A noção de governança: uma mesocategoria da ação coletiva

AutorAnete B. L. Ivo
CargoDoutora em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco, mestre em Ciências Sociais pela Universidade Federal da Bahia (1975) e em Sociedades Latino Americanas pela Université de Paris III (1980). É professora no Programa de Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (UFBA) e professora colaboradora do Programa de Pós-Graduação em ...
Páginas63-82
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 45, n. 249, p. 63-82, jan./abr. 2020 | ISSN 2447-861X
A NOÇÃO DE GOVERNANÇA: UMA MESOCATEGORIA DA AÇÃO
COLETIVA
The notion of governance a mesocategory of collective actions
Anete B.L. Ivo
(UFBA/UCSAL)
Lattes Id http://lattes.cnpq.br/9638917902863360
Informações do artigo
Recebido em 08/03/2020
Aceito em 10/04/2020
doi>: https://doi.org/10.25247/2447-861X.2020.n249.p63-82
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative
Commons Atribuição 4.0 Internacional.
Como ser citado (modelo ABNT)
IVO, Anete B.L. A noção de governança: uma
mesocategoria da ação coletiva. Cadernos do CEAS:
Revista Crítica de Humanidades. Salvador, v. 45, n.
249, p. 63-82, jan./abr. 2020. DOI:
https://doi.org/10.25247/2447-861X.2020.n249.p63-82
Resumo
Este artigo examina as origens e os limites da noção de
governança, como uma mesocategoria da ação coletiva
de caráter polissêmico, observando contextos políticos
distintos, ou seja, do neoliberalismo às tendências
contra-hegemônicas de lutas e demandas da cidadania
nos territórios. O esforço analítico relaciona a noção de
governança com as práticas, discursivas e conceituais,
politicamente situadas que estabelecem r elações
dialéticas entre conhecimento e política, sob a forma de
conflitos cognitivos sobre a regulação social nos
territórios e os direitos de grupos sociais em disputa.
Trata-se de observar os arranjos de governança quanto
às relações de poder, cuja dinâmica não se restringe
exclusivamente ao Estado, mas envolve forças sociais em
conflito, mediadas por processos cognitivos e simbólicos
de construção da hegemonia na política.
Palavras-chave: Governança. M esocategorias Sociais.
Ação Coletiva. Teoria Social. Neoliberalismo.
Abstract
This article examines the origins an d limits of the notion
of governance, as a mesocategory of the - polysemic
natured - collective action, observing different political
contexts, namely, from neoliberalism to the counter-
hegemonic tendencies of struggles and demands of
citizenship in territories. The analytical effort links the
notion of governance with the practices, discursive and
conceptual politically situated which establish
dialectical relations between knowledge and politics, in
the form of cognitive conflicts over both the social
regulation in the territories and the rights of social groups
in dispute. It is about observing the governance
arrangements with regard to power relations, whose
dynamics are not restricted exclusively to the State, but
involve social forces in conflict, mediated by cog nitive
and symbolic processes of construction of hegemony in
politics.
Keywords: Governance. Social Mesocategories.
Collective Action. Social Theory. Neoliberalism.
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 45, n. 249, p. 63-82, jan./abr. 2020
64
A noção de governança: uma mesocategoria da ação coletiva | Anete B.L. Ivo
Introdução
A noção de governança constitui-se uma mesocategoria da ação coletiva que aparece ao
final da década de oitenta, em documentos do Banco Mundial, como alternativa ao
desenvolvimento local. Essa noção foi sendo gradativamente apropriada pelo senso prático
como uma categoria da ação dos agentes sociais em contextos de luta e resistência nos
territórios, gerando polissemia conceitual, no âmbito sociológico.
A análise recompõe a constituição dessa categoria de alcance médio atrelada
originalmente à agenda liberal global, e como a apropriação dessa noção da ação pública, no
curso da práxis dos agentes, assimila novos regimes de conhecimento dos atores no contexto
contemporâneo. O esforço analítico articula a formação da noção com as estr uturas sociais,
políticas e institucionais em práticas discursivas e conceituais situadas estabelecendo
relações dialéticas entre conhecimento e política, expressas na forma de conflitos cognitivos
sobre a re gulação social dos territórios e grupos sociais. Tr ata-se, pois, de observar a
realidade intrínseca à relação de poder, cujo objetivo não se restringe ao funcionamento da
ação do Estado, mas envolve a mediação de forças sociais em conflito. A ideia é trazer
elementos que demonstrem novos modos de subjetivação dos agentes sociais nas relações
de governo, estruturados por normas.
Suportes teóricos para uma categoria do senso prático
A palavra governança apoia-se na noção foucaultiana de governamentalização
(gouvernamentalité) (FOUCAULT, 1979) das relações de poder sob a caução dos Estados
nacionais, e, acrescento, também, das instituições multilaterais de desenvolvimento, no
contexto da globalização. Essa racionalidade opera no campo das instituições e nas análises
científicas, na forma de relações de poder que integram a construção de um Estado gerencial
sobre a população, entendida como governo.
Essa governamentalização implica concertação de intere sses divergentes entre
agentes do mercado, Estado e sociedad e, e mobiliza uma inteligência voltada para produzir
consensos (mesmo parciais) e inovações aos processos reais. Os arranjos de governança são
partes, portanto, de um processo contínuo de racionalização, controle e dominação da vida
social das populações, em contextos assimétricos de conflito. Esse regime de ação coletiva
não se confunde com a ação de governos, mas busca abarcar o poder dos atores sociais e

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT