Execução por quantia certa: a expropriação

AutorHumberto theodoro júnior
Ocupação do Autordesembargador aposentado do tribunal de justiça de minas gerais. professor titular aposentado da faculdade de direito da ufmg. doutor em direito
Páginas489-500

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301. Conceito

A execução forçada, na modalidade de execução por quantia certa, compreende atos de afetação de bens, de alienação compulsória e de pagamento do credor.

Para substituir a prestação que o devedor não cumpriu voluntariamente, o Estado, por meio do órgão judicial, penhora bens do inadimplente, aliena-os e com o produto apurado paga ao credor.1Essa atividade processual, como já se demonstrou, compreende três fases: a de postulação, a de instrução e a de pagamento.

Se a penhora (início da segunda fase da execução) recair sobre dinheiro, nada mais há que se praticar para completar a instrução. Não havendo embargos do devedor ou sendo estes julgados improcedentes, passar-se-á, logo, ao pagamento do credor.2Contudo, se os bens apreendidos forem de outra natureza, a instrução da execução deverá prosseguir para apurar-se a quantia necessária à satisfação do direito do credor, o que se faz pela alienação forçada, ou expropriação dos bens afetados pela penhora.

Esse ato expropriatório pode ser alcançado de três maneiras diferentes (NCPC, art. 825):3a) preferencialmente pela adjudicação dos próprios bens penhorados (art. 876);

b) pela alienação, por iniciativa particular ou por leilão judicial eletrônico ou presencial (arts. 879 e seguintes);4e

c) pela apropriação de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimentos e de outros bens (arts. 825, III5e 8676).

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I - Ordem de preferência entre os meios expropriatórios

Em razão da Lei nº 11.382/2006, ainda ao tempo do CPC/73, a ordem de preferência para a aplicação das diferentes modalidades de expropriação dos bens penhorados sofreu radical transformação. Em vez da alienação dos bens penhorados, a preferência legal se deslocou para a adjudicação, colocada em primeiro lugar na relação das medidas expropriatórias estatuídas pelo art. 647 do referido Código. O novo Código segue a mesma orientação (NCPC, art. 876).

A alienação em hasta pública passa para o terceiro lugar na ordem de cabimento dos atos expropriatórios. Se não houver interessado na adjudicação, a expropriação realizar-se-á por meio de "alienação particular", a requerimento do exequente (NCPC, art. 880). Somente quando não houver requerimento de adjudicação ou de alienação particular é que se procederá ao ato expropriatório por meio de hasta pública.

Com o novo Código, restou, assim, mantida basicamente a estrutura do CPC/73. Foram conservadas a adjudicação e a alienação por iniciativa particular ou leilão judicial. Introduziu-se, outrossim, a apropriação de frutos e rendimentos de empresa, ou de estabelecimentos e de outros bens do executado, como uma terceira modalidade expropriatória.

Convém notar que a adjudicação está colocada no primeiro lugar da gradação legal entre os meios expropriatórios. A ordem de preferência, todavia, não é impositiva, pois a adjudicação depende de requerimento do credor (art. 876), o mesmo ocorrendo com a alienação por sua própria iniciativa ou por meio de leiloeiro público (art. 880).

Nota-se, por último, que apenas a alienação é ato puramente de instrução da execução por quantia certa, já que a adjudicação e a apropriação de frutos e rendimentos de empresa, estabelecimento ou outros bens, ao mesmo tempo que expropriam bens do devedor, satisfazem também o direito do credor. São, pois, figuras que integram a terceira fase da execução por quantia certa, ou seja, a fase de satisfação ou pagamento.

II - Remição dos bens penhorados

A remição, outrora prevista no art. 787, do CPC/73, não configurava uma outra modalidade da expropriação, pois não passava de uma variante da arrematação em hasta pública, em que se deferia a alienação forçada ao cônjuge ou parente do executado, com preferência sobre o estranho arrematante. A Lei nº 11.382/2006 extinguiu a remição, revogando o art. 787 e criou, para seus antigos beneficiários, o direito de pretender a adjudicação, fora e antes, da hasta pública, com preferência sobre os demais legitimados (art. 685-A, §§ 2º e 3º) (NCPC, art. 876, §§ 5º e 6º).

O novo Código, porém, prevê, para ser fiel ao direito material (Código Civil, art. 1.482),7a possibilidade de remição do imóvel hipotecado pelo executado (art. 902, caput), direito esse que será exercitável, mesmo após o leilão, mas antes da assinatura

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do auto de arrematação, mediante oferta de preço igual ao do maior lance apresentado na licitação (art. 902, parágrafo único).8III - Conceito de expropriação do bem penhorado

Pode-se, pois, definir a expropriação executiva como o ato estatal coativo através do qual o juiz transfere a propriedade do executado sobre o bem penhorado, no todo ou em parte, independentemente da concordância do dono, e como meio de proporcionar a satisfação do direito do credor.

Nota-se, por último, que apenas a alienação por iniciativa particular e o leilão judicial são atos puramente de instrução da execução por quantia certa, já que a adjudicação e a apropriação de frutos e rendimentos, ao mesmo tempo que expropriam bens do executado, satisfazem também o direito do exequente. São, pois, figuras que integram a terceira fase da execução por quantia certa, ou seja, a fase de satisfação ou pagamento.

302. Avaliação

Após a penhora, sobrevém a avaliação como ato preparatório e necessário à expropriação executiva. Tem ela a finalidade de tornar conhecido a todos os interessados o valor aproximado dos bens a serem utilizados como fonte dos meios com que o juízo promoverá a satisfação do crédito do exequente.9É ato de decisiva importância para todas as modalidades expropriatórias, e não apenas para a hasta pública, conforme se depreende dos arts. 876, 880, § 1º e 886, II e V.10É a avaliação que, basicamente, determinará o preço pelo qual os interessados poderão adjudicar os bens penhorados (art. 876), e o preço a partir do qual, na venda por iniciativa particular e na hasta pública, os interessados ou bancos poderão formular suas propostas ou lanços (arts. 880, § 1º, e 886, II).

No caso da apropriação de frutos e rendimentos de empresa ou de estabelecimento e de outros bens, a penhora que a prepara (art. 867), importa a nomeação de um depositário-administrador que elaborará o plano submetido a aprovação judicial, no qual se delimitará até quando a medida expropriatória durará (art. 869, § 1º).

Se, contudo, a penhora recair sobre títulos da dívida pública, ações de sociedades e títulos de créditos negociáveis em bolsa, não haverá necessidade de avaliação, pois, o valor a ser anunciado para oferta ao público será o da cotação oficial do dia, provada por certidão ou publicação no órgão oficial (art. 871, III).11

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303. O encarregado da avaliação

O sistema tradicional do processo civil, ao tempo do CPC/73, atribuía a avaliação dos bens penhorados a um perito nomeado pelo juiz que desempenhava sua função depois que fosse superado o estágio dos embargos do executado. Com a reforma da Lei nº 11.382/2006, o encargo processual foi imputado ao oficial de justiça. O mandado executivo, a ser por ele cumprido, compreende a citação, a penhora e a avaliação, conforme prevê o art. 652, do CPC/73, disposição que foi mantida pelo art. 829 do NCPC. O mandado de citação, portanto, deve conter o prazo para pagamento, a quantia a ser paga, além da ordem para penhora e avaliação dos bens, que será cumprido pelo oficial de justiça, independentemente de nova decisão judicial, tão logo seja verificado o não pagamento no prazo assinalado. De tudo lavrar-se-á auto, com intimação do executado (NCPC, art. 829, § 1º).12Em duas situações, porém, o oficial de justiça não procederá à avaliação:

(i) quando forem necessários conhecimentos especializados para apuração do valor dos bens penhorados (art. 870, parágrafo único);13

(ii) nos casos em que a avaliação de certos bens é dispensada pela lei (art. 871).

A avaliação pelo oficial de justiça já fora adotada pela Lei nº 6.830/1980, para as execuções fiscais (art. 13), a qual também previa o recurso à perícia por técnico, na hipótese de impugnação por alguma das partes ou pelo Ministério Público (art. 13, §§ 1º e 2º).14A perícia avaliatória, para efeitos executivos, todavia, não deve sujeitar-se aos rigores de uma prova técnica mais complexa, em que as partes formulam quesitos e indicam assistentes técnicos. Para efeito da execução por quantia certa, a perícia é singela, limitando-se à atribuição de valores aos bens penhorados. A lei quer que a diligência se realize no menor prazo possível, cabendo ao juiz que a ordena fixar prazo nunca superior a dez dias para entrega do respectivo laudo (art. 870, parágrafo único). Não há, por isso mesmo, que se dilatar o cumprimento da medida com formulação de quesitos e designação de assistentes técnicos15.

Quanto à estimativa do executado, sua prevalência só se dá quando o exequente não a impugna, fundamentadamente, ou quando o juiz não tenha dúvida sobre o valor

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que foi atribuído ao bem (art. 873, III). Instalada a discordância, a solução dar-se-á pela perícia avaliatória (art. 871, parágrafo único).16304. Laudo de avaliação

Desde a reforma efetuada por meio da Lei nº 11.382/2006, à época do CPC/73, a avaliação dos bens penhorados passou a acontecer, ordinariamente, no momento da realização da própria penhora, por ato do oficial de justiça. As hipóteses de estimativa por perito (avaliador) nomeado pelo juiz correspondem a exceções frente às atribuições normais do oficial de justiça previstas nos arts. 154, V, 829, § 1º, e 670, do NCPC.17De qualquer modo, seja realizada pelo oficial de justiça ou pelo avaliador nomeado pelo juiz, a avaliação sempre constará de laudo em que os bens penhorados serão descritos com...

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