Memórias da diversidade na Paraíba: as dores e os guardins de Nina Kelly

AutorSérgio Pessoa Ferro
CargoDoutorando na área de Direitos Humanos e Desenvolvimento pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas, Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas (2017) e pelo Programa de Pós-Graduação em Direitos Humanos, Cidadania e Políticas Públicas (2019), ambos da Universidade Federal da Paraíba. Graduado em Direito pela ...
Páginas41-62
Periódico do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Direito
Centro de Ciências Jurídicas - Universidade Federal da Paraíba
V. 8 - Nº 03 - Ano 2019
ISSN | 2179-7137 | http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ged/index
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MEMÓRIAS DA DIVERSIDADE NA PARAÍBA: AS DORES E OS
GUARDINS DE NINA KELLY
Sérgio Pessoa Ferro
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Resumo: Este trabalho conta a história
de vida de Nina Kelly, sessenta anos,
travesti, transformista, costureira,
destaque de escola de samba. Nascida no
interior da Paraíba, migrou para a capital
ainda adolescente, onde se estabeleceu.
A narrativa foi construída com base
numa metodologia interdisciplinar,
elegendo o gênero textual da entrevista
comentada como método de produção
discursiva. Posicionamos os estudos
sobre direitos humanos entre a teoria
literária, história, geografia, psicologia e
direito. Como fontes primárias de
informação, manejamos, além da
entrevista semiestruturada, fotografias
decorrentesdo acervo pessoal da sujeita.
A perspectiva de Maurice Halbwachs
nos oferece o conceito de memória
enquanto construção social, de modo que
o individual e o coletivo se cruzam em
1
Doutorando na área de Direitos Humanos e Desenvolvimento pelo Programa de Pós-Graduação em
Ciências Jurídicas, Mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas (2017) e pelo Programa
de Pós-Graduação em Direitos Humanos, Cidadania e Políticas Públicas (2019), ambos da Universidade
Federal da Paraíba. Graduado em Direito pela Universidade do Estado da Bahia (2013). Advogado,
credenciado sob a inscrição n. 42.536 OAB/BA. Realizador audiovisual. Pesquisa na área de Direitos
Humanos, Epistemologia, História do Direito, Direito de Crianças e Adolescentes, D ireito da Igualdade
Racial, Direito da Diversidade Sexual. Integra os grupos de pesquisa História do Direito (PPGCJ/UFPB) e
Socioeducação em análise (PPGDH/UFPB). Atualmente, trabalha com consultoria jurídica junto ao Centro
de Referência em Direitos Humanos, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
nossas lembranças. Assim, através das
reminiscências de Nina, pretendemos
mergulhar na memória social da
comunidade sexo-gênero dissidente em
João Pessoa.
Palavras-chave: diversidade sexual e
identidades de gênero; memória social;
direitos humanos; Paraíba.
Abstract: This paperis about a life
history of Nina Kelly, fifty-nine years
old, transvestite, transforming,
seamstress, highlight of samba school.
Born in the country of Paraíba, it
migrated to the capitalstill adolescent,
where it is seen. The narrative was
constructed based on an interdisciplinary
methodology, choosing the textual genre
of the interview as a method of
discursive production. Students position
Periódico do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Direito
Centro de Ciências Jurídicas - Universidade Federal da Paraíba
V. 8 - Nº 03 - Ano 2019
ISSN | 2179-7137 | http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ged/index
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on human rights between literary history,
history, geography, psychology and law.
As the primary sources of information,
they manage, in addition to the semi-
structured interview, photographs of the
personal collection of the publication.
The perspective of Maurice Halbwachs
offers us the concept of memory as a
social construction, so that the individual
and the collective are crossed in ample
memories. Thus, through the
reminiscences of Nina, we intend to
gather in the social memory of the
dissenting sex-gender community from
João Pessoa.
Keywords: sexual diversity and gender
identities; social memory; human rights;
Paraíba.
1. Introdução
Os indicadores marcam um
crescimento nos assassinatos motivados
por ódio a pessoas que expressam
sexualidades e identidades de gênero
divergentes do padrão cis-
heteronormativo. O Relatório 2017 de
pessoas LGBT mortas no Brasil,
elaborado pelo Grupo Gay da Bahia,
registrou 445 mortes, sendo 387
assassinatos e 58 suicídios, nunca antes a
organização computou tantos óbitos em
quatro décadas de levantamento.
A Anistia Internacional, em seu
portal online, publicou declaração do
Grupo Transrevolução, do Rio de
Janeiro, afirmando que a expectativa de
vida de uma pessoa trans em nosso país
corresponde a cerca de 30 anos, muito
inferior à média nacional de 75, 2 anos,
segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (Queiroz, 2017).
A violência letal, a transfobia
institucional, o trabalho no mercado
informal de prostituição, e muitos outros
fatores, engendram um panorama de
genocídio da população trans.
A história se escreve
coletivamente, o direito à memória é
uma pauta insistente da luta por direitos
humanos na América Latina, em busca
de recontar nosso passado de colônia,
escravidão e ditaduras civil-militares.
Lésbicas, travestis, transexuais,
bissexuais, bichas e as mais variadas
expressões dissidentes na sexualidade e
identidade de gênero: se não
reproduzimos, como existem tantas?
A perguntalançada no parágrafo
anterior ironiza a noção biológica do
gênero e da sexualidade, induzindo sobre
a presença histórica de nossas

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