Comissão Nacional da Verdade e Sigilo: da necessária publicidade da atuação da Comissão Nacional da Verdade como garantia efetiva do direito à memória e à verdade
Autor | Emilio Peluso Neder Meyer, Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira |
Páginas | 39-55 |
Comissão Nacional da Verdade e Sigilo
Da necessária publicidade da atuação da
Comissão Nacional da Verdade como garantia efetiva
do direito à memória e à verdade
Emilio Peluso Neder Meyer1
Marcelo Andrade Cattoni de Oliveira2
Introdução
Recentemente, tem-se acompanhado na imprensa
a divulgação de fatos concernentes ao início dos trabalhos
da Comissão Nacional da Verdade (doravante CNV), ins-
tituída pela Lei n° 12.528/2011. Após alguns meses de
espera, finalmente, a Presidente da República Dilma
Roussef nomeou os integrantes da CNV: Gilson Dipp,
Paulo Sérgio Pinheiro, José Carlos Dias, Rosa Maria Car-
doso da Cunha, Maria Rita Kehl, Cláudio Fonteles e José
Paulo Cavalcanti Filho. Os trabalhos começaram a ser
desenvolvidos logo após a nomeação, ocorrida em 10 de
maio de 2012, e consequente posse, em 16 de maio. Em
seguida a uma controvérsia sobre qual o foco da CNV, é
dizer, se ela deveria investigar graves violações de
direitos humanos praticadas pelo Estado, ou se ela deve-
1 Mestre em Direito Constitucional pela UFMG. Doutor em Direito
pela UFMG. Professor Adjunto da Universidade Federal de Minas
Gerais. Membro do IDEJUST – Grupo de Estudos sobre Interna-
cionalização do Direito e Justiça de Transição.
2 Mestre e Doutor em Direito Constitucional pela UFMG. Estágio Pós-
Doutoral em Teoria e Filosofia do Direito pela Università degli studi di
Roma TRE. Bolsista de Produtividade do CNPq. Professor Associado
da Faculdade de Direito da UFMG. Membro Diretor do IDEJUST –
Grupo de Estudos sobre Internacionalização do Direito e Justiça de
Transição.
Comissão Nacional da Verdade e do Sigilo
40
ria incluir outras violações praticadas no contexto da
resistência a este mesmo Estado, a Comissão iniciou um
trabalho de articulação com outras Comissões já exis-
tentes. Assim, em vista da brevidade de seu funciona-
mento (dois anos de investigação do período de 1946 a
1988), deu-se início a uma articulação com outras comis-
sões já existentes e exitosas em seus trabalhos: a Comissão
de Mortos e Desaparecidos Políticos da Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República (instituí-
da pela Lei n° 9.140/1995) e a Comissão de Anistia do
Ministério da Justiça (instituída pelo art. 8º do ADCT e
regulamentada pela Lei n° 10.559/2002) (MENDES, 2012,
p. 1). Em um momento posterior, tal trabalho de articu-
lação foi ainda mais ampliado, visando incluir um diálo-
go com as comissões estaduais que procuraram levar à
frente investigações locais: as Assembleias Legislativas de
São Paulo e do Rio de Janeiro já haviam desenvolvido
parte de seu trabalho, assim como o Poder Executivo nos
Estados de Pernambuco e do Rio Grande do Sul também
deram passos iniciais que vão ser resgatados pela CNV.
Chama a atenção, contudo, que boa parte das ses-
sões de depoimento perante a CNV tenham acontecido
sob o acolhimento de uma exigência dos próprios
depoentes: a manutenção de um sigilo (PORTAL TERRA,
2012a, p. 1). Grupos de direitos humanos e familiares de
desaparecidos políticos têm sido enfáticos em criticar tal
prática. A CNV teria chegado ao ponto de, no caso do
depoimento do médico legista Harry Shibata, colher assi-
natura a um termo de compromisso que impediria o
depoente de dar entrevistas ou prestar informações, logo
após tê-lo ouvido sob sigilo. A ideia seria a de que tais
garantias deixariam o depoente mais “à vontade” – con-
traditoriamente, neste caso, a própria Comissão relataria
certa decepção com a postura do depoente (ESTADO DE
MINAS, 2012, p. 1).
Diante de tais fatos, este trabalho procurará anali-
sar as principais consequências da adoção de tal postura
por uma comissão da verdade. Em primeiro lugar, será
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO