Direitos humanos em movimento: migração, refúgio, saudade e hospitalidade

AutorVera Karam de Chueiri - Heloisa Fernandes Câmara
CargoProfessora de Direito Constitucional dos Programas de Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná - Professora de Direito Constitucional dos Programas de Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná
Páginas158-177
Direitos humanos em movimento:
migração, refúgio, saudade e hospitalidade*
Vera Karam de Chueiri* *
Heloisa Fernandes Câmara***
“Nous avons entrepris de suciter, à travers le monde, la proclamation et
l´institution de “ville-refuges” nombreuses et surtout autonomes, aussi in-
dépendantes entre elles et indépendantes des États qu´il serait possible, mais
de villes-refuges néanmois alliées entre elles selon des formes de solidarité à
inventer. Cette invention est notre tâche; la ref‌léxion théorique ou critique
y est indissociable des initiatives pratiques que nous commençons et réus-
sissons déjá à mettre em oeuvre dans l´urgence. Qu´il s´agisse de l´étranger
em general, de l´immigré, de l´exilé, du refugie, du deporte, de l´apatride,
de la personne déplacée (autant categories à distinguer prudemment), nous
invitons ces nouvelles villes-refuges à inf‌léchir la politique des États, à tans-
former et à refonder les modalités de l´appartenance de la cité à l´État[...]”
– Jacques Derrida, Cosmopolites de tous les pays encore un effort!)
“Hospitality thus precedes property”
– Jacques Derrida, Adieu to Emmanuel Levinas)
Direito, Estado e Sociedade n.36 p. 158 a 177 jan/jun 2010
* Parte deste artigo foi apresentada no Fórum Social do Mercosul na mesa temática Direitos Humanos,
Migrações e Refugiados no Cone Sul, ocorrida no dia 27/04/2008, em Curitiba-PR. Ele é dedicado a pro-
fessora Agnes Heller. Não fosse a sua existência e não fosse o capítulo 12 “Space, Place, and Home”, do seu
livro A Theory of Modernity, certamente não teríamos tido o estímulo e a inspiração. Agradecemos, ainda,
à Pastoral do Migrante em Curitiba, particularmente a Elizete e ao Gabriel Gualano de Godoy, à época
representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados pela imprescindível interlocução.
Também ao amigo e professor José Antonio Peres Gediel, da Cátedra Sergio Vieira de Melo para Refugiados,
pelo convite.
** Professora de Direito Constitucional dos Programas de Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Paraná. Email: vkchueiri@uol.com.br.
*** Professora de Direito Constitucional dos Programas de Graduação e Pós-Graduação da Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Paraná. Email: heloisafcamara@yahoo.com.br.
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Direitos humanos em movimento: migração, refúgio, saudade e hospitalidade
1. Deslocamentos
As migrações signif‌icam movimentos de pessoas (deslocamentos) que
normalmente ocorrem dentro do próprio país (migrações internas) ou de
um país para o outro (migrações internacionais). Esses deslocamentos
acontecem por vários motivos, porém, razões econômicas e políticas são
sempre determinantes. O primeiro caso, razões econômicas, relaciona-se
à falta de condições dignas de sobrevivência. São sujeitos ou grupos de
sujeitos mais vulneráveis que fogem da pobreza, da miséria, da polícia, etc
em busca de melhores oportunidades de vida e de trabalho que possam
satisfazer as suas necessidades básicas – alimentação, saúde, educação, cul-
tura etc. O segundo caso, razões políticas, relaciona-se à impossibilidade
do exercício de seus direitos, ou melhor, é quando a liberdade, a igualdade
– e seus desdobramentos – f‌icam impedidas de ser exercitadas. Assim, o
deslocamento, signif‌ica, ao mesmo tempo, o abandono, o distanciamento
da terra (natal), uma certa desterritorialização e a possibilidade de se res-
tabelecer em outra terra (outra região do mesmo país, ou até mesmo em
outro país). Assim, independentemente do que motiva a migração, sempre
há fatores graves o suf‌iciente para tornar o deslocamento a melhor opção,
ou ao menos a única possível.
O fenômeno das migrações não é novo; ao contrário, constitui a própria
formação e criação do que chamamos de civilização1 e mesmo antes disso,
a mobilidade era a regra, somente com o desenvolvimento da agricultura
os homens começaram a se estabelecer em uma terra “sua”. A migração
foi decisiva para a construção das identidades nacionais tanto em países
do “novo mundo” e, assim, notoriamente povoados por migrantes – como
o Brasil e os Estados Unidos – quanto em países do “velho mundo”, não
obstante seu fechamento e medo ao outro e suas diferenças – como o caso
da Inglaterra, França, Alemanha, entre outros. Portanto a migração, e a
mescla cultural não são fatos isolados, mas que (de)marcaram a sociedade
tal como a conhecemos. Entretanto, o que nos interessa neste artigo, é dis-
cutir esse movimento de pessoas que são levadas, para além da sua vontade
1 DUBY, 1998, p. 70.
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