A liberdade que oprime e a lei que liberta: a democratização da negociação coletiva brasileira

AutorThalyta Silvestre Silva Rabelo
Páginas71-77

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1. Introdução

"Entre os fortes e fracos, entre ricos e pobres, entre senhor e servo é a liberdade que oprime e a lei que liberta" (Lacordaire, 1848) é com esta reflexão considerada por muitos como fundamento contemporâneo do Direito Trabalhista, que analisaremos tal proposta de alteração normativa.

Este artigo versa sobre o anteprojeto de lei denominado Acordo Coletivo especial ou Acordo Coletivo com propósito específico - ACE proposta de alteração legislativa apresentada pelo sindicato dos metalúrgicos do ABC Paulista apresentada em 2011 ao Poder Executivo Federal. Esta proposta tem como objetivo inserir os Comitês Sindicais de Empresa na estrutura de representação dos trabalhadores brasileiros, democratizando as relações de trabalho. Neste projeto eles poderiam efetuar negociações coletivas, tendo como único limite os direitos trabalhistas previstos no texto constitucional.

O surgimento desse projeto se deu durante a transição do governo de Luís Inácio Lula da Silva para o governo de Dilma Vanna Rousseff ainda sobre o reflexo da crise econômica de 2008, ainda sim o Brasil obteve um crescimento no número de empregos formais.

Nesse contexto, o sindicato dos metalúrgicos do ABC paulista entrega uma proposta de anteprojeto de lei intitulado de Acordo Coletivo com propósito específico ou Acordo Coletivo especial utilizando como justificativa o argumento da necessidade de modificação da legislação trabalhista como reflexo da situação atual do país.

Dessa forma, foi criado um novo instrumento normativo, o Acordo Coletivo especial que possibilita que um sindicato profissional habilitado pelo Ministério do Trabalho e do Emprego e uma empresa do setor econômico correspondente estipulem condições específicas do trabalho.

Destarte que, nesta representação percebe-se a prevalência do negociado sobre o legislado, o que poderia causar o descumprimento e colisão com os direitos fundamentais trabalhistas.

Os defensores da proposta do anteprojeto utilizam-se do discurso da liberdade e da representação sindical no ambiente de trabalho como argumentação para sua aprovação.

Entretanto, percebe-se que o acordo coletivo com propósito específico representa na verdade, a quebra do

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princípio da proteção, já que propõe a desregulamentação dos direitos trabalhistas, representando um retrocesso nas relações trabalhistas.

Como se vê, a importância do tema de modo geral desse projeto é compreender e analisar o acordo cole-tivo especial ou com propósito específico, assim como visualizar o perigo da proposta analisada e fomentar discussões sobre o tema.

Este trabalho tem como objetivo geral analisar e realizar uma reflexão sobre a proposta de alteração legislativa. Tendo como objetivo específico a realização de um estudo sobre o Acordo Coletivo com propósito específico e seus reflexos no Direito do Trabalho. Para tanto, para desenvolvimento deste trabalho foram realizadas pesquisas bibliográficas e teóricas, além do uso de artigos de periódicos.

2. Análise da proposta

O sindicato dos metalúrgicos do ABC paulista apresentou uma proposta de anteprojeto de Lei que cria o denominado Acordo Coletivo com propósito específico que viabilizaria condições específicas de trabalho que seriam aplicáveis ao âmbito da empresa levando em consideração suas peculiaridades e a vontade de seus empregados.

Esta proposta ainda regulamenta os comitês sindicais de empresa - CSE e, ainda, confere aos sindicatos a autonomia de negociar sobre a legislação trabalhista, contribuindo para o incremento de um diálogo social.

De acordo com Viana (2011, p. 8.521):

Embora tenha raízes mais afastadas no tempo, a participação ganhou força ao fim dos anos 60, nos países centrais, não só como ideia, mas como prática, servindo também de célula para lutas coletivas. Cerca de dez anos depois, desembarcaria em nosso país, pelas mãos do "novo sindicalismo".

No governo de Fernando Henrique Cardoso houve tal proposta, mas ao contrário da atual, esta acrescentaria uma ressalva ao art. 7º da Constituição da República. Assim, após a frase "são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais" acrescentar-se-ia "salvo negociação coletiva".

Segundo os autores da nova proposta este quadro tem como objetivo buscar inovações como a realização de um Acordo Coletivo Especial com somente um sindicato profissional e uma empresa do respectivo setor econômico, desde que haja motivação específica que atenda às partes. Com argumento de que, a legislação atual não dá conta de resolver todos os conflitos e demandas, além de não alcançar as expectativas dos empregados e das empresas.

Além disso, essa proposta tinha como um de seus argumentos a valorização da negociação coletiva que passará a ser de forma democrática, criando o Acordo Coletivo com propósito específico ou Acordo Coletivo especial. Assim, um sindicato e uma empresa poderão estipular, com "segurança jurídica", condições de trabalho que serão aplicadas nas empresas e em suas relações.

Percebe-se que, há um processo global de mudanças que se baseiam em uma ideologia neoliberal que pressupõe o afastamento do Estado intervencionista, e dentre essa mudanças encontram-se as relações trabalhistas, buscando a flexibilização da legislação trabalhista. Trazendo um debate antigo, mas agora com a democratização da negociação coletiva.

Como resultado dessa flexibilização, segundo Viana (2014) nota-se o aumento do desemprego, do subemprego e da substituição dos contratos típicos pelos contratos atípicos. Como exemplos dessa flexibilização podemos citar: a redução do intervalo intrajornada (Portaria n. 42/2007) e recentemente a MP n. 680, convertida na Lei n. 13.189, de 2015 que institui o Programa de Proteção ao Emprego (PPE), que tem como um de seus objetivos auxiliar trabalhadores na preservação do emprego, além de flexibilizar a jornada de trabalho reduzindo em até 30% a jornada de trabalho e salário de todos os empregados ou de um setor específico da empresa.

Art. 5º O acordo coletivo de trabalho específico para adesão ao PPE, celebrado entre a empresa e o sindicato de trabalhadores representativo da categoria da atividade econômica preponderante da empresa, pode reduzir em até 30% (trinta por cento) a jornada e o salário.

Nesse sentido, é imprescindível a análise do tema, tendo em vista o impacto social e as mudanças que causam na sociedade.

3. Negociação coletiva

Segundo Cassar (2014) negociação é a forma de um dos interessados obter uma solução que atenda aos dois, buscando uma solução pacífica para resolver as questões. A negociação coletiva demonstra maturidade e desenvolvimento nas formas de composição de litígios.

A negociação coletiva compreende...

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