Habilitação, reabilitação e inclusão: o que os sujeitos surdos pensam do trabalho fonoaudiológico?

AutorVinícius Nascimentoa - Maria Cecília Moura
CargoDoutor e Mestre em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem (PUC-SP) e Bacharel em Fonoaudiologia (PUC-SP). Professor Adjunto do Departamento de Psicologia no curso de Bacharelado em Tradução e Interpretação em Libras e Língua Portuguesa da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). São Carlos, SP, Brasil - E-mail: nascimento_v@ufscar.br -...
Páginas201-219
Revista de Ciências Humanas, Florianópolis, v. 52, 2018, e49807
ISSN 2178-4582.
http://dx.doi.org/10.5007/2178-4582.2018.49807
Direito autoral e licença de uso: Este artigo está licenciado sob uma Licença Creative Commons.
Com essa licença você pode compartilhar, adaptar, para qualquer fim, desde que atribua a autoria da
obra, forneça um link para a licença, e indicar se foram feitas alterações.
Artigo Original
Acesso Aberto
Habilitação, reabilitação e inclusão: o que os sujeitos surdos pensam
do trabalho fonoaudiológico?
Habilitation, rehabilitation and inclusion: what is the Deaf perception
about speech therapy work?
Habilitación, rehabilitación e inclusión: ¿cuál es la percepción de los
sordos sobre el trabajo de la terapia del habla?
Vinícius Nascimentoa ; Maria Cecília Mourab
a Doutor e Mestre em Linguística Aplicada e Estudos d a Linguagem (PUC-SP) e Bacharel em Fonoaud iologia (PUC-SP). Professor
Adjunto do Departamento de Psicologia no curso de Bacharelado em Tradução e Interpretação em Libras e Língua Portuguesa da
Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). São Carlos, SP, Brasil - E-mail: nascimento_v@ufscar.br
b Doutora em Psicologia Social e Mestre em Distúrbios da Comunicação pela PUC-SP. Fonoaudióloga pela mesma instituição.
Professora da Faculdade de Ciências Humanas e da Saúde no Curso de Fonoaudiologia da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo. São Paulo, SP, Brasil - E-mail: alce55@uol.com.br
Resumo: Este trabalho analisa a representação que os sujeitos Surdos possuem do fonoaudiólogo e do trabalho na
reabilitação em diferentes abordagens utilizadas por estes profissionais. Foram entrevistados d ezesseis sujeitos Surdos
por meio de filmagem com câmera digital e suas entrevistas foram traduzidas, transcritas e analisadas posteriormente por
meio da proposta de Bardin (1977). Os resultados mostram que o fonoaudiólogo é visto pelos Surdos como aquele que
pode possibilitar o acesso à linguagem oral para que eles se comuniquem com ouvintes que não saibam Libras. O corpus
também mostra uma mudança política do Surdo frente a fala, visto q ue no discurso dos entrevistados a linguagem oral
aparece como uma necessidade para a comunicação com sujeitos ouvintes que não saibam língua de sinais e não mais
como uma imposição por parte da família.
Palavras-chave: Fonoaudiologia. Reabilitação. Surdos. Libras. Abordagem bilíngue.
Abstract: This paper analyzes the representation that Deaf individuals have about the speech therapists working in
rehabilitation and the different approaches used by these professionals. Sixtee n Deaf individuals were interviewed and
video recorded. The interviews were then translated, transcribed and later analyzed using Bardin proposal (1977). The
results show that the speech therapist is seen by the Deaf as one that can provide them access to the oral language so they
can communicate with hearing people who do not know Brazilian Sign Language (Libras). The corpus also show a change
in the policy of the Deaf towards speech, since in the interviewees' discourse, the oral language appears as a necessity for
communication with individuals who are hearing and don’t know sign language and not as an imposition made by the
family.
Keywords: Speech therapy. Rehabilitation. Deaf. Brazilian sign language. B ilingual approach.
