O lugar do social enfraquecido: 7ª etapa do programa de recuperação do centro histórico de Salvador

AutorLaila Nazem Mourad - Nelson Baltrusis
CargoDoutora do Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social da Universidade Católica do Salvador, UCSAL, Salvador, BA, Brasil. E-mail: mourad.laila7@gmail.com - Doutor colaborador do Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social da Universidade Católica do Salvador, UCSAL, Salvador,...
Páginas89-107
Cadernos do CEAS, Salvador, n. 236, p. 88-107, 2016
O LUGAR DO SOCIAL ENFRAQUECIDO: 7ª ETAPA DO PROGRAMA
DE RECUPERAÇÃO DO CENTRO HISTÓRICO DE SALVADOR
The social thinning place: 7th step Recovery Program Historical Center of Salvador
Laila Nazem Mourad
Nelson Baltrusis
Resumo
Este artigo tem como objetivo entender as formas de poder exercidas pelo Estado na do
Programa de Recuperação do Centro Histórico de Salvador. As discussões teóricas articulam
diálogos entre Michel de Certeau, Michel Foucault e Raquel Rolnik entre outros atores. Para
essa tarefa dividimos esse texto em 5 partes. Na primeira, faremos uma breve introdução
sobre requalificação em áreas centrais, caracterizada por processos de gentrificação. Na
segunda parte, analisamos as formas de poder exercidas pelo Estado na 7ª Etapa do Programa
de Recuperação do Centro Histórico do Salvador-CHS. Em seguida, observaremos a filtragem
social realizada através da deportação de 1202 famílias do CHS. Na quarta, estudamos o
Direito Reconhecido, porém Controlado as ações contra-hegemônicas da Associação de
Moradores e Amigos do Centro Histórico AMACH aos processos de requalificação
excludente do CHS. O reconhecimento, em 2005, do direito de permanência e inclusão de 105
moradores no projeto da 7ª Etapa, se fez através de atitudes dúbias incluindo a população
mais pobre e promovendo áreas de exclusividade social a distribuição dos pobres no
território distanciou-os das áreas mais valorizadas. Soma-se a isso a opção política do Estado
de inaugurar as primeiras 27 unidades do Programa de Habitação para os Servidores
Estaduais, uma única categoria de servidores públicos os po liciais militares, desfazendo
nesse ato todo o discurso de mistura social. Esse acontecimento modifica as relações locais,
aliado ao controle das práticas cotidianas e a retração do comércio de proximidade e a saída
dos comércios pitorescos que antes consolidavam a vida do bairro essas mudanças podem
conduzir ao enfraquecimento do lugar social. Contribuindo assim, para facilitar e ampliar o
processo de ressignificação do patrimônio urbano e a expulsão da população mais pobre.
Palavras-chave: Centro Histórico. Práticas Cotidianas. Micropolíticas. Gentrificação. Filtragem
Social.
INTRODUÇÃO
O processo de Requalificação do Centro Histórico de Salvador foi pensado e
executado de acordo com um tipo de urbanismo excludente, que privilegia as intervenções
cenários voltadas ao turismo em contraposição à manutenção dos moradores tradicionais. De
acordo com essa lógica, Arantes (2000) destaca que o uso da imagem e da cultura tem sido
Doutora do Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social da
Universidade Católica do Salvador, UCSAL, Salvador, BA, Brasil. E-mail: mourad.laila7@gmail.com
 Doutor colaborador do Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social da
Universidade Católica do Salvador, UCSAL, Salvador, BA, Brasil. E-mail: nbaltrusis@hotmail.com
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Cadernos do CEAS, Salvador, n. 236, p. 88-107, 2016
um elemento central nos projetos de renovação, que se utiliza de uma arquitetura-espetáculo
para recriar cenários.
Vários autores, como Arantes (2000), Maricato (2000), Mourad (2011), Rolnik (2005),
Silva (2006), Fernandes (2006), José (2007), Vainer (2002), entre outros, alertam que a esse tipo de
intervenção, sobretudo nas grandes cidades, tem sido caracterizado por processos de gentrificação,
marcados pela atração de novos tipos de atividades e de novos moradores, reinvestimento
econômico, mudança de significado e imagem das áreas centrais. O discurso que prega a
revitalização, reabilitação, revalorização, reciclagem, requalificação, entre outros encobre de
fato os processos de higienização social e expulsão da população pobre, ampliando dessa
forma as desigualdades socioespaciais em nossas cidades.
Para Fernandes,
As políticas de requalificação de centros urbanos no Brasil a partir dos anos 90 do
século passado [...] foram guiadas em grande parte por uma lógica neoliberal,
onde a questão da competição entre cidades no mercado internacional da produção
e da urbanidade desempenha um papel fundamental. Em geral, essas políticas se
ancoram na execução ou a tentativa de implementação de políticas e programas
para as áreas centrais fundadas na ‘reconquista’
1
dos centros pelo capital
corporativo e especulativo, pela gentrificação social e pela construção de
horizontes simbólicos banalizados e midiáticos (FERNANDES, 2008, p. 31).
Para o geógrafo César Ricardo Simoni Santos, os processos de “renovação urbana, os
projetos de revitalização dos centros e a gentrificação serão as formas através das quais
espaços urbanos, previamente capitalistas, serão reinseridos numa nova dinâmica de
acumulação”. Ele ressalta que a experiência da reprodução capitalista no Brasil demorou a
conhecer os processos de gentrificação como mecanismos altamente rentáveis e que é
somente na década de 1990 que a gentrificação surge como poderosa força de transformação
do espaço e responde às expectativas de realização de lucros no setor imobiliário (SANTOS,
2011, p. 2-39).
Este processo
[...] envolve um novo ciclo que se remete diretamente ao espaço urbano
enquanto materialidade das infraestruturas produtivas e de circulação do
capital [...] Essa lógica se constitui a partir de processos de valorização-
desvalorização-valorização, decorrente da construção-obsolescência-
reconstrução de infraestruturas espaciais para a circulação capitalista. Na
perspectiva de atrair capitais a partir de seu potencial de valorização, as
cidades são reestruturadas e produzidas (“revitalizadas”). Dessa forma,
1
O termo reconquista é de Neil Smith, e foi introduzido no texto The new urban frontier: gentrification and the
revanchist city. Nova York, Routledge, 1996.

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