Origens da Regulamentação Legal da Jornada de Trabalho

AutorAmauri Mascaro Nascimento/Sônia Mascaro Nascimento
Páginas316-324

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1. As primeiras leis sobre limitação da jornada no direito estrangeiro

As primeiras leis trabalhistas, de cunho marcadamente protecionista, ocuparam-se da limitação da jornada diária do trabalho, procurando fixar os parâmetros razoáveis dentro dos quais o trabalho humano passaria a ser prestado nas empresas do início da sociedade industrial.

Na Inglaterra (1847), o Parlamento discutiu projeto cuja justificativa era a seguinte: “Para que a agitação fosse conduzida tranquilamente, para que cessassem todas as discussões entre o capital e o trabalho, para que mais não houvesse greves, ameaças, injúrias em relação aos patrões, dentro ou fora do Parlamento” (Süssekind, extraído de Life of the Earl of Shaftesbury), fixou-se a duração diária do trabalho em 10 horas.

A França (1848) também resolveu estabelecer a jornada de 10 horas em Paris e 11 horas nas Províncias, segundo lei inspirada por Louis Blanc, fundamentada em que “o trabalho manual muito prolongado não só arruína a saúde dos trabalhadores, mas também os impede de cultivar a inteligência, prejudicando a dignidade do homem”. No mesmo ano, no entanto, voltou a lei à jornada de 12 horas.

Outros países, mais ou menos na mesma época, introduziram medidas de igual sentido, dentre os quais a Suíça (1877), fixando a jornada em 11 horas; a Áustria (1885), em 10 horas; os Estados Unidos (1868), em 8 horas no serviço público federal; a Rússia (1887), em 10 horas; e a Austrália (1901), em 8 horas.

2. A conquista da jornada de 8 horas

A — RERUM NOVARUM. A influência da Encíclica Rerum Novarum (1891) se fez sentir na determinação desses rumos legislativos, ao declarar que “não deve o trabalho prolongar-se por mais tempo do que as forças o permitem”.

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A jornada de 8 horas foi se generalizando no início do século XX, incluindo-se entre os países que a adotaram o Uruguai (1915); a Suécia (1915); a França (1915), somente para minas e arsenais da Marinha; o Equador (1916); a Rússia (1917); a Finlândia (1917); o México (1917); a Alemanha (1918), para mineiros e industriários e, em 1919, para os demais empregados; a Itália (1919), para ferroviários, marítimos e rodoviários; a Inglaterra (1919) etc.

B — TRATADO DE VERSALHES. Foi, porém, o Tratado de Versalhes (1919) a cristalização da jornada diária de 8 horas, com a criação da Organização Internacional do Trabalho e a promulgação da Convenção n. 1, pela Conferência de Washington.

Não é difícil compreender que se houve essa reação dos Estados no sentido de limitar a autonomia dos particulares é porque os abusos foram de grande proporção. E é, realmente, o que registram os historiadores que indicam esse problema como uma das principais causas da questão social. Vejam-se alguns poucos, mas significativos dados. Georges Duveu escreve que no século XIX, na França, os mineiros passavam 12 horas no fundo das minas; nas fábricas de alfinetes, o normal era o trabalho durante 14 ou 15 horas; nas tecelagens também. É conhecida a luta, na Inglaterra, pelas 8 horas, inspirando, mesmo, as letras de uma canção de protesto social: Eight hours to work/eight hours to play/eight hours to sleep/eight shillings a day.

Antecedentes remotos estão nas Leis das Índias (1593), de Felipe II, estabelecendo em 8 horas a duração diária, das quais 4 horas pela manhã e 4 horas à tarde, nas “fortificações e fábricas”.

3. A evolução das leis no Brasil

O período no qual foi edificado o sistema legal por nós adotado vai de 1932 a 1940.

Em 1932, os Decretos ns. 21.186 e 22.033 para o comércio e 21.364 para a indústria dispõem sobre jornada. Seguiram-se decretos especiais para diferentes profissões. Aliás, essa é a característica da década de 1930, como consequência da política trabalhista instaurada pelo Estado, muitos acolhendo o princípio das 8 horas, outros estabelecendo limites até mesmo inferiores.

Em 1933, houve a regulamentação por decreto da jornada de trabalho nas barbearias (Decreto n. 22.979), farmácias (Decreto n. 23.084) e panificação (Decreto n. 23.104); a duração diária do trabalho nas casas de diversões foi fixada em 6 horas (Decreto n. 23.152), nos bancos e casas bancárias, em 6 horas (Decreto n. 23.322), e nas casas de penhores, em 7 horas (Decreto
n. 23.316).

Em 1934, a jornada de 8 horas foi instituída em favor dos trabalhadores em transportes terrestres (Decreto n. 23.766), armazéns e trapiches das empresas de navegação (Decreto n.
24.561), indústrias frigoríficas (Decreto n. 24.562), pessoal de hotéis e restaurantes (Decreto
n. 24.696), e em 6 horas para o pessoal de telegrafia submarina e subfluvial, radiotelegrafia e radiotelefonia (Decreto n. 24.634).

Os ferroviários passaram a ter, em 1935, um diploma legal próprio para as características da sua atividade.

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Em 1938, foi disciplinado o trabalho dos jornalistas, com a jornada normal de 5 horas (Decreto-lei n. 910), e em 1940 o dos professores, limitado ao máximo de 6 aulas por dia (Decreto-lei n. 2.028).

A unificação dessas normas esparsas deu-se em 1940, com o Decreto-lei n. 2.308, pelo qual passamos a ter a regra geral das 8 horas e durações diferentes para determinadas profissões.

A CLT (1943) incorporou o Decreto-lei n. 2.308 e os regimes especiais.

A Constituição de 1988 manteve a duração diária de 8 horas e reduziu a semanal de 48 para 44 horas.

Em 1994, a Lei n. 8.966 deu nova redação ao art. 62 da CLT para excluir da proteção das regras de jornada de trabalho os gerentes, diretores e chefes de departamento ou filial quando receberem gratificação de função de 40%.

Em 1998, Medidas Provisórias criaram a anualização das horas que foram incorporadas ao art. 59, § 2º, da CLT.

Em 2001, a Lei n. 10.243 acrescentou um parágrafo ao art. 58 da CLT, dispondo sobre tempo in itinere, e a Medida Provisória n. 2.164 criou o regime de jornada de trabalho a tempo parcial, incorporada ao texto da CLT (art. 58-A).

Em 2004, a Emenda Constitucional n. 45 ampliou a competência da Justiça do Trabalho e passou a exigir o comum acordo para o ajuizamento de dissídio coletivo, entre outras medidas.

Em 2008, a Lei n. 11.648 reconheceu formalmente as centrais sindicais.

Em 2011, a Lei n. 12.506 regulamentou o aviso-prévio proporcional.

A Lei Complementar n. 150, de 2015, equiparou o empregado doméstico aos demais empregados.

Em 2017, a Lei n....

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