Client's trust violation and recovery after double deviation/Violacao e recuperacao da confianca do cliente apos o duplo desvio/Violacion y recuperacionde la confianza del cliente despues del doble desvio.

AutorBasso, Kenny
CargoENSAIO--MARKETING
  1. INTRODUCAO

    A confianca, como ingrediente essencial para a construcao e manutencao de relacionamentos (MORGAN; HUNT, 1994; DIRKS; CREMER, 2010), tem sido alvo de reflexoes tanto de academicos quanto de gestores de empresas de servicos. A confianca oferece garantia quanto ao desempenho do servico, do produto ou ate mesmo da relacao, o que significa que reduz os riscos nas trocas e cria um sentimento positivo reciproco. No entanto, as falhas nos servicos prestados podem lhe ser uma ameaca.

    De uma forma geral, a falha no servico provoca diversas reacoes comportamentais e atitudinais no cliente, tais como reclamacoes (TAX; BROWN; CHANDRASHEKARAN, 1998; SMITH; BOLTON; WAGNER, 1999; GELBRICH, 2010), desejo de vinganca (GREGOIRE; TRIPP; LEGOUX, 2009; MCCOLL-KENNEDY et al., 2009), emocoes associadas a raiva (MCCOLL-KENNEDY et al., 2009; GELBRICH, 2010) e intencoes de boca a boca negativas (MCCOLL-KENNEDY et al., 2009; GELBRICH, 2010). Apesar dos esforcos das empresas para construir a confianca do cliente, o surgimento de conflitos entre clientes e empresas, inerentes as relacoes, gera, na maioria das vezes, uma quebra ou violacao da confianca que o cliente tem na empresa (SANTOS; FERNANDES, 2008). Assim, as falhas na prestacao dos servicos podem ser compreendidas como eventos que violam a confianca do cliente.

    As falhas no servico podem ser corrigidas por meio de processos de recuperacao do servico (TAX; BROWN; CHANDRASHEKARAN, 1998). A recuperacao do servico, quando realizada com sucesso, pode reverter as sensacoes negativas provenientes da falha no servico, gerando satisfacao no cliente (MCCOLLOUGH; BERRY; YADAV, 2000). Todavia, falhas tambem podem ocorrer durante a recuperacao do servico, representando assim um duplo desvio das expectativas iniciais do cliente (BITNER; BOOMS; TETREAULT, 1990). O duplo desvio pode reforcar ainda mais os efeitos negativos da falha do servico nas atitudes e comportamentos dos clientes (HART; HESKETT; SASSER, 1990).

    O fato de a empresa agir de forma contraria as expectativas do cliente pode fazer com que este repense, questione e busque informacoes para decidir se continua confiando na empresa ou se altera sua confianca. Nesse sentido, tanto a falha no servico inicial (desvio simples) quanto o duplo desvio representam violacoes da confianca do cliente. Estudos como o de Tax, Brown e Chandrashekaran (1998) avaliam o impacto da (in)satisfacao com o tratamento da reclamacao por parte da empresa na confianca do cliente, porem nao comparam a confianca apos o duplo desvio com a confianca apos o desvio simples, permanecendo assim a incerteza sobre o efeito intensificador do duplo desvio na confianca.

    Embora o duplo desvio seja um fenomeno bem conhecido na area de marketing, pouca atencao tem sido dada as acoes que as empresas podem realizar para restaurar a confianca do cliente apos este fenomeno. Joireman et al. (2013), por exemplo, procuraram descobrir em que situacoes os clientes oferecem uma segunda chance a empresa, apos o duplo desvio. Os pesquisadores concluiram que, apos o duplo desvio, as empresas que compensam os clientes ou lhes pedem desculpas podem alterar as inferencias destes sobre a empresa, fazendo com que desejem a reconciliacao ao inves de vinganca ou retaliacao. Os autores, no entanto, nao exploraram a violacao e recuperacao da confianca apos esse duplo desvio.

    Ocorrida a violacao da confianca do cliente pelo duplo desvio, a empresa pode simplesmente ignorar o fato, permitindo que este tenha comportamentos negativos, como acoes de retaliacao (GREGOIRE; TRIPP; LEGOUX, 2009) e comunicacoes boca a boca negativas (MCCOLL-KENNEDY et al., 2009; GELBRICH, 2010). Alternativamente, a empresa pode desenvolver acoes para recuperar a confianca do cliente.

    Os estudos que avaliam a recuperacao da confianca, em sua maioria, envolvem contextos de desvio simples, em que apenas uma falha ocorre (p. ex., XIE; PENG, 2009; LAER; RUYTER, 2010). Ademais, poucos foram os trabalhos que avaliaram a recuperacao da confianca apos multiplas falhas ou multiplas violacoes (p. ex., SCHWEITZER; HERSHEY; BRADLOW, 2006; DIRKS et al., 2011). Convem destacar que trabalhos como o de Dirks et al. (2011), embora analisem a recuperacao da confianca apos multiplas falhas, nao tratam do duplo desvio nem de trocas entre clientes e empresas. No estudo de Schweitzer, Hershey e Bradlow (2006) e de Dirks et al. (2011), as multiplas falhas referem-se a diversas violacoes sucessivas impostas por um transgressor a vitima, sem nenhum esforco de recuperacao entre elas (apenas apos).

    Ainda quanto a recuperacao da confianca, a maioria dos trabalhos envolve o contexto de relacoes interpessoais, pesquisado em areas como a Psicologia (p. ex., DESMET; CREMER; DIJK, 2011a) e a Economia (p. ex., CREMER, 2010), ou relacoes interpessoais intraorganizacionais (p. ex., KIM et al, 2004; FERRIN et al, 2007). Diante disso, destaca-se a necessidade de verificar como a recuperacao da confianca pode ser feita no contexto de trocas entre empresa e cliente (B2C). Ressalta-se que alguns estudos apresentam um esforco nesse sentido (p. ex., XIE; PENG, 2009; LAER; RUYTER, 2010), porem focando violacoes unicas, ou seja, a recuperacao da confianca apos uma unica falha, e o contexto de publicidade negativa (XIE; PENG, 2009) e comunicacoes em blogs de referencias (LAER; RUYTER, 2010).

    Embora os efeitos do duplo desvio tenham sido abordados por pesquisas na area de marketing (p. ex., BITNER; BOOMS; TETREAULT, 1990; GREGOIRE; TRIPP; LEGOUX, 2009), ate onde se sabe nenhum trabalho estudou os efeitos do duplo desvio na confianca comparativamente aos efeitos do desvio simples, ou seja, a ocorrencia de uma unica falha sem nenhum esforco de recuperacao por parte da empresa. Alem disso, nenhum trabalho avaliou a efetividade de taticas de recuperacao da confianca apos o duplo desvio.

    A fim de compreender melhor o fenomeno da violacao e recuperacao da confianca no contexto de trocas entre clientes e empresas, este ensaio teorico provoca a literatura com os seguintes questionamentos:

    * A violacao da confianca e maior apos o duplo desvio (comparativamente a falha/desvio simples)?

    * Sera possivel recuperar a confianca do cliente apos o duplo desvio? Se sim, quais taticas podem ser efetivas para recuperar a confianca apos o duplo desvio?

    Com base nisso, este ensaio objetiva discutir o impacto do duplo desvio na confianca, a possibilidade de recuperacao da confianca apos o duplo desvio e taticas que podem ser utilizadas para recuperar a confianca apos a ocorrencia deste fenomeno.

    Atendendo aos chamados de Schoorman et al. (2007) e de Dirks e Cremer (2010) para a realizacao de estudos que avaliem a violacao e recuperacao da confianca, este estudo busca preencher uma lacuna importante na area de Marketing, mais especificamente na literatura que aborda a criacao e manutencao de relacoes entre empresas e clientes. Embora a literatura sobre recuperacao da confianca esteja em pleno desenvolvimento (TOMLINSON, 2012), em Marketing ainda ha poucos estudos que trataram especificamente sobre a possibilidade de restaurar a confianca do cliente, como os de Xie e Peng (2009) e de Laer e Ruyter (2010).

  2. CONFIANCA

    Baseados na interacao entre organizacoes, funcionarios e clientes, Sirdeshmukh, Singh e Sabol (2002:17) definem confianca como as expectativas que o cliente possui de que "o provedor de servico e responsavel e pode ser confiavel para cumprir suas promessas". Cho (2006) ainda afirma que na area da Administracao, de uma forma ampla, a confianca tem sido concebida como a expectativa positiva sobre o comportamento do parceiro da relacao. Dessa forma, a confianca do cliente, neste ensaio, sera tratada como um constructo que envolve a expectativa positiva sobre o cumprimento de promessas feitas pelo provedor do servico (LEWICKI; MCALLISTER; BIES, 1998; SIRDESHMUKH; SINGH; SABOL, 2002; CHO, 2006).

    Considerando a importancia da confianca para a qualidade de uma relacao, Wang e Huff (2007) declaram que a incerteza e a vulnerabilidade sao conceitos importantes no surgimento e sustentacao da confianca. Alem da satisfacao (GARBARINO; JOHNSON, 1999), da experiencia previa (SWAN; BOWERS; RICHARDSON, 1999) e da reputacao da empresa (JOHNSON; GRAYSON, 2005), alguns estudos apontam a competencia, a benevolencia e a integridade como antecedentes da confianca (p. ex., MAYER; DAVIS, 1999; SIRDESHMUKH; SINGH; SABOL, 2002; KIM et al., 2004; SCHUMANN et al., 2010). Convem destacar que, embora grande parte da literatura de marketing considere a benevolencia, a competencia e a integridade como antecedentes da confianca, alguns estudos as definem como dimensoes formativas da confianca (p. ex., SINGH; SIRDESHMUKH, 2000; LEISEN; HYMAN, 2004).

    Como antecedente da confianca, a benevolencia e tratada como a propensao de um parceiro agir e demonstrar genuinamente preocupacao com os interesses do outro (MAYER; DAVIS, 1999; SIRDESHMUKH; SINGH; SABOL, 2002; SCHUMANN et al., 2010). Ja a competencia (tambem considerada na literatura como credibilidade ou habilidade) se refere as capacidades, intencoes e habilidades de um parceiro para manter as promessas e acordos, entregando o servico de forma segura (MAYER; DAVIS, 1999; SIRDESHMUKH; SINGH; SABOL, 2002; KIM et al., 2004; SCHUMANN et al., 2010). Por sua vez, a integridade representa a percepcao que o individuo possui sobre o conjunto de principios adotados pela empresa (MAYER; DAVIS, 1999; KIM et al., 2004; SCHUMANN et al., 2010).

    Esses tres fatores (benevolencia, competencia e integridade) sao trabalhados empiricamente em relacoes interpessoais na organizacao por Mayer e Davis (1999), que encontraram um relacionamento positivo da competencia (habilidade, neste estudo), da benevolencia e da integridade com a confianca. Schumann et al. (2010), no contexto de trocas bancarias, tambem evidenciam uma relacao direta entre os tres constructos e a confianca. De uma forma geral, Sirdeshmukh, Singh e Sabol (2002) relatam relacoes positivas da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT