Breves Notas Sobre a Arbitragem no Direito Público
Autor | Claudio Henrique de Castro |
Cargo | Advogado. Mestrado em Direito das Relações Sociais (UFPR). Especializado em Direito Administrativo (IDRFB), Direito Penal e Criminologia (ICPC) |
Páginas | 20-23 |
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No direito romano tivemos o processo formulário que durou de 149 a.C. a 305 d.C., de natureza rigorosamente privada e de caráter essencialmente arbitral1.
A preparação do processo formulário surgiu em 242 a.C. com o pretor peregrino e sua iurisdictio2.
A fórmula descrevia de forma simples o conflito e a sua decisão; assim, do caso concreto surgiria a solução jurídica3.
Dirigida por um pretor eleito pelo povo e julgada por juiz po-pular, de confiança do pretor e das partes4, um para cada fase, na primeira da redação a fórmula e na segunda da coleta probatória e a enunciação da sentença irrecorrível. Foi o exemplo histórico melhor acabado da harmonia entre celeridade processual e segurança jurídica, pois as demandas eram, normalmente julgadas até o pôr do sol ou no máximo em trinta dias5.
Quanto à arbitragem, o direito romano conheceu: 1) a arbitragem não formal, que consistia em mero pacto; 2) a arbitragem do ius gentium, que correspondia a solução de conflitos surgidos na interpretação ou aplicação dos pactos contraídos com estrangeiros; a arbitragem legal, prevista na Lei das XII Tábuas e a arbitragem compromissária, de caráter eminentemente contratual6.
A palavra arbiter deriva da língua fenícia e faz referência a garantia, conforme a raiz rbn que foi introduzida por meio do comércio na língua latina. A arbitragem como técnica de solução de conflitos se explica pelas razões de rapidez, economia, simplici-dade na tramitação e em muitos casos da especialização dos árbitros7.
Após a queda do Império Romano, a península ibérica recebeu as infiuências do direito canônico, do direito germânico-visigótico e do direito muçulmano8.
A partir do descobrimento, o Brasil recebe a vigência das Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas.
As ordenações Afonsinas, concluída em 1446, na referência legal 3.113, estabeleceram a possibilidade das partes escolherem juízes árbitros mediante a celebração de compromisso. Se houvesse recurso ao tribunal estatal, a parte vencida iria pagar o valor do compromisso a título de compensação, mas poderiam acordar que a decisão seria irrecorrível9.
Nas Ordenações Manuelinas, de 1521, repetem-se as disposições das anteriores, no título 8110.
Nas Ordenações Filipinas, grosso modo, vigentes no Brasil de 1603 até o Código Civil de 1916, a arbitragem continuava a ser apelável e as provas produzidas perante os árbitros tinham plena eficácia na esfera dos tribu-nais ordinários11.
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De 1858 a 1916 tivemos no Brasil a vigência da Consolidação das Leis Civis elaborada por Teixeira de Freitas12, grande advogado e jurista13, conhecido no mundo do direito privado pela profundidade e clareza das suas ideias. A arbitragem estava pre-vista também na Constituição Brasileira de 1824, art. 16414.
Na Consolidação das Leis Civis o art. 394 previa que nos compromissos arbitrais as partes podiam estipular que a sentença dos árbitros fosse executada sem recurso algum. Tivemos também o Decreto 737, de 25 de novembro de 1850, que colocava a arbitragem voluntária ou obrigatória15, esta última revogada pela Lei 1.350, de 14 de setembro de 1866, que previa que o juízo arbitral seria sempre voluntário mediante o compromisso das partes, podendo se autorizar o julgamento por equidade, sem dependência de regras ou formas do direito16.
O compromisso arbitral foi disciplinado no Código Civil de 1916, nos arts. 1.037 a 1.048, e no Código de Processo Civil de 1973, nos arts. 1.072 a 1.102, os dois diplomas revogados e substituídos, respectivamente, em 2002 e 2015.
Em 9 de maio de 1996 foi editado o Decreto Presidencial 1902 que promulgou a Convenção Interamericana sobre Arbitragem Comercial Internacional, do Panamá de 1975 e logo após em 23 de setembro de 1996 foi promulgada a Lei da Arbitragem, 9.307, impondo a imunização da arbitragem frente a decisão judicial de mérito, e apenas em 12 de dezembro de 2001 recebeu o exame positivo de constitucionalidade pelo Supremo Tribunal Federal, em apertada votação. Anterior-mente, em 14 de novembro de 1973, o Supremo Tribunal Fede-ral ratificou a constitucionalidade da lei que previa a instituição de juízo arbitral, mesmo em causas contra a Fazenda Pública (Revista Trimestral de Jurisprudência, 68/382)17.
A Lei 11.079/96 instituiu no seu art. 11 a possibilidade da arbitragem nas parcerias público-privadas.
No ano de 2015, a Lei 9.307/96 foi alterada pela Lei 13.129, de 26 de maio de 2015, que introduziu a arbitragem na administração pública direta e indireta para dirimir conflitos a direitos patrimoniais disponíveis (art. 1º, § 1º)18.
Este afastamento da jurisdição estatal para a esfera da arbitragem privada traduz a fuga do direito público e seus princípios para o direito privado e o caráter disponível dos direitos.
Há também a ideia da globalização de investimentos externos, o que imporia um sistema célere de solução de conflitos pela arbi-tragem, sem o qual não se atrairiam os investimentos externos.
O novo Código de Processo Civil brasileiro, vigente a partir de 17 de março de 2016, inaugurou no art. 190 o denominado "negócio processual" onde as partes podem ajustar o procedimento dentro do processo civil19.
Em direito projetado, temos a discussão legislativa do Projeto de Lei do Senado 555 de 2015, que dispõe no seu art. 11 a pos-sibilidade de solução de conflitos pela arbitragem, as divergências entre acionistas e a sociedade e controladores conforme previstos nos seus estatutos sociais20.
Esta tendência é em razão de que a jurisdição oficial é tida como lenta, inesperada quanto aos resultados de mérito e repleta de fatos que sujeitariam a solução de controvérsias à espera de décadas de recursos processuais até aos tribunais superiores, ao contrário da arbitragem...
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