Liminares em Procedimentos Especiais. Parte II: Embargos de Terceiro, Apreensão e Depósito, Busca e Apreensão (DL 911/69), e Mandado de Segurança

AutorLeandro Vieira
CargoBacharel em Direito com habilitação em Direito Empresarial e Ambiental, especialista pósgraduado em Direito Processual Civil. Advogado militante em Blumenau-SC.
Páginas5-9

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Resumo (da segunda parte)

Dando continuidade ao estudo das "liminares em procedimentos especiais", apresentamos ao leitor um resumo dos requisitos necessários à obtenção de liminar nos dois últimos procedimentos especiais codificados (embargos de terceiro e ações de apreensão e depósito), e também damos início à apresentação dos procedimentos especiais extravagantes através da ação de busca e apreensão (DL 911/69) e do mandado de segurança.

A numeração dos tópicos retoma a seqüência da primeira parte do ensaio.

2.4. Requisitos para concessão de liminar nos embargos de terceiro

Os embargos de terceiro também se inserem no rol de procedimentos especiais que admitem concessão de tutela urgencial (liminar).

Remédio jurídico que segundo alguns deveria fazer parte do rol das ações possessórias1, os embargos de terceiro visam à proteção daquele que não sendo parte num processo vier a sofrer turbação ou esbulho na posse de seus bens em decorrência de constrição judicial (penhora, arresto, seqüestro, arrecadação etc.), conforme dispõe o art. 1.046 do CPC.

O deferimento liminar dessa proteção está condicionado ao preenchimento de três requisitos específicos: (1) a prova sumária da posse do embargante, (2) sua qualidade de terceiro, e (3) a prestação de caução para garantia da medida (CPC, 1.050, caput c.c. 1.051, fine).

Para alcançar o conceito de "prova sumária" da posse, é inevitável relembrar o conceito de "posse" referido na Parte I deste ensaio (edição anterior), qual seja o "exercício de fato de algum dos atributos da propriedade".

Conseguindo o autor produzir prova perfunctória (superficial) da posse que exerce (ou exercia até a constrição) sobre a coisa constrita por ordem judicial, seja por documentos ou por testemunhas, ser-lhe-á possível o deferimento da tutela urgencial2 . Prova perfunctória, como se sabe, não é a baseada em cognição plena-exauriente - que se alcançará somente após a ampla instrução do feito - mas a que amealhe condições mínimas de convencimento do alegado pelo autor.

Respalda nossa conclusão o escólio de Rizzato Lara, afirmando que "os embargos de terceiro podem ser deferidos liminarmente, desde que a posse e a qualidade de terceiro do embargante (arts. 1.050 e 1.051 do CPC) estejam suficientemente comprovadas. A prova acerca da posse é sumária, ou seja, não há necessidade de ser plena ou completa bastando apenas a plausibilidade3".

Rizzato Lara não mencionada a caução como pressuposto essencial, certamente por vislumbrar a possibilidade de depósito em juízo do bem litigioso. Mas para recuperação às mãos do embargante, a caução é obrigatória.

Sobre a superficialidade dessa prova, da mesma forma leciona o abalizado Hamilton de Moraes e Barros:

"Diz o art. 1.051 que o juiz deferirá, liminarmente, os embargos se julgar suficientemente provada a posse do embargante. A prova de que se cogita neste art. 1.050 é tão-somente uma prova informatória. Não é necessário que já seja plena, completa, afastando quaisquer dúvidas e já produzindo certeza. Uma prova assim, dessa natureza e desse poder de convencimento, somente é de exigir para a sentença final de julgamento dos embargos4".

Especificamente em relação à produção dessa prova "sumária", é importante destacar que, dada a autonomia do procedimento de embargos de terceiro, o autor deverá fazê-la documentalmente, no que for possível, com a inicial (inclusive título de propriedade, se tiver, pois o procedimento admite embargos de senhor e possuidor - CPC 1.046 § 1º), bem como apresentar initio littis o rol de testemunhas, porque o juiz poderá valer-se de audiência preliminar para obter mais elementos de cognição (CPC 1.050 § 1º). A oportunidade do autor produzir prova documental e depositar o rol testemunhal, gize-se, é a inicial. Não exercido tal direito, restará precluso, prejudicando, data venia, a concessão da liminar.

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A qualidade de terceiro do embargante é aspecto que admite facilidade na reprodução da prova. Basta-lhe juntar fotocópia integral dos autos de onde se emanou a ordem de constrição, ou certidão do distribuidor oficial, para documentalmente se provar sua condição de terceiro, isto é, a circunstância de não fazer parte do processo donde emanou a constrição dita ilegal. Aliás, quanto a esse tópico, a prova documental não pode ser substituída pela testemunhal, pois a sua não-participação no processo de origem é pressuposto material objetivo.

