Lei n. 12.023/2009: A tutela jurídica dos trabalhadores avulsos fora do porto

AutorAlberto Emiliano de Oliveira Neto
CargoProcurador do Trabalho e Mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP
Páginas223-232

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Introdução

Trata-se de breve análise da tutela jurídica destinada aos trabalhadores avulsos fora da zona portuária. Popularmente conhecidos como "chapas", os movimentadores de carga de todo país, em grande número, concentram--se nas margens das rodovias ou grandes centros de abastecimento oferecendo sua força de trabalho em troca de uns poucos trocados. Destaca--se que número considerável se organiza por intermédio do sindicato profissional, cuja atribuição de representante da categoria é cumulada com a intermediação da contratação junto às empresas tomadoras.

Com a edição da Lei n. 12.023/2009, tais trabalhadores passaram a contar com a tutela de um estatuto jurídico específico, cuja redação trata da delimitação da atividade, dos direitos dos trabalhadores, bem como da responsabilidade dos envolvidos.

1. Trabalhador avulso

Estabelece o art. 3e da CLT o conceito de empregado como toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Dentre outros aspectos, a não eventualidade na prestação do serviço a determinado empregador constitui requisito indispensável ao conceito de empregado.

Diferentemente do trabalhador com vínculo empregatício, o trabalhador eventual caracteriza-se pela descontinuidade da prestação do trabalho, pela

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pluralidade de tomadores de serviços, pela curta duração do trabalho prestado e pela natureza do trabalho ser concernente a evento certo e distinto dos fins normais do empreendimento (DELGADO, 2002:291).

Semelhante ao trabalhador eventual, o trabalhador avulso também se caracteriza pela ausência de vínculo empregatício, a descontinuidade da prestação de serviços, a pluralidade de tomadores e a curta duração do trabalhado prestado. Como características específicas, entretanto, o trabalhador avulso apresenta a intermediação por determinada entidade1 e a igualdade de direitos em relação ao trabalhador com vínculo empregatício assegurada pela Constituição Federal de 1988:

Art. 7° (...)

XXXIV — igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício permanente e o trabalhador avulso;

A condição do trabalhador avulso é mais favorável em relação ao trabalhador eventual por conta de sua capacidade historicamente verificada de organização. Tais trabalhadores sempre se destacaram por sólida organização coletiva efetivada por entidade sindical representativa. Portanto, alcançaram direitos trabalhistas e previdenciários em função de negociação coletiva e de leis específicas (DELGADO, 2002:335).

Não obstante a equiparação assegurada pelo texto constitucional, o ordenamento jurídico já contava com dispositivos que asseguravam direitos próprios dos trabalhadores com vínculo empregatício aos trabalhadores avulsos. A esse respeito, cita-se o direito ao repouso semanal remunerado (Lei n. 605/1949), décimo terceiro salário (Decreto n. 63.912/1968), férias (Lei n. 5.085/1966), FGTS (Decreto n. 66.819/1970), Previdência Social (Decreto n. 68.451/1971), além do salário-maternidade assegurado à trabalhadora avulsa após a Constituição de 1988 (Lei n. 10.710/2003).

A ausência de vínculo empregatício acrescida da prestação de serviços a diversos empregadores foram adotados como critérios pelo legislador infraconstitucional ao conceituar trabalhador avulso. Estabelece o art. 12, VI, da Lei n. 8.212/1990 que trabalhador avulso é aquele que presta, a diversas empresas, sem vínculo empregatício, serviços de natureza urbana

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ou rural. É interessante observar que o Decreto n. 3.048/1999, que regulamenta a Lei n. 8.212/1990, estipula a intermediação obrigatória do órgão gestor de mão de obra para os trabalhadores avulsos dos portos, bem como do sindicato da categoria para as demais hipóteses de movimentadores de mercadoria avulsos (Decreto n. 3.048/1999, art. 9e, VI)2.

O vocábulo "diversas empresas" previsto na legislação previdenciária significa que o trabalhador avulso, ainda que inexistente vínculo empregatício, participa do processo produtivo de várias empresas tomadoras (Nascimento). A ausência de vínculo empregatício decorre da pluralidade de tomadores e da intermediação pelo sindicato profissional:

TRABALHADOR AVULSO. INEXISTÊNCIA DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO. O autor se vinculou ao Sindicato de Arrumadores e Movimentadores de Mercadoria em Geral de forma autônoma, prestando serviços a diversas empresas como chapa, ou seja, restou configurada a condição de trabalhador avulso, que obsta o reconhecimento da existência de vínculo empregatício (TRT 12, Processo n. 06129-2009-028-12-00-8, rel. Juiz Garibaldi T. P. Ferreira, publicado no TRTSC/DOE em 1e.2.2011.)

VÍNCULO DE EMPREGO. NÃO CONFIGURADO. TRABALHADOR AVULSO. Trabalhador formalmente arregimentado pelo sindicato para a prestação de trabalho avulso. Não demonstrada a presença dos requisitos do art. 3e da CLT. Decisão mantida. (TRT 4, Processo n. 00656-2008-102-04-00-7, de lavra da Exma. Desã Relatora Maria Inês Cunha Dornelles, publicado em 4.6.2009.)

VÍNCULO EMPREGATÍCIO. TRABALHADOR AVULSO. Hipótese em que restou descaracterizado o vínculo empregatício alegado, diante da prova dos autos no sentido de que o reclamante laborou na condição de trabalhador avulso, a mais de uma empresa no mesmo período, intermediado pelo sindicato agenciador dos serviços junto às tomadoras de mão de obra. Recurso ordinário das reclamadas provido. (TRT 4, Processo n. 00468-2007-028-04-00-2, publicado em 28.5.2009, de lavrada Exma. Desã Relatora Flávia Lorena Pacheco.)

Verifica-se nos portos a gênese do trabalho avulso. A atividade portuária, dotada de grande e variável fluxo de mercadorias, resultou em ambiente propício para a necessidade de contratação de trabalhadores por

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curtos períodos para prestar serviços a diversos tomadores. A movimentação de mercadorias...

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