A dimensão categórica do documento na ciência da informação

AutorRodrigo Rabello
Páginas131-156
Enc. Bibli: R. Eletr. Bibliotecon. Ci. Inf., ISSN 1518-2924, Florianópolis, v. 16, n. 31, p.131-156, 2011. 131
A DIMENSÃO CATEGÓRICA DO DOCUMENTO NA CIÊNCIA DA
INFORMAÇÃO1
THE CATEGORICAL DIMENSION OF DOCUMENT IN INFORMATION SCIENCE
Rodrigo Rabello
Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia
rdgrabello@yahoo.com.br
Resumo
Considerando uma perspectiva epistemológica de análise, propôs-se a fazer um estudo
histórico-conceitual do documento na Ciência da Informação (CI) com vistas a remontar
aspectos teóricos com base nas disciplinas História, Diplomática e Documentação. Para tanto,
orientou-se nos pressupostos da história dos conceitos que permitiu estudar aspectos
sincrônicos e diacrônicos do conceito “documento”, mediante a configuração da tradição e da
inovação como categorias antitéticas de análise. Enfim, buscou-se demonstrar o caráter
categórico do documento no quadro teórico da CI.
Palavras-chave: Documento. História dos conceitos. Epistemologia. Ciência da Informação.
1 INTRODUÇÃO
Sob uma perspectiva epistemológica, procura-se evidenciar a importância dos estudos de
natureza histórico-conceitual para elucidar aspectos do desenvolvimento teórico da Ciência da
Informação (CI). Para tanto, analisa-se o conceito documento2, que traz consigo requisitos
históricos para ser objeto de análise no âmbito da história dos conceitos, método
historiográfico idealizado por Reinhart Koselleck.
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons.
DOI 10.5007/1518-2924.2011v16n31p131
1 Este trabalho figura como parte dos resultados da tese de doutorado “A face oculta do documento: tradição e inovação no
limiar da Ciência da Informação”, defendida no PGCI/UNESP/Marília (RABELLO, 2009). A pesquisa foi financiada pela
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Este texto, com pequenas modificações, foi apresentado
e publicado nos Anais do 10º Encontro Nacional de Pesquisa em Ciência da Informação (ENANCIB), João Pessoa, 25-28 de
outubro de 2009.
2 Em um primeiro momento, é mister dizer que etimologicamente a palavra documento, derivada da palavra latina
documentum, apresenta ampla carga semântica. Ela decorre do verbo latino docre que significa ensinar, demonstrar,
procedendo etimologicamente do verbo grego

em sua imediata relação com as formas latinas dicere, ducere, (in-
)ducere que aludem ao seu sentido comunicativo (SAGREDO FERNÁNDEZ; IZQUIERDO ARROYO, 1982, p. 171, 187).
Com os sufixos men ou mentum, que indicam instrumento, exemplo, prova, o significado da palavra documento aproxima-
se do sentido de exemplo ou prova daquilo que foi ensinado ou exemplificado. Em outras palavras, representa, lato sensu, o
objeto/meio de tr ansmissão do conhecimento. À luz dessa aproximação etimológica, aspectos como a relativa restrição do
termo quando o documento é concebido tão-somente como objeto-texto ou sua ampliação quando é pensado como
objetivação do conhecimento em um suporte (VALENTE, 1978; LÓPEZ YEPES, 1997; RODRÍGUEZ BRAVO, 2002)
motivaram a proposição do presente estudo.
Enc. Bibli: R. Eletr. Bibliotecon. Ci. Inf., ISSN 1518-2924, Florianópolis, v. 16, n. 31, p.131-156, 2011. 132
No caso específico do estudo histórico-conceitual proposto, observa-se que o aspecto
categórico e polissêmico do documento não tem sido contemplado. Argumenta-se que a
sobrevalorização das discussões acerca da “inovação do suporte da informação” sobrepõem-
se àquelas que ajudam a explicar a dimensão social do documento que apreciem a tradição e a
inovação no campo teórico e filosófico. A carência do cotejo entre tradição e inovação tem
implicado, por conseguinte, na dificuldade de compreensão da relação dinâmica sob tensão
entre estas duas dimensões para o processo de construção teórico-conceitual da CI.
À luz da problemática levantada, objetiva-se apreender em que medida disciplinas como
História, Diplomática e Documentação contribuíram para a acepção de documento na CI.
Argumenta-se que aquelas disciplinas reuniram esforços anteriores a esta última para a
investigação do documento. Essa situação remete ao objetivo específico de compreender a
natureza e a abrangência do conceito de documento na CI quando pensado a partir de uma
perspectiva social e a partir da relação dinâmica entre tradição e inovação no seu quadro
teórico-conceitual. Tais objetivos foram orientados pela hipótese central de que o documento
se configura como uma categoria no quadro teórico da CI.
Este estudo partiu do horizonte interpretativo da história dos conceitos de Koselleck (1992,
1997, 2006). Esse autor relacionou a perspectiva filosófica ao plano teórico e metodológico da
História (ALBERTI, 1996; PEREIRA, 2004; CASTELO BRANCO, 2006) de modo a
contextualizar uma plataforma epistêmica à referida abordagem, buscando subsídios teóricos
em filósofos hermenêuticos como Martin Heidegger e Hans-Georg Gadamer. Salienta-se a
importância de Heidegger e do seu conceito de Dasein, pois esse foi o ponto de partida para a
adaptação e a criação das metacategorias históricas transcendentais espaços de experiência
e horizontes de expectativa as quais levaram Koselleck a propor cinco pares de categorias,
também transcendentais, que ajudam a entender a história como possibilidade, como
especulação, a saber: 1) oposição entre “inevitabilidade da morte” e possibilidade de “matar
ou ser morto”; 2) oposição entre “amigo” e “inimigo”; 3) oposição entre “dentro” e “fora”,
tendo como derivação a oposição “público” e “privado”; 4) a “geratividade”, ou seja, o
choque entre gerações; e 5) oposição entre “senhor” e “servo”.
Tais categorias fariam parte da Historik e a justificariam como uma “ciência teórica
transcendental” ao plano hermenêutico por representarem “estruturas de finitude” presentes
na oposição dos pares antitéticos, cuja característica é de oposição e inseparabilidade das
categorias, ou seja, de divergência e interdependência destas. Com isso, pode-se dizer que a

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT