Extinção do processo

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas35-59

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Considerações introdutórias

O escopo do processo é a solução do conflito intersubjetivo de interesses, submetido à apreciação do Poder Judiciário. Assim, quando a sentença julga mérito, podemos dizer que, bem ou mal, o processo atinge a sua finalidade. Contudo, há situações excepcionais (ou anómalas) em que o processo se extingue sem que o mérito da causa tenha sido apreciado; por outro modo de expressão: às vezes, ocorrem certos fatos que impedem a solução da lide, fazendo com que o autor (especialmente, este) não receba a resposta jurisdicional esperada.

No passado, as sentenças que punham fim ao processo, apreciando o mérito, recebiam a denominação de definitivas; as que davam fim ao processo, sem apreciar o mérito, eram chamadas de terminativas. Essa nomenclatura, embora tenha sido adotada pelo processo do trabalho (CLT, art. 895, "a"), foi abandonada pelo CPC, que se refere às sentenças que tenham examinado o mérito e as que não o apreciaram. Para esse efeito, enumerou as causas correspondentes nos arts. 485 e 487. De qualquer modo, é importante destacar que, em decorrência das alterações introduzidas pela Lei n. 11.232/2005, no CPC de 1973 - por força da qual a antiga execução autónoma de título judicial foi deslocada para o processo de conhecimento (arts. 475-I a 475-R) -, o conceito clássico de sentença como o ato pelo qual o juiz punha fim ao processo foi reformulado. Nos termos do art. 162, § 1º , daquele CPC, sentença era o ato do juiz que implicava algumas das situações previstas nos arts. 267 e 269. Essa redefinição de sentença, no plano do processo civil, decorreu do fato de a sentença, emitida no processo cognitivo, não mais dar fim a este processo, que prosseguirá para obter o "cumprimento da sentença". O CPC de 2015 conceitua sentença como o pronunciamento por meio do qual o juiz, com fundamento nos arts. 485 e 487, põe fim à fase cognitiva do procedimento comum, assim como extingue a execução (art. 203, § 1º ).

O procedimento do "cumprimento da sentença", consagrado pelo CPC, é inaplicável ao processo do trabalho, porquanto, aqui, continua a existir o tradicional processo de execução (CLT, arts. 876 a 892). Logo, no processo do trabalho a sentença segue sendo conceituada como ato pelo qual o juiz põe fim ao processo (de conhecimento), dando início a outro processo (de execução).

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Podemos dizer, em síntese, que o processo do trabalho recepcionou, tacitamente, o conceito de sentença, enunciado pelo art. 162, § 1º , do CPC de 1973.

Extinção do processo sem resolução do mérito (CPC, art 485)
2.1. Indeferimento da petição inicial

a) Inépcia. A petição inicial, para constituir-se num instrumento apto à provocação da atividade jurisdicional do Estado, com vistas à solução do conflito de interesses, deve atender aos requisitos previstos no art. 840, da CLT, quais sejam:

a.a.) juiz ou tribunal a que é dirigida;

a.b.) qualificação das partes;

a.c.) breve exposição dos fatos;

a.d.) o pedido, que deve ser certo, determinado e com indicação do seu valor;

a.e) data e assinatura do autor ou de seu advogado.

Como se percebe, ao contrário do CPC de 2015, o processo do trabalho não exige que da inicial constem:

• o fundamento jurídico dos pedidos;

• o valor da causa;

• as provas com que o autor pretende demonstrar a verdade dos fatos alegados;

• a opção do autor pela realização, ou não, da audiência de conciliação ou de mediação (art. 319, incisos III, V e VII, respectivamente).

Além disso, a petição inicial deverá ser instruída com os documentos indispensáveis à propositura da ação (CLT, art. 787).

A petição inicial será indeferida quando:

• for inepta;

• a parte for manifestamente ilegítima;

• o autor carecer de interesse processual;

• não forem atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321, do CPC (CPC, art. 330. I a IV, respectivamente).

O CPC de 1973 incluía, ainda, entre as causas de indeferimento da petição inicial, estas: 1) quando o juiz verificasse, desde logo, a decadência ou a prescrição; 2) quando o tipo de procedimento, escolhido pelo autor, não

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correspondesse à natureza da causa, ou ao valor da ação, hipótese em que o indeferimento somente deveria ocorrer se a inicial pudesse ser adaptada ao procedimento legal.

Por outro lado, será inepta a inicial:

• que não possuir causa de pedir ou pedido;

• o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite a formulação de pedido genérico;

• da narração dos fatos não decorrer, de maneira lógica, a conclusão;

• contiver pedidos incompatíveis entre si (CPC, art. 330, § 1º , I a IV).

b) Ilegitimidade de parte. A legitimidade da parte figura como uma das condições da ação (CPC, art. 17). Assim, se for manifesta (saltar aos olhos) a ilegitimidade, seja do autor ou do réu, o juiz estará autorizado a indeferir a petição inicial (CPC, art. 330, II), com a consequente extinção do processo sem exame do mérito CPC, art. 485, VI).

c) Falta de interesse processual. Assim como a legitimidade, o interesse processual é uma das condições para o exercício do direito constitucional de ação. Esse interesse está ligado a uma utilidade e a uma necessidade que o provimento jurisdicional representa para o património jurídico do autor. O CPC de 1939 impunha que o interesse fosse económico ou moral. Embora o Código de 1973 aludisse a interesse, sem mais nada acrescentar, sabemos que esse interesse devia ser jurídico. O art. 17, do CPC de 2015, também faz referência apenas a interesse. O interesse poderá limitar-se à declaração de existência, inexistência ou modo de ser de relação jurídica, à falsidade ou autenticidade de documento (CPC, art. 19). A falta de interesse processual conduz à carência da ação e à extinção do processo sem julgamento do mérito.

d) não atendidas as prescrições dos arts. 106 e 321

O art. 106 determina que o advogado, quando postular em causa própria, incumbe:

• Declarar, na petição inicial ou na contestação, o endereço, seu número de inscrição na OAB e o nome da sociedade de advogados da qual faz parte, para o recebimento de intimações;

• Comunicar ao juízo qualquer mudança de endereço (incisos I e II, nessa ordem).

O art. 321 declara que se o juiz verificar que a inicial não cumpre as exigências legais, deverá determinar ao autor que a emende ou a complete, no prazo de quinze dias. Se o autor cumprir o despacho, corrigindo o defeito ou a irregularidade, a inicial tornar-se-á apta; caso contrário, será indeferida, por inepta (ibidem, parágrafo único, e art. 330, I), com a consequente extinção do processo sem resolução do mérito (CPC, art. 485, I).

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2.2. Paralisação por negligência das partes

Quando o processo ficar paralisado por mais de um ano, em razão de negligência partes, o juiz poderá extingui-lo. Na verdade, decorrido mais de um ano da prática do último ato processual, a extinção do processo poderá ocorrer mesmo que não fique demonstrada a negligência dos litigantes e desde que excluídas as causas de força maior. Caberá ao juiz, porém, antes disso, mandar intimar, pessoalmente, as partes, a fim de que promovam, no prazo de cinco dias, o ato processual que lhes incumbe (CPC, art. 485, § 1º ) - vindo a extinguir o processo somente se a providência não for tomada pelos litigantes.

A norma legal em estudo, entretanto, oferece algumas dificuldades de ordem prática, no que respeita a saber em que situações exatamente a paralisação do processo, por mais de um ano, em virtude de negligência dos litigantes, ensejaria a extinção deste. A primeira dúvida é quanto à configuração subjetiva dessa negligência, desse descaso processual: o ato, capaz de caracterizar o desleixo, deve decorrer de ambas as partes, ou de uma delas, apenas? Se julgarmos que deva emanar dos litigantes, em conjunto, não será fácil encontrar uma situação concreta, em que isso possa acontecer. Poderíamos pensar na suspensão do processo, que é ato derivante da vontade convergente das partes (CPC, art. 313, II). Sucede, no entanto, que a mencionada suspensão não pode exceder a um ano ou seis meses, conforme seja a hipótese, segundo esclarece o § 4º do art. 313 do CPC; e o que prevê o art. 485, II, é a paralisação do processo por período superior a um ano. Dessa forma, se a suspensão ultrapassar a seis meses ou a um ano, os autos deverão ser conclusos ao juiz, que ordenará o restabelecimento do curso do procedimento (CPC, art. 313, § 5º), não dando margem, assim, à incidência do art. 485, II, do mesmo Código. Se, ao contrário, entendermos que a extinção do processo possa derivar de negligência de uma das partes, seguramente nos submeteríamos ao embaraço de sustentar a possibilidade de o processo ser extinto quando a negligência for do réu. A prevalecer essa opinião, o réu estaria fortemente estimulado a negligenciar em juízo, porquanto esse seu desleixo conviria aos seus interesses como integrante do polo passivo da relação processual. Estaria o réu, em derradeira análise, a beneficiar-se da própria torpeza. Se, finalmente, concluirmos que a inércia capaz de acarretar a extinção do processo deva ser, unicamente, a do autor, estaremos negando a expressão literal do art. 485, II, do CPC, que faz referência às partes; além disso, a atitude desleixada do autor, em particular, é tratada no...

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