazemos as...

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