Das Provas

AutorLuis Fernando Feóla
Ocupação do AutorJuiz do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região. Membro do Comitê Gestor Regional do Processo Judicial Eletrônico do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região.
Páginas183-198

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1. Da produção da prova documental

Como visto no tópico da formação dos autos eletrônicos73, a produção da prova documental tem características bastante peculiares no processo eletrônico, já que a formação dos autos nos processos eletrônicos se inicia com a prática de atos pré-processuais importantes, cujos efeitos poderão repercutir no direito processual e até no direito material postulado. Daí o estudo da formação dos autos, com ênfase na inserção de documentos em tópico destacado.

A prova documental produzida no processo eletrônico é aquela desmaterializada, convertida do meio físico, geralmente papel em formato compatível com o procedimento de escaneamento, para o meio eletrônico, na forma de bits, ou originariamente construída no ambiente digital.

De toda sorte, o documento digitalizado ou o documento digital, ao adentrarem no processo eletrônico como meio de prova, encontram-se no mesmo estado e em igualdade de condições eletrônicas e jurídicas.

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A prova documental no processo eletrônico é um código representativo de um conjunto de bits que, ordenados eletronicamente, retratam ou reproduzem um documento que antes se encontrava ou não em estado de matéria palpável, em papel.

A prova documental, no entanto, não perde sua essência de representação de um fato, e assim deve ser tratada juridicamente. Como ensina Fredie Didier Jr. "a noção de documento não coincide nem se confunde com a noção de prova escrita. O documento não se resume à prova escrita, nem esta terá sempre o status de documento. Há prova documental não escrita (p. ex.: a fotografia) do mesmo modo que há prova escrita não documental (p. ex.: o laudo pericial). A despeito disso, ver-se-á que boa parte das regras relativas à prova documental fazem nítida associação da noção de documento à de prova escrita"74.

O documento digitalizado é aquele que passa por um processo de digitalização (escaneamento) e adentra ao processo eletrônico em formato digital, de modo a possibilitar sua reprodução como em seu estado natural, em meio físico.

A prova documental no meio eletrônico, nos termos do art. 365, VI, do CPC, introduzido pelo art. 20 da Lei n. 11.419/2006, é uma reprodução digitalizada de um documento.

É instintiva àqueles que têm ou tiveram contato com meios de comunicação eletrônicos, a correlação entre documento físico em meio papel e documento digitalizado, desmaterializado.

Convém relembrar que o processo de digitalização de documentos ocorre em momento pré-processual, porque o advogado tem que realizar a digitalização e formação dos arquivos que irá anexar aos autos eletrônicos antes de ajuizar a ação ou apresentar a resposta ou realizar qualquer manifestação. O processo de digitalização é antecedente ao ingresso do documento no processo.

O documento digital não passa pelo processo de desmaterialização, ou seja, não é digitalizado. O documento digital é aquele que originalmente já é representado por bits ordenados em códigos cifráveis e decifráveis (código binário). O documento digital pode ou não ser materializado, mas não perde em nada sua essência ao adentrar ao processo eletrônico como meio de prova.

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Seria mais preciso que o art. 365, VI, do CPC se referisse a reprodução digital, porque o processo de digitalização converte o documento em código binário, tal como, originariamente, o documento digital. Assim a reprodução de qualquer desses é sempre digital ou por meio eletrônico.

Tanto o documento digitalizado como o digital têm o mesmo valor probante.

A distinção está no método para aferição de suas autenticidades, caso impugnada.

O documento digitalizado pressupõe a existência de um original em meio material, físico, palpável, normalmente em papel. Sua impugnação judicial, sob a alegação de falsidade material, pode ser resolvida com a apresentação do original e realização de perícia documentoscópica ou grafotécnica. Assim, é cabível a arguição de falsidade material de documento digitalizado, consoante § 2º do art. 11 da Lei n. 11.419/2006, verbis:

§ 2º A arguição de falsidade do documento original será processada eletronicamente na forma da lei processual em vigor.

Da mesma forma o § 3º do art. 19 da Resolução CSJT n. 136/2014.

Assim, a prova técnica poderá ser feita com a coisa impugnada em sua autenticidade. O juiz conferirá prazo para que a parte detentora do documento original faça a juntada deste em Secretaria, prosseguindo com a realização da prova pericial grafotécnica ou documentoscópica.

Já quanto ao documento digital, a prova quanto a sua falsidade, embora possa ser arguida de modo eletrônico75, será realizada por meio de perícia no sistema de informática ou no computador que a gerou. A prova pericial demanda um perito técnico em informática, a depender do motivo da arguição da falsidade, pois se esta tiver ocorrido na adulteração do documento digital em seu estado eletrônico, somente um expert em informática poderá asseverar a falsidade praticada. Essa falsidade deve ser considerada falsidade material, ainda que realizado o ato de adulteração em documento

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digital porque incide sobre algo que fora adulterado. A falsidade ideológica se demonstra por outros meios de prova. Como exemplo de falsidade material de documento digital a impugnação origem ou destino de e-mail ou de página de rede social.

De se ilustrar que atualmente, é possível instrumentalizar contratos e assiná-los digitalmente, de modo que o documento não seja materializado nunca, existindo validamente apenas em meio eletrônico. Documentos podem ser redigidos, lidos e assinados digitalmente pelas partes e produzir plenamente efeitos jurídicos.

Documentos existentes em formato digital, não precisam passar pelo processo de digitalização, podendo ingressar no processo eletrônico em seu formato original.

Assim são as petições do processo, que não deixam de ser documentos em sentido lato e jamais necessitariam ser impressas e escaneadas para serem inseridas no processo eletrônico.

São denominados documentos digitais ou eletrônicos, ou ainda virtuais, quaisquer representações digitais que tenham valor documental, ou seja, em essência, algo capaz de representar um fato (Carnelutti se refere a coisa capaz de representar um fato, porém o termo coisa remete ao sentido de materialidade, impróprio para os documentos eletrônicos).

Alinha-se ao conceito de documento digital ou digitalizado o pensamento de Mauro Schiavi76 que conceitua documento como "todo objeto real corpóreo ou incorpóreo (desde que possa ser demonstrado), destinado a demonstrar os fatos em juízo. Abrange os escritos, gravações magnéticas, fotografias, pedras, instrumentos de trabalho, vestimentas etc.".

Assim, o documento digital pode ser tido como aquele que nunca foi materializado para que produzisse efeitos jurídicos, quer como instrumento digital de vinculação entre sujeitos, como um contrato digitalmente assinado, quer como uma reprodução de um site de internet ou mesmo um link que direciona o usuário para certo endereço eletrônico ou arquivos eletrônicos de e-mails. Todos esses documentos não são digitalizáveis se antes não forem materializados em papel e posteriormente reconduzidos, pela digitalização, a seu estado original de representação de código binário.

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Essa conversão dupla pode ser indicativo de fraude material. Não há razão para que a parte, dispondo de documento em estado digital faça sua materialização (impressão) e depois converta novamente o estado do documento para a virtualização (digitalização ou escaneamento) para só depois inseri-lo no processo. A prática não é vedada, mas havendo impugnação sobre sua autenticidade, se apresenta como indício de ilicitude.

Assim, documentos materializados devem ser digitalizados, quando possível, para serem aceitos no processo eletrônico. Via de regra, não se admite que a parte, sem justificativa, junte documentos em meio papel no processo eletrônico. Todos os documentos devem ser digitalizados ou digitais, reservadas algumas hipóteses de exceção, como a do incidente de falsidade material e a impossibilidade técnica de digitalização em razão do volume (métrico) do documento.

É tão peculiar a produção da prova documental no processo eletrônico que até mesmo o princípio da cartularidade pôde ser mitigado, porque embora o § 2º do inciso VI...

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