Comitê de Representantes de Trabalhadores da Empresa e a Recusa de Negociação pelo Sindicato

AutorRodrigo Chagas Soares
Ocupação do AutorMestre e Especialista em Direito do Trabalho, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC/SP
Páginas95-101

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Diante do tema relativo aos mecanismos de participação dos trabalhadores nas empresas, o Brasil não possui as mesmas experiências que países estrangeiros. Ainda nos idos da década de 1950, Egon Gottschalk (1958, p. 204) abordava sobre o assunto da seguinte maneira: "[...] neste terreno não saímos, ainda, das faixas da puerícia, e não demos os nossos próprios passos à procura de uma nova estrada, em terreno já batido, há algumas décadas, por outras nações industrialmente mais desenvolvidas [...]".

A incipiência do tema dentro do ordenamento jurídico decorre das interpretações feitas da Constituição Federal (BRASIL, 1988) e da própria concorrência comercial no mundo contemporâneo. O aumento da competição internacional leva empresas a se interessarem por sistemas de remuneração mais flexíveis e condicionados ao desempenho individual. A crise do modelo sindical do país, aliada à realidade empresarial, induz forma alternativa de negociação.

A crise do sindicalismo atual, após a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988), está atrelada ao surgimento cada vez maior de entidades sindicais que buscam, apenas, as fontes de custeio, cumprindo os interesses exclusivamente de sua Diretoria e de entidades de grau superior a ela atreladas. A pretexto de representarem os trabalhadores, uma entidade sindical desponta de um desmembramento ou dissociação com fins transversos, garantindo os direitos que a própria legislação já cuidou de assegurar.

O TST vem se desdobrando para corrigir as imperfeições do surgimento de sindicatos que colimam reduzir direitos a pretexto de fracionamento sindical (dissociação ou desmembramento). Para tanto, vem aplicando os princípios da agregação e da anterioridade, segundo os quais, em apertada síntese, o mais legítimo e representativo seria o sindicato que agrega categoria profissional mais larga e abrangente (agregação) e, em caso de dúvida, considera-se mais representativa a entidade sindical mais antiga (anterioridade):

[...] a diretriz da especialização pode ser útil para a análise de certos aspectos de outras relações jurídicas, sendo, porém, incompatível para a investigação da estrutura sindical mais legítima e representativa, apta a melhor realizar o critério da unicidade sindical determinado pela Constituição (art. 8º, I e II, CF/88) e concretizar a consistência representativa que têm de possuir os sindicatos (art. 8º, III e VI, CF/88). Para a investigação sobre a legitimidade e a representatividade dos sindicatos torna-se imprescindível, portanto, o manejo efetivo e proporcional do princípio da agregação, inerente ao Direito Coletivo do Trabalho. (TST RR 126600-88.2010.5.16.0020, 3a Turma, Min. rel. Mauricio Godinho Delgado, julgamento em 26.6.2013, DJe 1º.7.2013) (BRASIL, 2013)

No ano de 2015, o Tribunal Superior do Trabalho passou a valer-se do Princípio da Especificidade, com base no art. 571 da CLT, colocando como requisitos os critérios

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de vida associativa regular e de ação sindical eficiente para o desmembramento ou dissociação, fazendo-se necessário, ainda, o paralelismo simétrico entre o segmento econômico e a categoria profissional representada com o propósito de permitir que essas categorias específicas possam exercer a sua representatividade com maior presteza aos interesses dos representados (TST RO - 1847-78.2012.5.15.0000, Seção Especializada em Dissídios Coletivos, Ministra relatora Dora Maria da Costa, j. 23.2.2015, DJe 6.3.2015).

Verifica-se, pois, a constante preocupação e adaptações da jurisprudência com o propósito de solucionar o problema de representatividade sindical. Em alguns casos, a falta de representatividade sindical justifica a atuação do Comitê de Trabalhadores com o propósito de assegurar os direitos fundamentais dos trabalhadores.

Renato Rua de Almeida (2013, v. 77, p. 1-9), defendendo o caráter neocorporativista do modelo sindical brasileiro atual - também designado semicorporativista ou corporativista fora do Estado -, ensina que poderá haver a violação de direitos fundamentais dos trabalhadores em razão de exclusão ou omissão destes empregados da proteção sindical:

Ademais, esse nosso modelo de unicidade sindical, sustentado pelo sistema da categoria a priori e pela contribuição sindical compulsória, resulta-nos um sindicalismo monopolista autoritário, com a perpetuação no poder do grupo dominante (não há limite legal no exercício do poder sindical como existe na representação dos empregados na CIPA) [...]

Por essas razões, o nosso modelo é neocorporativista ou semicorporativista, ou ainda, se permitirem, corporativista fora do Estado.

Esse modelo sindical enseja, como lembra o constitucionalista português, José Carlos Vieira de Andrade, em sua obra Os direitos fundamentais na Constituição portuguesa de 1976, editada pela Edições Almedina, Coimbra, que "nas relações privadas de poder, quando uma entidade disponha de poder especial de caráter privado sobre outros indivíduos, pode ocorrer a violação dos direitos fundamentais desses indivíduos", e exemplifica com os poderes dos sindicatos sobre os trabalhadores representados, quando excluem ou omitem determinados trabalhadores de sua proteção. Essa exclusão ou omissão de determinados trabalhadores da proteção sindical enseja violação da liberdade sindical, como direito fundamental, desses trabalhadores excluídos ou omitidos pelos sindicatos que os representam.

Prossegue o doutrinador trazendo o exemplo de aposentados de determinada categoria, já analisado, que foram prejudicados na década de 1990 por negociação coletiva de sindicato, que celebrou acordo coletivo deixando de "pagar aos aposentados tanto as duas gratificações anuais (previstas no Regulamento do Pessoal), porque foram subs-tituídas pela PLR, como também a própria PLR, que, por definição, é, em princípio, devida somente ao pessoal da ativa" (ALMEIDA, 2013. p. 77). Nesse caso, os aposentados valeram-se de sua associação civil para a defesa de seus direitos individuais homogêneos perante a Justiça do Trabalho, tendo sua legitimidade reconhecida por meio de decisão

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proferida pela Seção de Dissídios Individuais 1 (SDI-1) do TST (processo n. ED-E-ED-RR-42400-13.1998.5.02.00336 e processo n. ED-E-ED-RR-424/1998-036-02-00.6), que firmou pela sua representação concorrente com a do sindicato para a defesa dos interesses individuais homogêneos (ALMEIDA, 2013. p. 77, 1-10).

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