Legitimidade

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Ocupação do AutorAdvogado. Juiz aposentado do TRT da 9.ª Região
Páginas104-132

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1. Legitimação ativa

De ordinário, no processo do trabalho encontra-se legalmente legitimado para promover a execução baseada em título judicial o credor, ou seja, aquele que, tendo figurado como autor no processo de conhecimento, porta, agora, um título judicial exequível. A partir dessa afirmação, podemos mesmo construir a regra segundo a qual, por princípio, há uma coincidência física entre o autor (no processo de conhecimento) e o credor (no processo de execução), motivo por que a única diversidade possível de aí existir é quanto à nomenclatura. Trata-se, essencialmente, contudo, da mesma pessoa.

Nem sempre, contudo, a emissão do título executivo será precedida de um processo de conhecimento. Assim dizemos porque a execução forçada poderá fundar-se em título extrajudicial, como ocorre em relação ao termo de conciliação e ao termo de ajustamento de conduta, de que fala o art. 876 da CLT.

A CLT, como sabemos, não atribui legitimidade apenas ao credor stricto sensu, para dar início à execução, mas, em sentido mais amplo, às partes (art. 878, caput). Devem ser considerados legitimados, por igual, as pessoas a que se refere o art. 778, do CPC. Em verdade, esta norma do processo civil cuida, na maior parte dos casos, de legitimação superveniente, que, embora seja algo raro na execução trabalhista, com ela é conciliável.

O juiz do trabalho somente poderá tomar a inciativa da execução quando as partes não estiverem representadas por advogados (CLT, art. 878).

Vejamos quais são essas pessoas apercebidas de legitimidade para promover a execução.

1.1. O Ministério Público

Estatuía o parágrafo único do art. 878 da CLT que, em se tratando de decisão proferida por Tribunal Regional, a execução poderia ser promovida pela Procuradoria da Justiça do Trabalho — entenda-se: Ministério Público do Trabalho. Esse preceptivo legal foi, contudo, revogado pela Lei n. 13.467/2017

Tratando-se de ação civil pública (Lei n. 7.347, de 24-7-1985), o Ministério Público do Trabalho estará legitimado para promover a execução da sentença se o autor não o fizer no prazo de sessenta dias após o trânsito em julgado (art. 15).

Se a ação civil pública for ajuizada pelo próprio Ministério Público do Trabalho (CF, art. 129, II; Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, art. 83, III), este, por mais forte razão, possuirá legitimidade para promover a execução da sentença.

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1.2. Espólio, herdeiros ou sucessores

Falecendo o empregado, o seu espólio, os seus herdeiros ou os seus sucessores poderão iniciar a execução ou nela prosseguir, conquanto não figurem no título exequendo (sentença, acórdão ou acordo inadimplido). O direito de exigir o cumprimento da obrigação não se extingue, portanto, com a morte do seu titular; tanto isso é certo que a lei outorga legitimidade para que outras pessoas possam agir em juízo, em nome do credor, com esse objetivo (CPC, art. 567, § 1.º, II). O requisito fundamental é o de que, em virtude da morte do credor, seja transmitido ao espólio, aos herdeiros ou aos sucessores o direito proveniente do título executivo.

Essa alteração subjetiva da ação de execução é medida necessária para que o conteúdo obrigacional do título seja integralmente satisfeito pelo devedor. O espólio será, aqui, representado pelo inventariante (CPC, art. 75, V).

Dentre os casos — infrequentes, como dissemos — de modificação subjetiva da lide executiva, aliás, a presença do espólio é a menos escassa; afinal, sendo a morte a única certeza da vida, teria sido no mínimo insensato o legislador se não concedesse ao espólio, aos herdeiros ou sucessores do credor legitimidade ativa para atuarem no processo de execução.

Deles exigir-se-á, como é elementar, unicamente a prova dessa qualidade.

Sobrevindo a morte do credor, o juiz — desde que o fato tenha chegado ao seu conhecimento — determinará a suspensão da execução (CPC, art. 921, I), até que se formalize a habilitação do espólio, dos herdeiros ou dos sucessores, conforme seja a hipótese. Essa habilitação incidente é realizada de maneira extremamente simples, na execução trabalhista, adotando-se como diretriz legal a Lei n. 6.858, de 24 de novembro de 1980, segundo a qual os valores devidos pelos empregadores aos empregados e não recebidos em vida pelos respectivos titulares, “serão pagos em quotas iguais, aos dependentes habilitados perante a Previdência Social” (art. 1.º, caput).

Caso se entenda que as disposições da Lei n. 6.858/1980 sejam aplicáveis, apenas, aos valores referentes ao FGTS, a habilitação será realizada na forma dos arts. 687 a 692, do CPC. Sendo assim, deverão ser juntadas aos autos a certidão de óbito do de cujus e a certidão de que o habilitante foi incluído, sem qualquer oposição, no inventário. Essa habilitação, despida de solenidades, independe de sentença, sendo, pois, admitida mediante simples despacho. O fato de a lei dispensar o proferimento de sentença não significa que o promovente da habilitação fique até mesmo eximido de requerê-la... A petição, nesse sentido, deverá, antes de mais nada, comunicar ao juiz a morte do credor, sem prejuízo da comprovação desse fato e da qualidade do habilitante.

Andou certo o legislador ao tratar, separadamente — embora no mesmo inciso —, o espólio, os herdeiros e os sucessores, pois no primeiro caso a herança ainda está indivisa, ao passo que nos dois últimos já foi partilhada.

Dessemelhança há, também, entre herdeiros e sucessores: enquanto os primeiros são sucessores causa mortis, por força de lei ou de disposição testamentária, os segundos podem suceder causa mortis, universal (herdeiro) ou singular (legatário), ou por ato inter vivos, em geral a título singular.

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Verificamos, dessa forma, que todo herdeiro é, automaticamente, sucessor, a despeito de nem todo sucessor ser herdeiro.

Proceder-se-á, também, à habilitação nos autos da execução (que, no processo do trabalho, são os mesmos do processo de conhecimento, nos quais se contém o título sentencial exequendo, exceto no caso do art. 625-E, parágrafo único, da CLT) se, em outra causa, sentença passada em julgado houver atribuído ao habilitante a qualidade de herdeiro ou sucessor. Além disso, prescindirá de sentença a habilitação sempre que, oferecidos os pertinentes artigos, a parte (devedor) reconhecer a “procedência” do pedido e não houver oposição de terceiro (inc. V).

1.3. Cessionários

O instituto jurídico da cessão de créditos está disciplinado pelos arts. 286 e seguintes do CC.

Impende, contudo, verificar se o processo trabalhista admite que a pretensão executiva seja exercida pelo cessionário, como se dá no processo civil — aqui por expressa previsão legal (art. 778, III).

Anotemos, antes, que o processo comum restringe a possibilidade de alteração subjetiva ativa à hipótese de cessão de direitos por ato inter vivos, considerando-a, por isso, um contrato entre as partes (cedente e cessionário), que manterá a sua eficácia mesmo depois da morte do primeiro.

Entendemos que, por princípio, nada impede ao empregado ceder a terceiro o seu crédito reconhecido por sentença transitada em julgado (ou que foi objeto de sentença homologatória), fazendo com que o cessionário fique legitimado a promover a execução ou nela prosseguir, conforme seja o momento em que a cessão ocorreu. É certo que se poderia objetar com o argumento de que, a prevalecer nossa opinião, restaria escoriada a competência constitucional da Justiça do Trabalho, pois no caso essa Justiça estaria apreciando um litígio entre quem não é empregado (cessionário) e o devedor (empregador). O argumento é, sem dúvida, ponderável; redargua-se, entretanto, em caráter proléptico, que a presença do cessionário, na execução, não elimina a pessoa do cedente-credor, sabendo-se que aquele figurará no processo em nome do substituído.

Sem embargo, malgrado o cessionário possua legitimidade para promover a execução, ou nela prosseguir, inexiste, quanto a ele, qualquer obrigação de assumir o lugar do cedente-credor; a espécie traduz, apenas, uma faculdade que lhe defere a lei. Caso o cessionário não deseje valer-se dessa faculdade, passará a atuar na execução como substituto processual do credor, de quem irá realizar a defesa do direito por força dessa legitimação ad processum. Com vistas a isso, deverá habilitar-se nos autos, mediante petição, fazendo desde logo prova da sua qualidade, assim como se exige do herdeiro ou do sucessor.

De qualquer forma, é conveniente observar que, na ação de embargos de terceiro, o embargante, de modo geral, não é parte na relação processual, vale dizer, não é trabalhador nem empregador — mas, a despeito disso, doutrina e jurisprudência concluíram, com acerto, pela competência da Justiça do Trabalho para apreciar esse tipo de ação incidental.

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Para que a cessão de crédito, efetuada pelo empregador-credor, tenha eficácia jurídica em relação ao devedor, este deverá ser cientificado, exceto se, por instrumento público ou particular, já houver manifestado ciência da cessão realizada (CC, art. 290).

A menos que haja estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor (CC, art. 296).

Em suma, embora a cessão de crédito possa ser admitida no processo de execução trabalhista, as disposições integrantes dos arts. 286 a 298 do CC, nas quais a matéria está regulada, devem ser amoldadas, adequadas ao procedimento trabalhista, a fim de que sejam respeitados os princípios medulares que o informam. É de lei, todavia, que a cessão de crédito...

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