Muito mais que 'estudinhos': matriz privada do Direito do Trabalho e a atualidade dos 'apontamentos de direito operário' de Evaristo de Moraes

AutorGustavo Seferian Scheffer Machado
Páginas15-23
1.
muito mAiS que eStudinhoS”: mAtriz privAdA do
direito do trAbAlho e A AtuAlidAde doS ApontAmentoS
de direito operário de evAriSto de morAeS
Gustavo Seferian Scheffer Machado
(1)
(1) Professor de Direito e Processo do Trabalho na Universidade Federal de Lavras – UFLA. Bacharel em Direito, Mestre e Doutor
em Direito do Trabalho pela FDUSP. Foi pesquisador convidado, em sede pós-doutoral, no CéSor/EHESS/CNRS (2018). Pesquisador do
Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital-USP e coordenador do Núcleo de Estudos Trabalho, História e Direitos Sociais – UFLA, membros
da RENAPEDTS.
(2) Esgotando-se em uma e mais do que bastante referência, invocamos o insuperável José Martins Catharino: “Em 1905 (...) surge
o Apontamentos de direito operário, por Evaristo de Moraes, publicado pela Imprensa Nacional, primeira manifestação doutrinária
sobre a matéria.” CATHARINO, José Martins. Compêndio de Direito do Trabalho. Vol. 1, 2ª ed., rev. at., São Paulo: Saraiva, 1991 p. 20.
(3) Para um debate mais aprofundado sobre aspectos biográficos do autor ora objetivado, indicamos a obra Evaristo de Moraes,
tribuno da República, de Joseli Maria Nunes Mendonça (Campinas: Unicamp, 2007).
(4) MORAES, Evaristo de. Apontamentos de Direito Operário. 4. ed. São Paulo: LTr, 1998. p. 9. Ocasiões outras são tantas que ele
depreciará o importante trabalho. É de se notar, por exemplo, a menção de suas intenções com particular escrito depois incorporado
ao livro: “Limitar-nos-emos às verdades comezinhas, à altura dêste trabalhinho de vulgarização, e compatíveis co o insignificante
preparo de quem o escreve” (Idem, p. 84).
“O que transforma o velho no novo
Bendito fruto do povo será.
Como o Diabo Gosta, Belchior
1. DO PORQUÊ DE NOSSOS “ESTUDINHOS”
O Direito do Trabalho brasileiro deve muito à figura de
Evaristo de Moraes.
Seu papel enquanto incansável defensor dos setores
mais fragilizados da sociedade – na militância, nos debates
públicos, na produção acadêmica e nos tribunais – e sua
participação ativa em diversos e acalorados momentos da
vida política nacional na virada do século XX serviram de
esteio à sua influência, amplamente reconhecida pela dou-
trina trabalhista(2), na constituição dos alicerces de nosso
ordenamento jurídico trabalhista.
A influência por certo não se deu apenas pela sua atua-
ção na elaboração teórica, mas na incansável militância po-
lítica dentro e fora do ambiente forense. Foi fundador do
Partido Operário, em 1890 – o do Distrito Federal, não o
gaúcho –, do Partido Socialista, em 1902, e da Associação
Brasileira da Imprensa, em 1908. Deu corpo militante à
II Internacional, que não obstante as críticas que mere-
ça por seu caráter reformista, aglutinava os setores mais
combativos da classe nos fins do séc. XIX e início do séc.
XX. Sem temer represálias e agindo a partir de profundas
convicções classistas, atuou como rábula e, posteriormen-
te, advogado, sendo um dos responsáveis pela defesa de
João Cândido e outros marinheiros que conduziram a Re-
volta da Chibata, em 1910, bem como dos trabalhadores
criminalizados pela Greve Geral de 1917, em São Paulo,
entre outros casos relevantes.
Em nosso texto, porém, não nos ateremos a aspectos
biográficos de Evaristo de Moraes(3). Trataremos, sim, de
um livro de sua autoria, que de fato mostra quem é o autor
para o Direito do Trabalho. Destacamos para tanto, como
não poderia deixar de ser, aquele que é um dos monumen-
tos de maior importância à referência e à memória da tra-
dição juslaboralista do país: a clássica obra Apontamentos
de Direito Operário.
Diante da robustez deste fruto das mãos e do intelec-
to de Moraes, toda modéstia do autor quanto ao trato do
livro – lançada em diversas oportunidades, para além das
linhas iniciais do texto – soa para nós até mesmo artificial,
guardando sua imensa atualidade, ainda que passado mais
de um século de sua publicação, o inescapável denotar
de sua importância histórica. As adjetivações do “opúscu-
lo” enquanto um conjunto de “estudinhos(4), se tanto, só

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