Resumen: Este artículo analiza la representación que los individuos Sordos tienen sobre los terapeutas del habla que
trabajan en rehabilitación y los diferentes enfoques utilizados por estos profesionales. Dieciséis individuos Sordos fueron
entrevistados y grabados en video. Las entrevistas fueron luego traducidas, transcritas y entonces analizadas utilizando la
VINICIUS NASCIMENTO E MARIA CECÍLIA DE MOURA
2
propuesta de Bardin (1977). Los resultados muestran que los Sordos consideran que el terapeuta del habla puede
brindarles acceso a la lengua oral para que puedan comunicarse con personas oyentes que no conocen la Lengua de Señas
Brasileña (Libras). El corpus también muestra un cambio en la política de los Sordos hacia el habla, ya que en el discurso
de los entrevistados, el lenguaje oral aparece como una necesidad par a la comunicación con las personas que escuchan y
no saben el lenguaje de señas y no como una imposición hecha por la familia.
Palabras clave: Terapia del habla. Rehabilitación. Sordos. Lengua de señas brasileña. Enfoque bilingüe
INTRODUÇÃO
Atualmente, no Brasil, o fonoaudiólogo é o profissional habilitado para trabalhar com a surdez
e a deficiência auditiva do diagnóstico, que é feito em parceria com o médico otorrinolaringologista,
até reabilitação de indivíduos que as possuem, responsabilizando-se, dentre outros aspectos, pelo
acolhimento e orientação de pacientes e familiares. No caso do diagnóstico em crianças, o
fonoaudiólogo atua diretamente com os pais e/ou cuidadores visando, com isso, propiciar à criança a
aquisição de uma língua em que ela se inscreva como sujeito e tenha, então, um bom desenvolvimento
biopsicossocial.
No entanto, a surdez e a deficiência auditiva estiveram, durante algum tempo, sob a
responsabilidade da medicina, no que tange ao diagnóstico e intervenção, e da educação, no tange à
reabilitação, e só começou a deslocar-se destes campos desde o início da prática fonoaudiológica no
Brasil no final da década de 1950. Este deslocamento para o campo de trabalho do fonoaudiólogo se
deve a um conjunto de fatores históricos, acadêmicos e sociais que fizeram com que o diagnóstico, a
reabilitação e o acompanhamento do sujeito Surdo1 ficasse sob a responsabilidade deste profissional.
Nesse sentido, embora a fonoaudiologia seja uma área do conhecimento ligada ao campo da
saúde, ela mobiliza, do diagnóstico à inclusão social do surdo, diferentes aspectos e conceitos ligados
às Ciências Humanas e Sociais, haja vista que o processo educacional dos surdos também é orientado
e, na maioria das vezes, direcionado pelo fonoaudiólogo. Segundo Nascimento e Brait (2016), pela
necessidade de reconfigurar seu objeto, a fonoaudiologia passou a dialogar com outros campos, de
maneira especial, com uma certa Linguística e com a Psicanálise ampliando, assim, o seu objeto de
trabalho e estudo. Os autores destacam que por trabalhar, na clínica, com a linguagem em suas
diferentes dimensões, os fonoaudiólogos ancoram sua atuação e prática para além dos aspectos
1 O termo “Surdoserá grafado em maiúscula para diferenciar de “surdo”. O primeiro se refere a um grupo particular de
pessoas que compartilham uma língua e uma cultura e o segundo se refere à condição audiológica de não ouvir (PADDEN;
HUMPHRIES, 1988). Segundo Mo ura (2000) “Surdose refere também àquele que ainda que não inserido na
comunidade Surda teria o direito de ali estar.
Como citar o artigo:
NASCIMENTO, V. MOURA, M. C. Habilitação, reabilitação e inclusão: o que os sujeitos surdos pensam do trabalho
fonoaudiológico? Revista de Ciências Humanas, v.52. 2018. DOI: 10.5007/2178-4582.2018.49807

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT