Avaliação dos mecanismos de aprendizagem tecnológica de empresas de pequeno porte no aranjo produtivo local vestuarista de Santa Catarina

AutorBruna Melo Santos - Silvio Antonio Ferraz Cario - Ricardo Lopes Fernandes
CargoEconomista pela Universidade Federal de Santa Catarina. - Professor dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Ciências Econômicas e de Ciências da Administração da Universidade Federal de Santa Catarina. - Mestre em Economia pela Universidade Federal de Santa Catarina
Páginas29-59

Page 29

Bruna Melo Santos1

Silvio Antonio Ferraz Cario2

Ricardo Lopes Fernandes3

Page 30

1. Introdução

As inovações constituem um instrumento importante utilizado pelas empresas no jogo concorrencial de mercado. No seu contexto, gera mudança no estado das artes do processo produtivo, possibilitando ganhos que se manifestam de diferentes formas, tais como: melhor qualidade dos produtos, maior quantidade produzida, redução de custos operacionais, elevação da participação empresarial no mercado, etc. Nesta perspectiva, as empresas realizam esforços voltados para a construção de capacitação inovativa, criando para tanto, condições internas e externas às suas esferas. Tais esforços iguram em criar infraestrutura tecnológica – laboratórios, equipamentos, técnicos –, destinar recursos permanentes para pesquisa e desenvolvimento (P&D), manter relações externas com clientes, fornecedores, universidades e institutos de pesquisa, entre outros.

Estas possibilidades estão abertas a todos os setores produtivos, do tradicional ao dinâmico. Porém, as condições para tal ocorrência variam dadas as características da tecnologia, estrutura institucional de apoio, condições econômicas das empresas, valores sócioculturais empresariais, etc. No setor têxtilvestuário, o subsegmento vestuário se caracteriza pelo valor baixo de investimento requerido, acesso fácil à tecnologia, conhecimento difundido, facilidade na operacionalização produtiva, entre outros aspectos. Conhecer a dinâmica inovativa deste subsegmento é o propósito deste estudo, considerando que, apesar de ser um setor tradicional, portador de padrão tecnológico maduro, as inovações de produto, processo e organizacional são requeridas para atender as exigências das coleções de produtos que adentram, anualmente, o mercado.

Neste sentido, o presente estudo tem como objetivo veriicar a dinâmica dos processos inovativos de empresas de pequeno porte, micro e pequenas empresas (PMEs) situadas no arranjo produtivo local (APL) vestuarista da cidade de Brusque, considerada o berço da indústria têxtilvestuário do estado de Santa Catarina. Assim sendo, o texto está dividido em 5 seções. Nesta 1ª. seção temse a introdução; na 2ª. seção, discutese o tratamento teóricoanalítico sobre aglomerações produtivas e processo inovativo; na 3ª. seção, apresentamse algumas características das empresas selecionadas; na 4ª. seção analisase a dinâmica dos processos inovativos nas empresas selecionadas; e por im, na 5ª. seção realizase a conclusão.

Page 31

2. Elementos centrais do tratamento teóricoanalitico sobre aglomerações produtivas e processo inovativo

Nos últimos anos, dentro da economia industrial emergiu com grande força a análise de aglomerações industriais em determinadas regiões geográicas. Ainda que grande parte destes estudos não tenha mais de 30 anos, a gênese de tal análise é imputada a Alfred Marshall, já no inal do século XIX. Entretanto, esta linha de pesquisa na economia industrial icou dormente durante os anos em que o modelo fordista dominou o cenário produtivo ao redor do planeta. Com a decadência do fordismo, voltaram à cena as discussões teóricas acerca dos aglomerados industriais denominados por Marshall de distritos industriais (NADVI; SCHMITZ, 1994).

Alfred Marshall é apontado por diversos autores como o primeiro autor a investigar a dinâmica econômica dentro dos aglomerados industriais, veriicando suas características, vantagens e processos de formação. Segundo Nadvi e Schmitz (1994), Marshall avaliou principalmente os aglomerados industriais que se formaram em países proeminentes da primeira revolução industrial, como Inglaterra e Alemanha. De acordo com Marshall (1982), os principais fatores que interferiam na instalação das empresas, naquele período, eram fatores físicos, como os recursos naturais de clima e solo; a existência de insumos e fornecedores nas proximidades; facilidades de escoamento da produção; dinâmico comércio; ativas ações políticas e sociais, entre outras.

Todavia, após a instalação destas empresas em uma mesma localidade, eram desenvolvidas outras vantagens da aglomeração. Conforme Marshall (1982) ao longo do tempo, quando alguma atividade se dissemina entre os habitantes de uma localidade, a arte de produzir enraízase e é passada de geração para geração, e com isto o conhecimento é transmitido, permitindo o surgimento de uma concentração industrial altamente especializada na produção de determinado artigo. Neste contexto, formase um estoque de mãodeobra especializado para o desenvolvimento daquela atividade, cujos trabalhadores, muitas vezes, são os que não somente motivam a instalação das empresas em determinadas localidades, como são motivação suiciente para fazer com que as empresas permaneçam ali instaladas.

Page 32

Neste sentido, Marshall apresenta o signiicado de economias de aglomeração. Estas decorrem das presenças de empresas de pequeno porte, atuantes em um mesmo setor e em setores correlatos, e de empresas fornecedoras de insumos, matériasprimas, máquinas e equipamentos e em atividades de organização e comercialização, concentradas geograicamente. Tais empresas, no exercício de suas funções, promovem maior divisão do trabalho, melhor fornecimento de matériasprimas e equipamentos e maior organização do comércio e economia de material. Diante destes agentes e tarefas, o distrito alcança a eiciência produtiva e organizacional, o que se traduz por vantagem competitiva local (MARSHALL,1982).

Nos dias atuais, a visão italiana de distrito industrial difere da visão marshaliana tradicional pelo fato de tratar as empresas segundo nível elevado de intercâmbio com clientes, fornecedores, bem como de promover a cooperação entre competidores visando à estabilização de seus mercados e o compartilhamento de riscos e inovações (MARKUSEN, 1995). Desta forma, sob a perspectiva de Marshall, é ressaltado apenas o benefício das economias externas, via complementaridade produtiva e trabalho especializado, no interior dos distritos industriais. Em contrapartida, a principal colaboração da análise italiana sobre os distritos industriais é o relacionamento entre os diversos atores econômicos, sociais e políticos, tais como, características sócioculturais, capacitação social, produção lexível, provisão de serviços reais e de competiçãocooperação entre os mesmos.

O distrito industrial passou a ser entendido como um espaço territorialmente delimitado onde ocorrem várias interações produtivas, econômicas e sociais. O estudo destes distritos industriais pode ampliar o entendimento acerca dos sistemas econômicosocialpoliticoinstitucional e de um ambiente tecnológico e organizativo das empresas, cujas características estão expressas no Quadro 1.

Desta maneira, os distritos industriais não se coniguram apenas pelo fato de estarem agrupados, localmente, em um determinado espaço geográico. As empresas de um distrito estão organizadas por alguns princípios. Existem vários princípios organizativos, cujo mais importante é a formação sólida de redes de empresas, onde por meio de especialização e das relações de subcontratação, empresas realizam, entre si, divisão de tarefas e ou de etapas do processo produtivo. Nestes termos, a subcontratação de empresas para a realização de tarefas contribui para a promoção da capacidade coletiva.

Page 33

No Brasil, outro marco analítico a respeito do desenvolvimento dos aglomerados produtivos irmase sob a designação de Arranjos Produtivos Locais (APLs). Estes se referem, segundo Vargas (2002), a aglomerados de agentes econômicos, políticos e sociais, localizados em um mesmo território, operando em atividades correlacionadas. Existem vínculos de articulação, interação, cooperação e aprendizado entre agentes, porém não chegam a ser signiicativos ao ponto do grau de articulação apontar a existência de uma etapa superior de organização posta como um Sistema Produtivo e Inovativo (SPIs), cujas características apontadas são relevantes (CASSIOLATO e SZAPIRO, 2002).

Concentração geográica e setorial em torno da cadeia produtiva principal cuja proximidade entre as empresas favorece a difusão de ideias, a inovação técnica, o estímulo à colaboração que aceleram as operações industriais. Predominância de pequenas e médias empresas concentradas num espaço limitado com organização econômica e social eicaz.

Presença de encadeamentos “para frente” e “para trás”, feitas por meio dos elos entre as empresas fornecedoras de matériasprimas, maquinas e equipamentos, à empresa principal transformadora de produto inal e desta para o consumidor através de varejistas, atacadistas, representantes e agentes etc. Considerável especialização em nível local, causada pela presença marcante de uma indústria que liga em um conjunto vários setores relacionados ao produto local.

Considerável especialização da produção em nível da empresa, que limita o campo da atividade, estimula a acumulação de conhecimento especíico e facilita a introdução de novas tecnologias.

A produção do sistema produtivo local é importante na participação da produção estadual, e algumas vezes, se destaca nos níveis nacional e internacional. Presença de alto nível de divisão do trabalho entre as irmas em face da desconcentração e fracionamento de atividades devido à desintegração vertical, que ocorre no interior das grandes irmas, além do surgimento de novas irmas com funções especíicas no sistema produtivo local.

Existência de uma identidade sóciocultural entre os autores que facilita a coniança nas relações de empresas e trabalhadores, bem como contribui para a cooperação entre seus integrantes possibilitando aumentar a densidade de transações. Existência de um eiciente sistema de transmissão de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT