O femicídio na intimidade sob o olhar dos media: reflexões teórico empíricas

AutorAriana Pinto Correia - Sofia Neves - Silvia Gomes - Conceição Nogueira
CargoFaculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto - Instituto Universitário da Maia - Centro Interdisciplinar em Ciências Sociais da Universidade do Minho - Centro de Psicologia da Universidade do Porto
Páginas34-59
Periódico do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Direito
Centro de Ciências Jurídicas - Universidade Federal da Paraíba
V. 6 - Nº 01 - Ano 2017 Mídia, Gênero & Direitos Humanos
ISSN | 2179-7137 | http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ged/index
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O FEMICÍDIO NA INTIMIDADE SOB O OLHAR DOS MEDIA:
REFLEXÕES TEÓRICO-EMPÍRICAS
Ariana Pinto Correia
Faculd ade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do P orto (FPCEUP ). Email:
aria na.pinto.correia@gmail.com.
Sofia Neves
Instituto Universitár io da Maia (ISMAI). Centro Interdiscipl inar de Estudos de Género (ISCSP/ULisboa).
Email: a sneves@ismai.pt
Sílvia Gomes
Centro Inter disciplinar em Ciências Socia is da Universidade do Minho (CICS.Nova/UMinho)
Instituto Universitário da Maia (ISMAI). E-mail: silvia.gomes@ics.uminho.pt ou silvia.gomes@ismai.pt
Conceição Nogueira
Centro de Psicologia da Universidade do Porto (CPUP). Email: cnogueira @fpce.up.pt
Resumo: O presente texto versa sobre o
olhar dos media em torno do femicídio
na intimidade, uma das mais severas
manifestações de violência de género.
Considerando a investigação que tem
vindo a ser produzida sobre o impacto
das narrativas mediáticas da imprensa
escrita e da televisão sobre o femicídio
na intimidade, ao nível das
representações sociais e das práticas
criminais, junto de diferentes grupos
sociais, são aqui problematizadas as
características e as implicações das
narrativas mediáticas construídas em
torno do fenómeno, bem como as suas
condições de noticiabilidade. Defende-
se a necessidade de investir numa
perspetiva de literacia crítica para os
media que potencie um entendimento
sobre a ideologia de género que está na
base e sustenta a violência contra as
mulheres, tal como recomendado na
Convenção do Conselho da Europa para
a Prevenção e o Combate à Violência
contra as Mulheres e a Violência
Doméstica.
Palavras-chave: Violência de género,
femicídio na intimidade, media.
Abstract: This paper aims to reflect on
the ways news media portray intimate
femicide. Taking intimate femicide as
one of the most severe expressions of
gender violence and relying on recent
research on the impact of media
narratives on this phenomenon, the
characteristics and implications of these
media narratives and its newsworthiness
are problematized. Research review is
centered specifically on studies about
press and television focusing both on
social representations of crime and
Periódico do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre Gênero e Direito
Centro de Ciências Jurídicas - Universidade Federal da Paraíba
V. 6 - Nº 01 - Ano 2017 Mídia, Gênero & Direitos Humanos
ISSN | 2179-7137 | http://periodicos.ufpb.br/ojs2/index.php/ged/index
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intimate femicide, and on the criminal
practice in different social groups. It is
argued the need of a critical media
literacy approach to the matter. Such an
approach promotes an understanding of
the ideology of gender that underpins
and sustains violence against women,
which is recommended in the Council
of Europe Convention on Preventing
and Combating Violence against
Women and Domestic Violence.
Keywords: Gender violence, intimate
femicide, media.
Introdução
A violência de género é uma das
mais graves violações dos direitos
humanos, em particular das mulheres,
colocando em causa a sua dignidade e o
seu acesso pleno à democracia. Por
forma a contrariar manifestações
sistémicas de hegemonia masculina,
m sido várias as recomendações de
organismos europeus e internacionais,
ao longo das últimas décadas, no
sentido de se intensificarem os esforços,
por parte dos Estados, para eliminar um
flagelo que se reconhece existir à escala
mundial.
A Convenção do Conselho da
Europa para a Prevenção e o Combate à
Violência contra as Mulheres e a
Violência Doméstica (Conselho da
Europa, 2011), também designada por
Convenção de Istambul, é um dos mais
recentes instrumentos, criados ao abrigo
de um compromisso europeu, a pugnar
pela proteção das timas e pela
responsabilização dos agressores.
Perspetivando a violência contra as
mulheres como violência de género, a
Convenção de Istambul assenta no
pressuposto de que esta é
uma manifestação das relações de
poder historicamente desiguais
entre mulheres e homens que
levou à dominação e
discriminação das mulheres pelos
homens, p rivando assim as
mulheres do seu pleno progresso
(Conselho da Europa, 2011: 2).
Reforça-se neste documento o
entendimento de que a violência contra
as mulheres deriva de assimetrias
estruturais promotoras de desigualdades
de género (Azambuja et al., 2013;
Neves, 2008; Neves e Nogueira, 2010),
que se repercutem em todas as
dimensões da vida social, muito em
particular na esfera das relações de
intimidade.
Um estudo recente, realizado com
uma amostra de 42 mil mulheres

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