Human rights in contemporary society: neoliberalism and (post)modernity/Direitos humanos na sociedade contemporanea: neoliberalismo e (pos)modernidade.

AutorHoffmam, Fernando

Introducao

O presente artigo pretende investigar criticamente os direitos humanos, tendo em vista a racionalidade neoliberal reproduzida nas institucionalidades e praticas das sociedades (pos)modernas. A problematica reside no papel contraditorio dos direitos humanos vinculados a ideologia politico-economica neoliberal e resultantes do paradigma moderno-ocidental.

A hipotese investigada, portanto, indica existir um projeto de direitos humanos que reproduz o ideario do ocidente moderno-europeu atrelado ao expansionismo economico-neoliberal. Nesse cenario, entao, e que a categoria de direitos humanos despotencializa a sociabilidade enquanto espaco-tempo de producao de sentido, reproduzindo as aporias da modernidade.

Para tanto, se fez necessario investigar a relacao entre os direitos humanos e o projeto capitalista global, pois, longe de ocuparem lados opostos no cenario politico atual sao faces de uma mesma moeda.

A pesquisa tem por metodologia a abordagem teorica e a analise bibliografica, pois consiste na articulacao de criticas acerca do cenario (pos)moderno, das racionalidades neoliberais e do universalismo de direitos humanos. Nesse sentido, sao desafiados os conceitos em questao quando confrontados com a realidade correspondente. Sob o vies teorico desenvolvido, tambem, e considerada a problematica acerca da producao do saber racionalista e afirmacao das categorias modernas.

Logo, questiona-se nesse artigo a existencia de profundas afinidades entre as politicas neoliberais e as estrategias juridicas, conforme serao observadas algumas repercussoes do legado moderno e da agenda neoliberal dos direitos humanos. Diante disso, ainda, foi vislumbrada a possibilidade desses direitos serem retomados em oposicao a esse horizonte.

1 Os direitos humanos na sociedade de consumo: humanidades, direito ao gozo e o consumo dos direitos

A sociedade contemporanea surge alicercada nas bases do paradigma moderno, mas, no entanto, ruindo com as institucionalidades e praticas que nao mais lhe servem no projeto de uma sociabilidade fragil, apatica e anomica, no que tange a conteudistica humano-existencial. Os lugares de producao de sentido correm no sentido da flecha do tempo mercadologico, exercendo uma (des)continuidade do projeto humanoemancipatorio, pois, em certa medida exacerbam a emancipacao iniciada na modernidade, mas, por outro lado, esvaziam o sujeito (pseudo)emancipado em meio ao mercado fetichista, caracterizado pela descartabilidade.

O projeto social contemporaneo vem marcado profundamente pelas operacionalidades dessa outra/nova instituicao (1) chamada mercado, numa vertente apaziguadora dos sentidos e sentimentos de pertencimento a um espaco-tempo socialmente constituido. Por outro lado, a racionalidade discursiva neoliberal por meio dos referenciais eficiencia, produtividade e fluxo, notabiliza um acontecer social que oferece nao so produtos, como tambem, sentidos e projetos descartaveis na linha de producao de desejos opacos; apreende o homem numa totalidade assujeitadora de busca performatica pela realizacao dos projetos de vida; e insere o sujeito esvaziado numa caotica busca pelo gozo (2) no fluxo de desejos plastificados na mercadoria, signo totalitario da sociabilidade neoliberal(izada).

Nesse ponto, o projeto moderno de direitos humanos ja, insuficiente e contestado, conforme veremos no proximo topico, se insere num mercado de significacoes que ressignifica tudo que lhe deu sustentacao na modernidade. Da insuficiencia de um projeto que abarcava apenas o ocidente moderno-europeu--num primeiro momento--e, que alcanca seu apice "institucional" a partir das construcoes de um ocidente nao mais apenas europeu, mas norte-americano, passa-se a concepcao mercadologica e, de mercadorizacao dos direitos humanos.

Seguindo esse rumo, a concepcao dominante de direitos humanos oriunda das idealizacoes da modernidade fica a deriva em uma mundaneidade desconectada enquanto espaco social, assim como o individuo moderno encontra-se perdido num campo de tensoes entre cidadania e consumo que o atordoa e desilude; a razao moderna erguida sobre as bases da filosofia racionalista e do aparato tecnico-dogmatico encontra-se com uma racionalidade desconstrutora dos lacos sociais, ja frageis em um primeiro momento nao-comunitario; e o liberalismo, vertido em neoliberalismo potencializa o capitalismo moderno mercantil-industrial e o alca a uma condicao capitalistica de fluxo, deliberada pelas acoes do mercado na busca pela fluidez financeira (SUPIOT, 2007).

O homem-presente esta liberado de todas as suas limitacoes impostas pelo paradigma da modernidade que, numa visao contemporanea assujeitava o individuo moderno em meio a uma estrutura social hierarquizada. Nesse caminhar, os direitos humanos davam uma certa seguranca, mesmo que formal, a um desejo por igualdade que suplantava todo o acontecer social e, lhe dava uma potencialidade de garantia do que era mais importante na sociedade da epoca: contrato, propriedade privada e liberdade--economica. Mas o homem inconcluso da modernidade, agora esta desfeito, ou, liquefeito pela acao do mercado na conformacao de uma sociabilidade convertida em espaco mercadologico.

Funda-se uma nova ambientalidade social implicada numa concepcao de vida baseada nas vantagens a serem alcancadas no e pelo viver. Uma rede de relacoes humanas multifacetadas que materializa uma rede comercial de viveres desconectados da condicao humana e operados pela condicao do mercado. A virtude social soberana corresponde ao projeto de vida investido pelo corpo solitario do sujeito alienado hipermoderno, consubstanciando uma vida em velocidade e sem lacos sociais com o outro (BAUMAN, 2007). A vida seja na sua individualidade, ou, a vida social, seguem como uma sucessao--despretensiosa--de acontecimentos rumo a condicao de constante desfazimento dos vinculos e constructos sociais, numa logica de remodelacao da vida tanto individual, quanto social a cada instante presente que necessita do abandono dos projetos e desejos para organizar-se na visao caricaturada da vida do/no consumo (BAUMAN, 2008).

Nesse contexto historico-social ha para Birman (2012) um incentivo a um (a-) eu narcisico, que instaura novas subjetividades e um novo tipo de mal-estar--pos-moderno --que dilacera o sujeito contemporaneo a partir de uma ditadura da imagem e da espetacularizacao do cotidiano e das praticas sociais. As subjetividades contemporaneas narcisicas nao se preocupam com o outro, somente possibilitando a vida no eu autocentrado e egoista. Essa forma sociocultural narcisica mostra-se predatoria ao ser concebida como estrutura transcendente na miserabilidade do outro, pois institui-se um espaco-tempo que propoe a vivencia do gozo, as custas da condicao humana do outro (LEBRUN, 2008). As individualidades circunscritas em uma existencia opaca, reduzida ao gozo mercadologico e ao "outro eu", o "eu mercado" que despreza a experiencia mundana, descapacitam os sujeitos-sociais de viverem as relacoes humanas, passando a viver apenas relacoes de consumo, impossibilitando que se estabelecam lacos intersubjetivos alteritarios (BIRMAN, 2000) (3).

Disso resulta um "entodamento", os neo-sujeitos passam a ser dependentes da estrutura gregaria do rebanho, dependem de micro-outros para consolidarem-se enquanto sujeitos individuais, mas nao individualizados. Constroi-se uma coletividade perversa de sujeitos-eu individualistas que nao fundam os lacos sociais a partir da experiencia da negatividade do gozo, mas sim, fundam o laco social neles mesmos enquanto "sujeitos de/do/e para o gozo", nao havendo qualquer tipo de subtracao--de "nao gozar"--em prol do coletivo. O que ocorre, e "uma individuacao mais que uma individualizacao, uma maneira de exigir poder contar-se em um rebanho, mais que impor-se o trabalho de sair dele e de assim realizar-se como sujeito autonomo e singular" (LEBRUN, 2008).

Nesse rumo, o homem moderno-ocidental que funda uma ideia de direitos humanos homogenea-universal ja contestada, ve-se arrastado por uma logica destituinte do que lhe dava seguranca possibilitada pelas construcoes juridico-politico-sociais da modernidade. A humanidade como um todo que esta evidentemente para alem dos pressupostos moderno-europeus e norte-americanos, e, que assim, os dessacraliza em certa medida busca uma orientacao para alem da dominante, ou seja, se opoe ao paradigma neoliberal e o projeto (pos)moderno (BRAGATO, 2010).

O que se pretende a partir da abertura de novas possibilidades de orientacao para alem do individuo concebido na Europa burguesa, e admitir a existencia de outros mundos, de outros "eu" sugeridos por uma nova gramatica de pertencimento e acolhimento num plano de ressignificacao das alteridades perdidas. E a possibilidade do vir a fala do "outro" sufocado por uma institucionalidade totalitaria que modernamente concebeu o diferente como inferior e dominado. Busca-se o refazimento dos lacos sociais dos sujeitos esquecidos em uma modernidade apagada que destituiu o mundo dos direitos humanos de outras subjetividades humanas que nao a moderno-burguesa (DUSSEL, 1993).

No entanto, o que se ve e o surgimento do "homem-total", que sai a sociabilidade como uma totalidade perversa e pervertida que retroalimenta-se de si proprio num desesperado culto tiranico ao gozo e ao deus-mercado (DUFOUR, 2008), impulsionado pelo totalitarismo nao menos tiranico da velocidade que restringe o sujeito contemporaneo a possibilidade da urgencia. Esta vigente uma nova cartografia do sujeito, debilitada na condicao egoista de experienciar o mundo no rebanho egogregario em que a aparencia de liberdade leva o individuo ao consumo do proprio individuo--outro--na permanencia falaciosa da condicao de liberto (DUFOUR, 2008). Surge o que Melman (2003) denomina de uma nova economia psiquica, uma nova forma de viver em sociedade, de pensar, de se relacionar com o outro, de fazer parte das instituicoes sociais, como o casamento, a familia, etc. Nos dizeres de...

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