O juiz das garantias

AutorRené Ariel Dotti
CargoJurista e professor emérito
Páginas258-258
258 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 663 I ABR/MAIO 2020
PONTO FINAL
René Ariel Dotti JURISTA E PROFESSOR EMÉRITO
O JUIZ DAS GARANTIAS
Écedo para avaliar. O que
se ouve, contudo, em
alto e bom som ou à boca
pequena, é que ao f‌im e
ao cabo o que restará da Lei
13.964, de 24 de dezembro de
2019, conhecida anteriormente
como pacote anticrime, será
somente a f‌igura do juiz das
garantias. Justamente o per-
sonagem mais combatido pelo
ministro Sergio Moro (Justiça
e Segurança Pública). É uma
entrada providencial. Con-
trapondo a tradição do ma-
gistrado singular, de primeira
instância, dono de decisão
solitária, eis o juiz das garan-
tias a abalar as estruturas e a
desaf‌inar o coro dos conten-
tes. A ele competirá resolver
questões no curso da investi-
gação quando se tratar de de-
cretação de prisão provisória
ou preventiva, relaxamento
de prisão ilegal, concessão de
f‌iança, autorização para inter-
ceptação telefônica e telemá-
tica, quebra de sigilo, busca e
apreensão domiciliar ou pes-
soal. Além disso, caberá a ele
amparar os direitos e as garan-
tias do indiciado ou preso em
preceitos constitucionais.
Oferecida a denúncia pelo
Ministério Público ou a queixa
pelo ofendido (crimes de ini-
ciativa privada), caberá tam-
bém ao juiz das garantias: (a)
receber ou rejeitar a acusação
liminar; (b) praticar os demais
atos previstos pelos artigos
406 a 411 do Código de Proces-
so Penal, que tratam especif‌i-
camente da acusação e da ins-
trução preliminar.
Ora, a discussão gira em tor-
no da independência judicial e
da imparcialidade do julgador.
Daí a necessidade de remover
o “critério monista”. Quando
o magistrado de primeira ins-
tância, o “solitário”, decreta a
prisão temporária ou preven-
tiva e toma outras medidas,
ele demonstra a sua convicção
pessoal sobre a responsabili-
dade criminal do destinatário
dessas imposições e atenta
contra o princípio da presun-
ção de inocência.
Para evitar que esse mesmo
magistrado decida questões
da investigação e também jul-
gue o mérito da imputação
– levando para o momento da
sentença a sua opinião sobre
o crime e seu autor – a nova
lei acresceu ao art. 3º do 
a letra b: “O juiz das garantias
é responsável pelo controle
da legalidade da investigação
criminal e pela salvaguarda
dos direitos individuais cuja
franquia tenha sido reservada
à autorização prévia do Poder
Judiciário, competindo-lhe es-
pecialmente: I – receber a co-
municação imediata da prisão;
II – receber o auto da prisão em
f‌lagrante para o controle da le-
galidade da prisão; III – zelar
pela observância dos direitos
do preso, podendo determinar
que este seja conduzido à sua
presença, a qualquer tempo;
IV – ser informado sobre a ins-
tauração de qualquer investi-
gação criminal; V – decidir so-
bre o requerimento de prisão
provisória ou outra medida
cautelar; VI – prorrogar a pri-
são provisória ou outra medi-
da cautelar, bem como substi-
tuí-las [...]”.
Além de se responsabili-
zar por todos os passos da
investigação criminal, o juiz
das garantias contribui de-
cisivamente para evitar que
os tribunais anulem proces-
sos já julgados por vícios an-
teriores à denúncia. É rele-
vante, portanto, a instituição
de tal f‌igura jurídica, aquela
que dá guarida aos direitos
fundamentais e que pode ser
convocada entre os milhares
de juízes do país, sem a neces-
sidade de ampliação do qua-
dro de servidores. Basta que
um magistrado da comarca
vizinha assuma esse papel.
Será ele o juiz das garantias
na primeira instância, res-
ponsável pela fase de investi-
gação. Ao juiz da instrução e
julgamento caberá analisar o
que foi coletado, ouvir teste-
munhas e decretar a senten-
ça, sem imiscuir-se de modo
pessoal nas engrenagens do
processo.n
Giovana Tows
Rev-Bonijuris__663.indb 258 17/03/2020 17:38:59

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