O último dos requisitos intrínsecos para a concessão da liminar nos embargos de terceiro é, como se consignou, a caução.

Incluímos a caução como requisito intrínseco da concessão de tutela urgencial em sede de embargos de terceiro porque, conquanto a lei não o faça, a sua ausência importaria a não-entrega do bem litigioso para o embargante. Explica-se. É que o art. 1.051, fine, preceitua que o embargante "só receberá os bens depois de prestar caução". Referindose aos bens objetos da recuperação liminar obviamente o intuito do embargante será reempossar-se deles, "recebendo-os", e tal providência só será permitida mediante a prestação de caução.

Em suma, embora não seja pressuposto para deferimento da liminar, a prestação de caução é erigida pela lei processual civil como indispensável à restituição dos bens às mãos do embargante. Se não prestá-la, o bem objeto dos embargos deverá permanecer sob depósito judicial (CPC, 148) ou, na sua ausência, em pessoa eleita sob a confiança do juiz. Mas não com o embargante.

Na mesma linha de raciocínio, o preclaro Sérgio Sahione Fadel endossa nosso posicionamento:

"A prestação de caução, no caso de deferimento liminar dos embargos, é obrigatória. O juiz pode deferir a medida, sem a prévia prestação da caução. Mas a entrega dos bens ao promovente da medida depende da garantia, oferecida e prestada5".

Por tais motivos, e sendo óbvio o intuito do embargante reempossar-se concretamente sobre os bens constritados, é que reputamos a caução pressuposto subjetivo da concessão da tutela urgencial6.

A falta de caução, frise-se bem, não prejudica o deferimento da liminar e muito menos o próprio procedimento (até porque se o embargante não dispuser de outros bens, não poderia a lei lhe vedar o socorro jurisdicional)7, mas é indispensável para o recebimento dos bens pelo embargante.

2.5. Requisitos para concessão de liminar na ação de apreensão e depósito e na busca e apreensão

Trataremos agora sobre o último procedimento especial codificado que admite a concessão de liminar: a ação de apreensão em depósito decorrente de venda a crédito com reserva de domínio (CPC, 1.071).

Dada a similitude desse procedimento com o extravagante procedimento da busca e apreensão de bem alienado fiduciariamente (DL, 911), traçaremos um paralelo entre ambos, abordando suas semelhanças e diferenças no que diz respeito aos pressupostos intrínsecos para concessão de liminar.

A compra e venda é espécie de contrato sinalagmático pelo qual transfere-se a propriedade de determinada coisa (bem ou direito), mediante o pagamento de preço previamente ajustado. O pagamento desse "preço", entretanto, pode ocorrer tanto à vista como a prazo, e o pagamento a prazo, como se sabe, sujeita o vendedor ao risco de não recebê-lo (inadimplência do devedor).

Entre particulares tal risco é minimizado, mas quando se trata de movimentações constantes de capital urge a necessidade de se "garantir" o pacto com providências paralelas, capazes de mitigar eventual inadimplemento indesejado e assim amenizar a taxa de juros praticada (em função do risco).

Foi, então, que no período do regime militar as instituições financeiras tiveram a brilhante idéia de entregar aos ministros da Marinha de Guerra, do Exército e da Aeronáutica Militar, a idéia de com base em suas atribuições instituírem o Decreto-Lei 911/69 que, além de alterar o art. 66 da Lei de Mercado de Capitais, trouxe em seu bojo a possibilidade de recuperação "liminar" do bem alienado fiduciariamente para garantia de contrato de compra e venda.

De acordo com o art. 3º do referido decreto, uma vez inadimplido o contrato é constituído em mora o devedor, "será" concedida liminar de busca e apreensão do bem (note-se o efeito cogente da norma).

Os pressupostos intrínsecos para concessão da liminar são, portanto, (1) a comprovação do vínculo jurídico entre as partes (existência do contrato), e (2) o seu inadimplemento, comprovado pela mora do devedor, a ser demonstrada mediante protesto do título ou notificação regular dele8 .

A comprovação desses pressupostos é, como se evidencia, obrigatoriamente documental. Na sua ausência, indefere-se a liminar.

Há os que sustentam a não-recepção do DL 911/69 pela Carta Política de 19889, sob o argumento de que a concessão de liminar desrespeita o princípio constitucional do...

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