A memória na prisão: entre a massificação e a resistência

AutorJosé Mauro Oliveira Braz - Fernanda Santos Curcio - Francisco Ramos de Farias
CargoMestrando em Memória Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil - Mestranda em Memória Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil - Doutor e Mestre em Psicologia pela Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
Páginas1-20
http://dx.doi.org/10.5007/1807-1384.2016v13n1p1
A MEMÓRIA NA PRISÃO: ENTRE A MASSIFICAÇÃO E A RESISTÊNCIA
José Mauro Oliveira Braz
1
Fernanda Santos Curcio
2
Francisco Ramos de Farias
3
Resumo:
Este artigo tem como objetivo compreender como a instituição prisão consegue, por
intermédio de suas dinâmicas, experiências e práticas disciplinares, funcionar de
modo a provocar o nivelamento das diferenças subjetivas dos encarcerados pela
assimilação das normas de convivência, em termos de submissão e obediência a
cultura prisional. Como metodologia utilizada, realizou-se o levantamento
bibliográfico de obras que auxiliassem na construção desta discussão, onde autores
como Foucault, Goffman, Thompson e Althusser direcionaram o referido trabalho. O
fenômeno da massificação subjetiva se faz presente na medida em que a instituição
atua no sentido de tentar produzir semelhantes experiências nos encarcerados,
transformando-as em vestígios de memórias e lembranças. Desse modo, a prisão,
como qualquer outro lugar de memória, conduz seus encarcerados de acordo com
um conjunto de determinações estabelecidas para a transmissão da disciplina e
controle. Porém, o ambiente prisional que atua na busca da padronização subjetiva
está fundamentado em contradições e de correlações de forças que dão espaço a
resistência. Configurando, assim, não apenas a preservação da memória do espaço
instituído, como também a produção de arranjos, ou melhor, uma modalidade de
memória em termos de possíveis dobras que se impõe ao poder desta instituição.
Palavras-chave: Prisão. Instituição. Memória. Subjetividade. Resistência.
1 INTRODUÇÃO
A instituição prisão, como qualquer outra, apresenta como característica
principal a condição de reprodução, logo, as ações que se desenvolvem neste
cenário concernem a dinâmicas e padrões repetitivos, que se constituem para seus
atores como hábitos. A questão central desse espaço social é a legitimidade, e para
que isso aconteça é necessária uma incessante reprodução das práticas sociais,
1
Mestrando em Memória Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, RJ, Brasil. Pesquisador voluntário do projeto A construção da Memória Social da Educação
Prisional do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: jmobraz@yahoo.com.br
2
Mestranda em Memória Social pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro, Rio de
Janeiro, RJ, Brasil. Bolsista do CNPq. E-mail: nanda_fsc@hotmail.com
3
Doutor e Mestre em Psicologia pela Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Professor
do Programa de Pós-Graduação em Memória Social da Universidade Federal do Estado do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. Bolsista Produtividade PQ 2. Pesquisador da FAPERJ E-mail:
frfarias@uol.com.br
2
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.13, n.1, p.01-20 Jan-Abr. 2016
que são transmitidas permanentemente aos sujeitos encarcerados neste luga r.
Diante disso, surgem algumas questões: Quais são as memórias que são
referências da prisão? Quais atores fazem parte deste espaço? Como se realiza o
processo de subjetivação diante da memória que se constrói no universo prisional?
Existem fronteiras entre a instituição prisão e os aprisionados? Até em quais
circunstâncias a prisão reitera memórias que são construídas pelos encarcerados?
Nesse sentido, alude-se que qualquer instituição, longe de ser um fenômeno
individual, é construída para e por atores sociais. Isso significa dizer, que a mesma
surge como resposta a diferentes demandas e problemas da sociedade. Seguindo
esta lógica para que uma instituição se mantenha e se reproduza ela necessita de
uma memória convergente a ela.
A prisão, bem como outras instituições, apresenta mecanismos de controle
social que estabelecem regras e normas de conduta que garantam o seu
funcionamento e a operação de suas ações reprodutoras. Por isso, o estudo sobre
esta realidade é enriquecido pelo aporte teórico da memória social, uma vez que a
instituição reitera constantemente protocolos que deverão ser repetidos,
transformando-se em hábitos sob o suporte da memória. A instituição luta pela
preservação da sua legitimidade e regularidade.
Isto não significa dizer que a instituição não traz consigo mudanças. A história
está sendo constantemente reescrita, e sempre com as interferências do passado.
No caso da prisão não seria diferente, pois a mesma, ao longo do tempo, sofreu
diversas transformações, até assumir a forma que hoje é conhecida. A Prisão é uma
instituição social de grande complexidade que encerra diferentes modalidades de
saberes, de modo que, qualquer abordagem considerando uma de suas
singularidades, produz um conhecimento parcial e, muitas vezes, distorcido da
realidade.
Sendo assim, esta instituição corresponde a uma condensação de diferentes
camadas de ações sociais, razão pela qual é objeto de uma análise crítica. Isso
significa dizer que qualquer alusão ao sistema prisional deve considerar o tópico em
foco, quem o está abordando e de qual lugar é feita a interpretação.
Historicamente aqueles que incomodam eram e ainda são inevitavelmente
segregados do contexto social. Inicialmente a prisão não era um espaço para se
cumprir uma pena ou lugar de aplicação de um castigo: era utilizada para acautelar

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