Mulheres frente à recessão econômica e a austeridade: uma interpretação da economia feminista

AutorIriana Lima Cadó - Juliane da Costa Furno
CargoInstituto de Economia da Unicamp, Campinas, Brasil - Instituto de Economia da Unicamp, Campinas, Brasil
Páginas1-30
Artigo
Original
Textos de Economia, Florianópolis, v. 23, n. 1, p. 1-30, jan./jul., 2020. Universidade Federal de Santa Catarina.
ISSN 2175-8085. DOI: https://doi.org/10.5007/2175-8085.2020.e72033 .
MULHERES FRENTE À RECESSÃO ECONÔMICA E A
AUSTERIDADE: UMA INTERPRETAÇÃO DA ECONOMIA
FEMINISTA
Women facing economic recession and austery: an interpretation of the
feminist economy
Iriana Lima CADÓ
Instituto de Economia da Unicamp, Campinas, Brasil
iriana.cado@gmail.com
Juliane da costa FURNO
Instituto de Economia da Unicamp, Campinas, Brasil
jujufurno@gmail.com
RESUMO
Objetivo: O presente artigo tem por objetivo lançar um olhar, sob o viés da economia feminista, para trajetória das
mulheres no mercado de trabalho diante da recessão econômica (2014-2015) e posteriormente diante da aplicação de
um conjunto de políticas de austeridade. A hipótese que circunda este estudo é que homens e mulheres por assumirem
papéis sociais distintos, consequências da consolidação de um imaginário social sobre o que é ser homem e ser mulher,
são impactados diferentemente. A economia feminista vem se debruçando na tentativa de interpretar as diferentes
trajetórias destes sujeitos na esfera produtiva, questionando a universalidade e neutralidade das categorias
convencionais, apontando para a ideia de que decisões econômicas se colocam de forma distinta para os atores sociais.
Para isso lançaremos mão da discu ssão teórica da crítica da ec onomia feminista ao pensamento econômico clássico, e
olharemos para os indicadores oficiais do IBGE para correlacionar com o processo vivenciado no Brasil no período citado.
PALAVRAS-CHAVE: Economia feminista. Mercado de trabalho. Austeridade. Recessão econômica. Gênero.
ABSTRACT
Objetive: Under the bias of the feminist economy, this study cast a look at the trajectory of wom en in the labor market in
the face of the economic recession (2014-2015) and the ensuing set of austerity policies. The hypothesis surrounding this
research is that men and women, for assuming different social roles, consequences of the consolidation of a social
imaginary about what it is to be a man and a woman, are impacted differently.
The feminist economy has been focusing on the attempt to interpret the different trajectories of these subjects in the
productive sphere, questioning the universality and neutrality of conventional categories, and pointing to the idea that
economic decisions are placed differently for social actors. For this, we will make use of the theoretical discussion of the
critique of feminist economics to classical economic thought, and we will look at the official indicators of the IBGE to
correlate with the process experienced in Brazil in the mentioned period.
KEYWORDS: Feminist economy. Labour Market. Austerity. Economic recession. Gender.
Classificação JEL:
Recebido em: 06-03-2020. Aceito em: 06-07-2020.
2
Textos de Economia, Florianópolis, v. 23, n. 1, p. 1-30, jan./jul., 2020. Universidade Federal de Santa Catarina.
ISSN 2175-8085. DOI: https://doi.org/10.5007/2175-8085.2020.e72033
1 INTRODUÇÃO
A economia brasileira passou por um profundo período de crise econômica recente,
com queda de aproximadamente 7% do seu PIB entre os anos de 2015 e 2016. A queda
na atividade econômica precedida de um ano de déficit fiscal 2014 reascendeu o debate
sobre as alternativas de política econômica para a retomada do crescimento e o equilíbrio
fiscal. Nesse ínterim, a crise econômica foi sobreposta a uma crise política que levou ao
afastamento da Presidenta Dilma Rousseff e a assunção do seu vice Michel Temer, que foi
conduzido ao cargo embasado em um programa de austeridade fiscal e reversão das
principais ações de política social da era petista, embalado na insígnia de “Uma Ponte para
o Futuro”.
Embora desde o ano de 2015 a opção pela austeridade fiscal já vinha sendo a tônica
do governo Dilma, era é radicalizada com a ascensão do pemedebista, concebida sob um
projeto não apenas de contração fiscal quanto, também, de reformas estruturais, dentre as
quais a nova regra fiscal referendada na EC 95 e a Reforma Trabalhista.
O presente artigo parte da premissa de que momentos de crise econômica e de
opções de política centrada no corte de gastos, não apenas são incólumes no que tange
as possibilidades de retomado do crescimento econômico, quanto tem resultados distintos
e desiguais no que tange aos impactos sobre homens e mulheres.
Nosso objetivo, portanto - nesse artigo é apresentar as transformações no mercado
de trabalho para homens e mulheres em duas situações correlatas, porém, com
características próprias. A primeira delas é referente aos primeiros impactos da crise
econômica sob a situação laboral de homens e mulheres (2015-2016) e a segunda é
demonstrar as características da dinâmica do mercado de trabalho a partir da opção mais
clara pela política de austeridade fiscal (2016-2018).
Partimos da hipótese de que as formas distintas de impacto para homens e mulheres
na crise e na austeridade não podem ser, simplesmente, diagnosticadas. É preciso
instrumentos que desvendem a natureza própria da desigualdade de gênero. A ciência
econômica, principalmente na sua acepção tradicional ortodoxa, tem sido historicamente
negligente na compreensão as diferenças de gênero. Mesmo quando essa variável está
presente, como em Becker (1965), a superficialidade da análise com ausência de
elementos históricos e políticos, os levam a naturalizar as desigualdades de gênero,

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT