O novo estatuto legal dos crimes sexuais: do estupro do homem ao fim das virgens...

AutorPlínio Antônio Britto Gentil
CargoDoutor em Direito Processual Penal (PUC-SP)
Páginas8-12

Page 8

Introdução

Em 10 de agosto de 2009, foi publicada a Lei n. 12.015, de 07 de agosto do mesmo ano, que entrou em vigor na data de sua publicação e modificou o conteúdo do título do Código Penal dedicado aos crimes contra os costumes - agora crimes contra a dignidade sexual.

Há modificações que resolvem, de uma vez por todas, temas que geravam controvérsias. As mais relevantes são: a alteração do tipo penal de estupro, inovando com a possibilidade de o homem figurar como sujeito passivo e abrangendo, na mesma figura, a conduta antes definida como crime de atentado violento ao pudor; a revogação da presunção de violência e, em contrapartida, o surgimento de tipos penais autônomos para vítimas agora tidas como vulneráveis; a mudança da regra geral relativa à espécie de ação, de privada para pública condicionada; e o segredo de justiça para todos os crimes contra a dignidade sexual.

Poucos dispositivos foram revogados, apenas quatro, mas em número maior foram as alterações - que atingiram desde a denominação do título, capítulos e crimes, até o conteúdo de artigos e parágrafos - e as inclusões de novos artigos, num total de seis: 217-A, 218-A, 218-B, 234-A, 234-B e 234-C, e de novos parágrafos para os artigos preexistentes, que trouxeram figuras qualificadas e, principalmente, várias causas de aumento de pena.

A nova lei atingiu praticamente todo o título dos antes chamados crimes contra os costumes. O único capítulo isento de alterações e que, aliás, mantém a redação original de 1940, que lhe foi dada quando da promulgação do Código Penal, salvo quanto ao valor da multa, é o VI (Do ultraje público ao pudor).

A Lei dos Crimes Hediondos também foi atingida pela nova lei, que incluiu a hediondez do crime de estupro simples.

As novidades atingiram não só o conteúdo dos dispositivos, mas também os nomes de título e capítulos. A primeira delas vem logo no título. Abandona-se a conhecida intitulação Dos crimes contra os costumes para adotar-se a denominação Dos crimes contra a dignidade sexual. Não se vê razão aparente para aPage 9 mudança, a não ser um desejo de se harmonizar o título com a Constituição de 1988, que traz como fundamento da República a dignidade da pessoa humana (art. 1 °, III).

Dois dos seis capítulos que compõem o título -considerada a recente revogação do Capítulo III (Do rapto) - tiveram alteração de nomenclatura.

O Capítulo II,cujoconteúdofoitotalmentealterado, não mais trata da sedução e da corrupção de menores. É agora denominado Dos crimes sexuais contra vulnerável.

E o Capítulo V, antes Do lenocínio e do tráfico de pessoas, teve inserido, já no título do capítulo, um elemento subjetivo do tipo: para fim de prostituição ou outra forma de exploração sexual.

O objetivo deste trabalho é apontar as inovações da nova lei e fazer uma breve análise das suas principais consequências.

O estupro e seus sujeitos passivos (o homem entra em cena...)

Interessante modificação envolve a definição legal do crime de estupro, que se mantém no art. 213 do estatuto penal, conserva a mesma rubrica, mas sofre importantes alterações. A infração passa a abranger, numa mesma figura, não só a conduta de constranger alguém - e não mais somente a mulher - à conjunção carnal, mediante violência ou grave ameaça, como também aquela conduta antes inscrita no tipo descrito no revogado art. 214 (atentado violento ao pudor). Tornou-se solucionável, e típica, aquela acadêmica e hipotética situação em que um homem, mediante violência ou grave ameaça, fosse constrangido à conjunção carnal. Inexistia tipo penal adequado a tal conduta, pois inaplicável o antigo art. 214, já que não se tratava de ato diverso da conjunção carnal e, sim, da própria conjunção carnal; e era igualmente inaplicável a anterior figura do estupro, que exigia que o constrangimento fosse contra mulher.

Essas mesmas alterações impostas ao crime de estupro e atentado violento ao pudor estendem-se aos antigos crimes de posse sexual mediante fraude e atentado violento ao pudor mediante fraude. As condutas nesses dois tipos penais previstas passam a constituir, juntas, um único tipo penal, o mesmo da antiga posse sexualmediante fraude (art. 215), mas com outra definição legal: violação sexual mediante fraude, e têm como sujeito passivo não mais somente a mulher e sim alguém, tudo conforme a nova redação do citado art. 215.

Fim da presunção de violência e o surgimento do vulnerável

A revogação da presunção de violência (art. 7° da Lei n. 12.015/09) é outra novidade. Não mais se presume a violência em relação a vítimas menores de 14 anos, àquelas que o agente saiba alienadas ou débeis mentais, ou que não possam oferecer resistência.

Preferiu o legislador que situações semelhantes fossem tratadas com mais severidade e, para tanto, criou tipos penais autônomos, estipulando para eles penas maiores.

A revogação da presunção de violência (art. 7° da Lei n. 12.015/09) é outra novidade.

Não mais se presume a violência em relação a vítimas menores de 14 anos, àquelas que o agente saiba alienadas ou débeis mentais, ou que não possam oferecer resistência

Passa-se a chamar de vulneráveis os que tenham 14 anos ou menos e aqueles que, por enfermidade ou deficiência mental, não tenham o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não possam oferecer resistência.

O estupro praticado contra o vulnerável é uma nova infração, cuja conduta está inscrita no art. 217-A e é apenada com reclusão de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

A nova redação aparentemente encerra discussões iniciadas com um julgamento pelo Supremo...

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