Neoconstitutionalism and New Latin American Constitutionalism: two perspectives on equality, difference and participation/Neoconstitucionalismo e Novo Constitucionalismo Latino Americano: dois olhares sobre igualdade, diferenca e participacao.

AutorBarbosa, Maria Lucia

A modernidade e o "en-cobrimento" (1) das diferencas para a construcao do Estado Nacional fundado em ideais de universalidade, racionalidade epistemica e eurocentrismo.

0 que convencionamos chamar de modernidade corresponde a um referencial universalista da razao. Esse paradigma de modernidade, racionalista, universalista e individualista, pretende, a partir da ampliacao dos espacos da razao em escala universal, oferecer emancipacao e felicidade a partir do desenvolvimento humano e social. Sob o ponto de vista institucional, a formacao do Estado e do constitucionalismo e fruto deste imaginario.

"A modernidade aparece quando a Europa se afirma como centro de uma Historia mundial" (DUSSEL, 1993, p. 7). Trata-se de um processo violento de expulsao e invasao que coincide com a criacao dos Estados Nacionais. No continente europeu deu-se com a expulsao do mulcumano da Espanha e a construcao da ideia de Estado Nacional baseado na uniformidade e centralidade de poder que possibilitou o desenvolvimento do modo de producao capitalista. No continente americano deu-se com a invasao do continente pelo europeu e a consequente dominacao dos povos originarios e exploracao gratuita do trabalho e dos corpos indigenas e posteriormente do trafico e escravizacao dos negros advindos do continente africano, no que Dussel chama de primeiro holocausto do mito violento da modernidade, que, segundo ele, toma por marco o ano de 1492, ano de invasao das Americas e expulsao dos mulcumanos de Granada (DUSSEL, 1993).

Assim, a formacao dos Estado Nacionais na era moderna se deu a partir de processos violentos de "en-cobrimento" do outro, do individuo considerado diferente. O diferente que deveria ser expulso no contexto espanhol era o mulcumano e no contexto americano os diferentes que deveriam ser "civilizados" eram os povos originarios que, por outro ato de violencia simbolica, foram denominados indios. Os Estados, no contexto europeu, surgiram a partir da unificacao territorial, da formacao do exercito nacional, da moeda nacional e da lingua nacional. A America Latina esteve sob o controle da peninsula Iberica desde o seculo XIV ate dar impulso a um processo de emancipacao que se iniciou no final do sec. XVIII e se estendeu ate as primeiras decadas do sec. XIX. Foram quatro seculos de dominacao politica, exploracao economica e dizimacao das nacoes indigenas americanas. No contexto latino-americano, a formacao dos Estados Nacionais se deu a partir de lutas pela independencia liderados pela elite crioula (descendentes europeus) com intensa exclusao dos povos originarios e africanos, e a construcao de uma burocracia destinada a assegurar interesses que mantiveram o mesmo modelo de exploracao humana (escrava e indigena), voltados aos interesses economicos europeus, principalmente da Inglaterra que tinha ambicao nos insumos e mercados para expandir os efeitos de sua revolucao industrial. Assim, a independencia e formacao de Estados Nacionais Latino Americanos continuaram respaldadas em interesses eurocentricos e baseada na importacao de institutos do direito moderno europeu, como a propria nocao de Estado Nacional numa perspectiva uniformizante da linguagem, crencas, valores, moeda, direito e do uso legitimo da violencia pelo Estado e do modo de producao capitalista, reproduzindo majoritariamente os compromissos fundamentais de uma democracia liberal-burguesa.

A colonialidade e a caracteristica marcante da modernidade ocidental, como nos adverte Enrique Dussel, Anibal Quijano, Walter Mignolo, dentre outros autores do chamado giro descolonial. Colonialidade, categoria desenvolvida por Anibal Quijano, e colonialismo sao conceitos relacionados, porem distintos. O colonialismo se refere a um padrao de dominacao e exploracao em que o controle da autoridade politica, dos recursos de producao e do trabalho de populacoes determinadas possui uma diferente identidade de suas sedes centrais. O que se revelou com a dominacao/invasao dos continentes americano, africano e asiatico pelo continente europeu. A modernidade e marcada pelo colonialismo eurocentrico com o dominio europeu de outros continentes do globo.

Ja a colonialidade diz respeito a um fenomeno historico complexo que se estende ate os dias de hoje e se refere a um padrao de poder que opera atraves da naturalizacao de hierarquias territoriais, raciais, culturais e epistemicas que possibilitam a reproducao de relacoes de dominacao, que nao apenas possibilitam a exploracao pelo capital dos seres humanos em escala global, mas que subalternizam os conhecimentos, as experiencias e as formas de vida. A Colonialidade (QUIJANO, 2005, pp. 227-278) e a face obscura e constitutiva da modernidade. Ela caracteriza as relacoes de poder que se impuseram a partir da modernidade (BRAGATO, 2016).

A modernidade centrada em padroes eurocentricos de racionalidade epistemica, racialidade branca, genero masculino, modo de producao capitalista e modelo de Estado Nacional torna-se um ideal a ser seguido e corresponde a dominacao ideologica que perdura para alem do colonialismo, para alem da dominacao politico economica metropole/colonia que se estende da modernidade ate fins da decada de 70, quando praticamente todas as populacoes e espacos fora da Europa foram suas colonias.

Con colonialidad me refiero al padron o matriz de poder que se instala en el siglo XV y XVI, clasificando jerarquicamente las identidades sociales a partir de la idea de "raza, posicionando en la cima y como superior a los blancos europeos y los "blanqueados" de America del Sur, y los pueblos indigenas y afros en los peldanos inferiores como identidad negativas, homogeneas y inferiores. Asi a partir de este mismo patron se establecio el eurocentrismo como perspectiva unica de conocimiento, justifico la esclavizacion y deshumanizacion y descarto como barbaros, salvajes y no modernos (leer: subdesarrollados y "tradicionales") las filosofias, cosmologias, logicas y sistemas de vida de la gran mayoria: los pueblos indigenas y los pueblos de origen africano. Esta matriz o patron- que siempre ha servido los intereses y necesidades del capitalismo--hace que la mirada se fija en Europa como modelo, perspectiva y modernidad ideal. Y a partir de esa mirada--aun presente--que se formo los Estados nacionales y, por supuesto, sus sistemas juridicos (WALSH, 2015, pp 346-347).

Essa compreensao da existencia e permanencia da colonialidade possibilita o reconhecimento dos processos de exclusao de grupos sociais invisibilizados ate os dias atuais. O exterminio indigena, a discriminacao da mulher, o encarceramento da populacao negra, a intolerancia religiosa com as crencas de matriz africana, o desrespeito a diversidade sexual, as posturas xenofobas em relacao aos imigrantes e refugiados, atestam, como aponta Bragato, que o projeto de modernidade colonial venceu. Continuamos vivendo "sob a egide da matriz colonial de poder que denota que embora o colonialismo tenha chegado ao fim, e a colonialidade que marca as relacoes de poder contemporaneas" (Bragato, 2016).

O direito, como sistema social que e, reflete o contexto de colonialidade, porque cria direitos e obrigacoes comprometidos com uma determinada visao de mundo e de sociedade. Por isso, na narrativa consagrada pela Modernidade, o constitucionalismo representou a afirmacao e legitimacao de padroes eurocentricos e valores liberais burgueses com a consequente exclusao de grupos e sujeitos que nao se encaixam no perfil do homem branco europeu capitalista.

O constitucionalismo europeu representou um processo historico de afirmacao dos direitos fundamentais, sendo o resultado de um processo de estabilizacao institucional de expectativas normativas (LUHMANN, 1998) em torno da afirmacao de direitos. Estes direitos, inicialmente destinados a limitacao do poder do Estado, assumem apos a revolucao industrial o perfil de potencializadores da atuacao estatal. Temos assim, as duas grandes matrizes ideologicas do constitucionalismo moderno: a primeira, com os direitos individuais, (ditos de 1a geracao, ou dimensao); e os segundos, com os direitos sociais (ditos de 2a geracao, ou dimensao).

O processo de afirmacao dos direitos fundamentais na tradicao europeia decorre de transformacoes politicas e institucionais que tem sua origem na fundacao do Estado enquanto ente capaz de conferir unidade politica a um agrupamento humano. O surgimento do modelo institucional estatal e viabilizado a partir da centralizacao do poder como resultado das lutas travadas pela monarquia tanto no plano interno, contra a nobreza feudal, como no plano externo, contra o Sacro Imperio Romano-Germanico. A partir da Paz de Vestfalia, afirma-se o conceito de Soberania e com ele importantes desdobramentos para a legitimacao discursiva das formas de exercicio do poder pelo Estado.

Uma dessas consequencias resulta na definicao dos chamados elementos constitutivos do Estado, compreendendo-se tais elementos, de acordo com a classica Teoria Geral do Estado, como uma estrutura unitaria, entre o elemento humano, sua dimensao pessoal (o povo), o elemento territorial, sua dimensao espacial (o proprio territorio, em sentido juridico), e o elemento formal (o governo, qualificado pela propria Soberania). Todos esses elementos construidos a partir de processos violentos de "en-cobrimento" de diferencas e construcao de uma retorica universalista.

Ja o periodo fundacional do Constitucionalismo Latino Americano, constitucionalismo crioulo, e marcado por acordos politicos entre conservadores e liberais, elites que tinham como proposito manter a mesma estrutura de dominacao colonial sem qualquer modificacao estrutural na sociedade, bem como sem ampliar direitos de participacao ou direitos sociais as demais camadas da populacao. Portanto, o periodo fundacional do constitucionalismo nao representou conquistas populares dos diversos grupos etnicos, raciais e de genero que compoe essas sociedades, ao contrario, manteve-se a estrutura exploratoria de maneira ainda...

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